Praga - o novo mundo - Capítulo 11 - Um louco morre, outro ressurge

Um conto erótico de T.B
Categoria: Homossexual
Contém 4211 palavras
Data: 09/01/2018 00:34:50

Olá "conteiros". Realmente esse capítulo foi o mais difícil que eu escrevi. Descrever toda a violência e choro me deixou bem angustiado.

Então... vamos lá“Eu não acreditava no que aquele homem havia dito. Ensanguentado e extremamente fraco, Miguel encontrou fôlego para dizer ‘eu te amo’. A mistura de seus gritos e choros, aquelas cenas de tortura e a sua recente declaração se embaralham em minha mente.

-O’que? - questionei, incrédulo -... não, não.

-Eu te amo… por favor me ajude… vamos… vamos fugir juntos daqui. - Miguel insistiu mais uma vez.

Seus olhos marejados me encaravam como em um interrogatório. Mesmo quase sem força, seus braços se esforçam para me trazer mais perto de seu rosto desesperado.

-Fugir juntos? Não… não. - respondi, cada vez mais confuso e desnorteado.

-Não precisamos deles. Venha comigo, nós podemos te proteger pequeno Thommy… eu te amo. - disse o homem com algumas lágrimas escorrendo pelo rosto.

Mesmo em meio aquela sopa de palavras angustiadas, algumas me chamaram a atenção. ‘Nós podemos te proteger… Nós’. Um semblante de dúvida recai sobre o meu rosto.

-Nós?... quem é ‘Nós’? - questionei enquanto me afastava.

Lentamente me livrei dos seus braços em torno do meu pescoço e de seus lábios à minha frente. Miguel agora estava novamente sentado encarando meu rosto, sua expressão claramente havia mudado diante da pergunta.

-Não importa… eu te amo… vamos fugir Thommy. - insistia.

-Eu perguntei, quem é ‘Nós”? - questionei novamente com um rugido empoderado.

Dessa vez houve uma mudança brusca em sua expressão. Seu rosto, que antes pintava dor e espanto, agora me encarava… apático. Suas lágrimas cessaram de imediato e um pequeno sorriso surgiu no canto de sua boca.

-Você vai morrer Thommy… da pior forma. - disse Miguel de forma hipnótica. -... e eu mesmo vou ter esse prazer, e quem sabe depois eu possa te fuder.

Meus músculos paralisaram. O modo como falava, a sua audácia e coragem. Mesmo com o corpo debilitado e rendido às vontades de Sara, o homem continuava firme e desafiador.

-Que tipo de monstro você é?

-O tipo que sempre andou por aí. Aquela velha tinha razão, você é fraco. Se rendeu ao primeiro macho disposto a te fuder. Hahahaha…

-Cale a boca. - disse com os olhos lacrimejados.

-Deixou um estranho qualquer dormir ao seu lado, trabalhar aqui e até… revirar seus papeis.

Papéis? Quais papeis? O que aquele lunático estava querendo dizer?

Percebendo minha reação de dúvida a sua fala, Miguel desata a rir em tom debochante.

-Que ingênuo, até fico com dó. Seus papéis. O quanto há de comida, onde fica o poço… onde fazem a guarda.

Na sua última frase Miguel intensifica sua voz, indicando claramente o seu interesse. Mas porque ele estava revelando tudo aquilo, será que havia aceitado a sua derrota?

-Eles estão vindo… Hahahaha… eu vou ter o prazer de te matar. Na verdade, primeiro aquela bruxa velha falante. Mas uma coisa eu te garanto, eu ainda vou te fuder seu merdin…

Sem conseguir me conter, interrompi sua fala com um potente soco certeiro. Alguem que antes suplicava por ajuda e afago, agora estava proferindo ameaças e insinuações imundas.

Além disso, eu me questionava se ele tinha razão. Eu havia mesmo confiado a um estranho o livre acesso à aqueles papeis e ao meu próprio coração e tudo por causa de uma chance de ser acariciado e amado. Ingênuo.

