As Férias Em Sana - Final

Um conto erótico de J. R. King
Categoria: Heterossexual
Contém 1869 palavras
Data: 12/04/2022 08:36:00

Fevereiro passou como um trem-bala. Mais apaixonados do que nunca, foi um mês maravilhoso. Durante o carnaval, chegamos a ficar de sexta a domingo praticamente trancados no quarto, sem sequer comer nem beber. Não tínhamos fome nem sede, tínhamos apenas tesão. Eu jamais havia tido uma experiência tão intensa como aquela. Era algo completamente fora do comum. Quanto mais a gente transava, mais a gente sentia tesão, e mais a gente transava novamente.

Porém, com o tempo, notei que Lúcia parecia cada vez mais distante, perdida em seus pensamentos, até perder completamente a conexão comigo em um dia. Era terça-feira de carnaval, por volta de oito da manhã. Ou será que seria 4 da tarde? Não saberia dizer, perdemos completamente a noção do tempo. Lúcia estava deitada completamente nua na cama, enquanto eu gentilmente tentava estimular o seu pênis com os meus lábios, do jeito que ela sempre gostou. Porém, ela estava distante demais para sentir qualquer coisa, quando eu olhava para ela, ela estava olhando fixamente para o teto, sem nenhuma reação, nenhum gemido, nenhum movimento. Seu corpo também não indicava nenhum estímulo, era como tentar fazer sexo oral em uma pessoa morta.

Lúcia? - Chamei pelo seu nome, mas ela não me ouviu.

Lúcia. - Chamei uma segunda vez, mas ela continuou a não me ouvir.

Lúcia! - Gritei na terceira vez, e seu corpo teve um espasmo de susto ao finalmente perceber que eu a chamava.

O que foi?

Você parece distante.

Não, eu não tô não, pode continuar, eu tava adorando.

Não, não estava. Eu tô há mais de 20 minutos te chupando e você sequer ficou dura. Você está distante, o que houve?

Lúcia se sentou na cama e ajeitou o cabelo para atrás da sua orelha. Olhando para os seus pés, ela começou a falar bem baixinho.

Você já pensou o que vai ser da gente quando isso tudo acabar?

Bem, pra falar a verdade sim. Eu queria que você viesse comigo de volta para o Rio. Você pode morar na minha casa, tem bastante espaço.

Era sobre isso que eu tava pensando.

Lúcia olhou para mim. Notei os seus olhos marejados, e um olhar que sabia que ela contaria algo ruim.

Eu não posso ir com você pro Rio, Marcelo.

Por que não?

Eu não posso simplesmente abandonar meu pai aqui. A gente tem um negócio juntos. Ele nem sabe usar uma calculadora direito, como que ele vai se virar sem mim?

Lúcia, uma mudança é sempre algo ruim no começo, mas as pessoas aprendem a lidar com isso.

E além do mais, como você vai lidar comigo no Rio? Seus amigos vão aceitar você namorar alguém como eu? Seu trabalho vai aceitar você namorando alguém como eu? Eu sei que eu vou ser um estorvo pra você, e eu não quero isso. Não quero saber que você foi demitido do seu trabalho por minha culpa.

Você não vai ser um estorvo, Lúcia. Se eu tô dizendo que eu quero que você venha comigo, é porque eu já pensei nisso tudo, e eu vou aceitar as consequências das minhas decisões.

Vai mesmo? Como você sabe? E se no fundo você também me culpar? E se você não for capaz de me aceitar perante a sociedade.

E se? E se? Você só tá pensando no 'e se?', inventando milhões de cenários irreais na sua mente sobre coisas que você nem sabe se vão acontecer! Lúcia, eu tinha uma vida completamente triste e solitária antes de te conhecer. Eu vim para essa viagem depois de ser obrigado a tirar férias por quase ter morrido de tanto trabalhar, e graças ao destino eu te encontrei, e você me fez viver coisas que eu jamais imaginei que viveria. Agora eu vou voltar para a minha vida mundana, mas quero que você venha comigo, pois você é o ponto que trouxe cor a minha vida cinzenta.