-Quem é você? - perguntei enquanto encarava o seu corpo quase sem forças esparramado pela cadeira.

Nesse momento eu atento aos sons de passos pesado vindos da escada. Batidas de um salto alto, com certeza. Era Sara, adentrando o ambiente como uma sombra ágil e assustadora enquanto bradava sua voz, respondendo minha pergunta.

-Ele é um saqueador… um arruaceiro. - disse enquanto andava pela sala em direção a um robusto armário de madeira velha.

Seus movimento eram rápidos e decisivos. Abrindo a portal do móvel percebo uma série de armas, todas polidas e organizadas. Sempre soube que minha mãe era uma fã de armas, mas não que as escondiam tão mal.

Na base do armário havia caixas e caixas de balas com alguma poeira em cima.

-Alguns moradores viram esse louco correr para fora da vila a poucas horas, voltando pouco tempo depois. Ele avisou alguém onde estava… eles estão chegando.

Foi como se o chão se abrisse e me engolisse. Tudo começava a ficar escuro.

-Saqueadores? Aqui? - balbuciei, cambaleando para trás.

Ao fundo consegui ouvir as gargalhadas de Miguel, como as de um demônio sórdido satisfeito com seus planos. Hoje pela manhã havia acordado com um belo homem em meus braços, agora tudo estava perdido pela minha fraqueza… ingênuo.

-César. Tome, já está carregada.. - disse Sara empurrando um fuzil contra o meu peito. -... é só apontar e atirar.

-O’que? Como… como eu…

-César, escute. Eu preciso de você aqui, não se distraia e me ajude. - gritou Madame enquanto vasculhava o armário desenterrando um rifle reluzente.

Após o grito de Sara, e percebendo a gravidade da situação, uma descarga de adrenalina começa a correr em minhas veias. Revigorante e encorajadora.

-Acha mesmo que vai sair dessa, sua vadia estúpida. - gritou Miguel em pura insanidade -... vou fazer questão de garantir o máximo de sofrimento à você velha. E quanto a você, príncipe de merda, você será meu…

Miguel interrompe a sua fala ao perceber a cena a frente de seus olhos. Sara havia engatilhado o seu rifle e apontado para o centro de sua testa.

-Você fala demais, idiota. - diz Mandame antes de puxar o gatilho.

O som alto se espalhou pelo ambiente, seguido apenas pelo zumbido insistente. O corpo do homem agora se encontrava desfalecido sobre a cadeira. Sua cabeça, ou o que restou dela, estava jogada para trás dada a potência do projétil. A mobília e a parede atrás do homem agora jazia manchada pelo seu sangue… pena.

-A tempos eu queria fazer isso. - Sara disse com um sorriso de satisfação.

Curiosamente aquela cena mais me agradou do que causou repulsa, por mais explícita que fosse. Aquele homem já havia causado muita dor e sofrimento, e ainda continuava a causar… o mínimo que pode oferecer naquele momento foi a sua morte.

Aquele desfecho abriu os meus olhos para a séria situação que se seguia, me colocando nos eixos.

A Madame percorreu o cômodo apagando todas as velas do ambiente e trancando a única porta que dava acesso a escada. Com o cessar a iluminação percebi o silêncio da vila. Nem uma conversa ou cantarolar. Ao olhar pela janela percebo que todas as luzes também haviam sido apagadas, uma escuridão amedrontadora. O fôlego que se dá antes do mergulho.

-Dei a ordem para que todos se tranquem em suas casas e apaguem suas luzes. Talvez isso os engane, talvez pense que fugimos.

-Eu não acho que eles vão desistir só por isso. - sussurrei enquanto encontrava um ângulo propício em uma das janelas.

-Não, eles não vão. Mas podemos acertar uns desgraçados sem que eles nos atinjam. - Madame responde com um sorriso no canto dos lábios.

Ela tinha razão. A luz da lua iluminava o centro da vila, lugar sem obstáculos. Poderíamos abrir fogo de imediato sem que os moradores fossem atingidos.