Lúcia começou a chorar. Eu não consegui dizer nada mais. Ela limpava as lágrimas de seu rosto, mas elas continuavam a cair. Depois de finalmente recuperar o fôlego para dizer algo, ela fala.

Me desculpa, Marcelo, mas eu não posso ir. Eu não posso. Minha vida é aqui. Antes eu me sentia triste pelas pessoas nunca me aceitarem por completo, apenas uma parte de mim, ou nem isso. Agora que eu conheci você, e você me aceitou do jeito que eu sou, eu não consigo pensar em nada além de como isso pode te afetar. As pessoas que não me aceitam vão passar a não te aceitar também, e eu não suportaria isso. Desculpa, mas eu não posso. Eu não posso. Você precisa voltar para a sua vida sem mim.

Lúcia continuou a chorar. Naquele momento eu percebi que tentar argumentar seria inútil. Ela não iria mudar o seu pensamento. Por mais que eu quisesse ter ela ao meu lado e que ela voltasse comigo, ela não iria. Tudo o que eu fiz foi abraçá-la, e deixar que ela chorasse em meu ombro. Então lembrei daquela tarde na casa do meu pai, e pus-me a chorar junto a ela. Esse era o fim do nosso relacionamento.

Quando o carnaval terminou, era a minha hora de partir. Fiz as minhas malas e já coloquei no carro pela manhã. Seu Guto e Lúcia vieram se despedir de mim. Seu Guto me abraçou bem forte com seus braços parrudos e peludos.

Obrigado por tudo o que você fez pela pousada filho, nunca me esquecerei.

Eu que agradeço, e espero que você não se esqueça de pagar as parcelas da dívida dessa vez, hein.

Seu Guto soltou uma boa gargalhada em volta de uma tosse pigarrenta. Olhei para Lúcia, que estava claramente triste, como uma viúva em luto. Sua cara estava inchada. Na noite anterior nós dormimos separados, cada um em seu quarto, e Lúcia parecia que havia chorado a noite toda. Eu a abracei e disse:

Obrigado por tudo.

Lúcia permaneceu em silêncio, mas em seus olhos eu podia ver a tristeza latente. Ela não chorou, pois acredito que não havia mais nada a se chorar. Demos um longo abraço, um abraço tão apertado que quase me sufocou, como se ela quisesse me prender em seus braços para sempre, e eu até hoje não sei por que eu não deixei que ela me prendesse.

Entrei no carro e ganhei a estrada. Já saindo de Macaé, a rádio começou a tocar Ismália, uma canção de Milton Nascimento musicalizando o poema de Alphonsus de Guimaraens. Foi impossível não lembrar daquela noite com Lúcia, a noite onde tudo começou, onde minha razão deu lugar aos meus impulsos e sentimentos e eu a beijei. De repente eu me lembrei de tudo o que a gente viver e não tive outra reação a não ser desabar em lágrimas, completamente abalado por deixar que um relacionamento tão intenso terminasse daquele jeito. Soquei o volante com raiva, fazendo a buzina gritar em pena na estrada. Os carros à minha volta buzinaram novamente, alguns motoristas me xingaram, mas eu nem liguei. Eu só pensava em Lúcia e queria voltar, de alguma forma. Dar meia-volta, mas não podia.

Ainda faltavam mais 2 semanas de férias. Eu não saí de casa, mal me alimentava. Fiquei deitado durante esse tempo todo só pensando nela. Mas em meio às minhas reflexões, tive uma epifania. Percebi que precisava voltar. Não havia nada que me prendesse de fato ali naquela cidade, nesse emprego infeliz que eu tinha. Foi então que eu comecei a arrumar as coisas para voltar.