O vento uivava entre as telhas soltas das moradias. Aquele lugar nunca esteve tão calado, sem vida, nem durante a madrugada onde os bêbados inveterados se reuniam em uma roda de conversa.

Mesmo que uma parte de mim quisesse desmoronar e se esconder, era a minha responsabilidade me manter firme… afinal de contas tudo aquilo só estava acontecendo por minha causa.

Desde o início Sara estava de olho no novo e misterioso homem que havia acabado de chegar na vila. Ela o observava em tudo e a todo tempo. Menos é claro quando ela viu eu me afeiçoar por ele… sua vontade de me ver feliz a fez vacilar. Eu, pelo contrário, nem me preocupei com Miguel, me entregando ao seus encantos.

Mas isso era passado, aquele lunático agora estava morto, bastava agora consertar o meu erro… proteger esses pobres inocentes da crueldade dos saqueadores.

-Acha que só nós dois daremos conta de matar todos eles? Quer dizer, nem sabemos quantos são. - disse em dúvida cortante.

-Todos possuem pelo menos uma pistola qualquer, podem nos ajudar. Além do mais J.B e Afrodite estão em seus postos, eles verão os malditos se aproximarem. Logicamente pela quantidade, do qual não deve passar de dez saqueadores alados em motos, os dois irão abrir fogo juntamente conosco. Eles sabem como proceder, eu os criei.

Até onde entendi, quando os saqueadores chegassem no meio da vila, J.B e Afrodite atacarão pela retaguarda e nós pela frente - além do auxílio dos moradores. Um golpe por todos os lados, aqueles imundos não conseguiriam reagir.

Mas algo na fala de Sara chamou a minha atenção e continuava a martelar e se repetir em minha mente. ‘J.B, Afrodite, seus postos’... ‘J.B, Afrodite, seus postos’...‘J.B, Afrodite, seus postos’.

Porque aquilo se repetida? Algo não estava se encaixando, como um pedaço condutor qualquer que se ausenta de um circuito impedindo a passagem da corrente, para que finalmente a luz se acenda. Mas o que ele não viu? Qual detalhe ele deixou passar?

Já havia passado um bom tempo desde que Sara decretou a reclusão de todos e desde que seus devaneios começaram. O’que ele não estava vendo?

-Eles já deveriam estar aqui. Já deveríamos ter ouvido o barulho de seus motores. - disse Madame com semblante preocupado que se revelava com os poucos feixes de luz que entravam pela janela.

-‘J.B, Afrodite, seus postos’...‘J.B, Afrodite, seus postos’. - começo a sussurrar enquanto curvo a sobrancelha.

Algo está terrivelmente errado, mas ele não sabia dizer o que era. Faltava alguma peça, mas qual? Sem conseguir ficar parado, começo a me movimentar pela sala pobremente iluminada pela lua.

-O que pensa que está fazendo? Volte ao seu posto César. - disse Sara autoritariamente mas sem desviar o olhar de sua mira.

-Estamos esquecendo de algo… falta alguma coisa.

Pisotear de um lado para o outro faz com que meu raciocínio acelere a procura de um sentido naquilo tudo. Como é irritante tentar se lembrar de algo que nem ao menos sabemos ser importante, mas ele precisava da última peça.

Notei o corpo desfalecido do homem jogado ás mazela na cadeira, cena esta que me trazia pelo menos um pequeno conforto diante daquela situação. Aquele imundo havia me enganado, usado e insultado até os seus últimos minutos de vida e sem o menor remorso fazia juras de morte e abuso.

Olhando assim, parado em sua frente, eu sinto uma repulsa crescer. Mesmo estando morto as lembranças daquele lunático eram pulsantes e insistentes. A maneira como ele sorria e me abraçava se contrastava com suas agressões e xingamentos.

Seus pensamento eram confusos e enevoados, suas palavras eram tóxicas e sem sentido. Até nos seus últimos suspiros ele alucinava sobre sua vingança e como havia me enganado para conseguir se infiltrar e depois trazer o saqueadores até aqui. Maluco.