Por coincidência do destino, uma audiência fora marcada na última sexta-feira das minhas férias para tratar dos assuntos sobre a casa de Arraial do Sana como herança de meu pai. Perguntei à minha mãe se poderia acompanhá-la. Ela ficou surpresa, pois eu nunca havia demonstrado interesse algum nesse assunto, mas aceitou.

Na audiência, conversei com os meus tios depois de tantos anos sem vê-los direito. E após muitas negociações, eles concordaram em desistir da causa, desde que eu pagasse a eles o valor da casa. Fiquei tão alegre que os abracei e beijei, eles não entenderam muito bem, mas eu pouco me importava com isso.

Na segunda-feira, de volta ao meu trabalho, sequer fiz questão de ir arrumado. De chinelo, bermuda cáqui e camiseta, cheguei na sala do meu chefe, que se espantou comigo.

Parece que ficar tanto tempo de férias te fez bem. Mas você se esqueceu que hoje você volta ao trabalho. - Disse o meu chefe.

Nada disso. Passei aqui para avisar que estou pedindo demissão.

Ele pulou da cadeira.

Como é!? Mas por quê? O que houve.

Bem, como você disse, esse tempo de férias me fez muito bem. E eu percebi o quanto eu odeio esse trabalho e o quanto ele me fez mal durante anos. Então estou indo embora. Vou recomeçar a minha vida.

Espera aí, Marcelo. Você é o nosso melhor homem, vai me deixar de mãos atadas assim? Se o problema era a sua carga de trabalho, a gente pode resolver isso. Eu mesmo te garanto que você não vai trabalhar mais de 40 horas por semana. Aliás, menos que isso. Que tal 30 horas por semana, hein? E mais um aumento! Não me abandone agora, filho.

Desculpe, mas eu já tomei a minha decisão. Inclusive já falei com o RH, só fiz questão de vir aqui anunciar pessoalmente a você. Muito obrigado, quem sabe um dia a gente não se encontre novamente?

Ele continuou tentando me convencer a ficar, mas já não dei mais ouvidos. Saí de lá com a cabeça erguida e feliz de saber que tinha feito a escolha certa.

O processo de mudança demorou quase 1 mês, até eu vender todos os móveis do meu apartamento e empacotar tudo o que eu conseguia levar dentro da mala do carro. Assim que os documentos da casa ficaram prontos, tendo ela em meu nome, eu botei o pé na estrada em direção a Arraial do Sana novamente. A casa podia estar abandonada, mas eu tinha acumulado um bom dinheiro para fazer uma reforma, deixar tudo dono. E aí, então nós poderíamos finalmente morar lá. Eu e Lúcia.

Quando eu cheguei, parei novamente em frente aquela pousada, antiga e bem cuidada. Olhando para dentro, via a recepção, e lá estava ela, debruçada sobre o balcão, do mesmo jeito que a encontrei pela primeira vez. Mascando o lápis em sua boca enquanto tentava desvendar umas palavras-cruzadas. Meu coração disparou, um mix de ansiedade com nervosismo. Não sabia o que podia acontecer. Tinha passado bastante mês desde que eu tinha ido embora. Um mês com ela eu sabia que muita coisa podia acontecer. E se ela já tivesse me superado? E se tudo isso foi uma ideia tola e agora eu teria que encarar independente das consequências? E se? E se? Eu ri de mim mesmo percebendo que eu estava falando que nem ela em nossa última discussão. Então, só fiz o que devia ser feito. Apertei com força a buzina do carro, fazendo ele gritar para toda a rua ouvir, inclusive Lúcia. Ela levantou o rosto. Olhou alguns segundos em minha direção até perceber o que era e de quem se tratava. E então, em seu olhar eu vi que tinha feito a escolha certa.

Fim

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Comentários

Foto de perfil de Ricardo L E

Gostaria muito de ler a continuação dessa história, por favor escreva 🥲🥲

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Aquela história que você fica querendo saber mais, pena q acabou

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