Agora parado diante do corpo de Miguel suas últimas palavras se estampam em minha mente, como se fosse útil.

‘Você é fraco. Se rendeu ao primeiro macho disposto a te fuder’... ‘Você vai morrer Thommy… da pior forma’... ‘Eles estão vindo’...

Droga de confusão. Não conseguia focar em uma coisa só.

‘Você vai morrer Thommy… da pior forma’... ‘Eles estão vindo’...

Mesmo morto, aquele homem ainda conseguia infernizar minha cabeça.

‘Eles estão vindo’... ‘Revirar seus papeis’...‘Revirar seus papeis’...‘Revirar seus papeis’...

Aquela sentença começou a se destacar. Quanto mais tentava me concentrar em outra informação, mais ela se sobressaia.

‘Revirar seus papéis’...’seus papeis’....’seus papeis’...’papeis’...’papeis’...’papeis’...

O’que? Como aquilo fazia sentido? ‘J.B, Afrodite, seus postos, papéis’... ‘J.B, Afrodite, seus postos, papéis’... Aquela cinco palavras se destacavam diante de sua visão.

-Acho que vi alguma coisa. - disse Sara apertando os olhos.

-‘J.B, Afrodite, seus postos, papéis’... - comecei a sussurrar enquanto encarava o corpo.

-Não, espera. São vários vultos. - insistiu Madame.

-‘J.B, Afrodite, seus postos, papéis’... - insistia quase alcançando uma epifania.

-Não são eles. Não tem motos, nem gritaria.

-‘J.B, Afrodite, seus postos, papéis’...

-Não tem como ser eles. São poucas as sombras, e eles estão… parados na frente das casas.

-‘J.B, Afrodite, seus postos, papéis’...

-Com certeza não são eles. J.B e Afrodite notaria a chegada deles.

Naquele momento meu corpo inteiro foi percorrido por um frio paralisante. O ar que inspirava parecia pequenas navalhas perfurando meus pulmões. Conseguia sentir o pulsar de sangue que sai do ventrículo em direção as minhas têmporas.

-Eles sabem… os saqueadores, eles sabem… - balbuciava sem conseguir desviar os olhos do corpo de Miguel.

-Sara, eles sabem. Eles sabem onde J.B e Afrodite estão.

Nesse momento, pelo canto dos olhos, percebo que a Madame não mais olhava para fora mas prestava atenção em minha epifania.

-Como poderiam saber? - indagou espantada com o sentido que aquela informação trazia a situação de quietude.

-Os papéis que Miguel roubou e levou consigo para fora da vila… - respondi enquanto um rio de lágrimas desaba sobre o meu rosto, tudo fora do meu controle.

-A localização do posto de guarda… eles… eles sabem. - disse a Madame com voz trêmula e pela primeira vez demonstrando medo.

-J.B e Afrodite não alertaram sobre a chegada deles porque… porque… - não consegui completar a sentença mas Sara já havia entendido a lógica da situação.

Aquele silêncio era ensurdecedor, os pequenos afagos de ar e as batidas do coração eram as únicas perturbações daquela cúpula.

Curiosamente o rosto da Madame, que antes estava pálido pela notícia começa a se tonalizar com cores alaranjadas e avermelhadas que atravessavam a janela. Como se os raios de sol cortassem aquela escuridão perturbadora. Mas logicamente não era o sol.

Cada vez mais os raios intensos e coloridos invadem a sala e colorem o rosto desenhado por algumas rugas adquiridas com o tempo. A tranquilidade que antes pairava sobre o ar, a quietação que antes reinava sobre aquelas planícies, agora se rompem pelos gritos absurdos vindos das casas.

Rapidamente Sara se vira para contemplar a cena grandiosa que reinava na vila. Ainda parado em meu lugar, apenas observando sua reação, vejo Madame levar sua mão a boca em perplexidade.

Com um pulso de força consigo vencer a paralisia e caminho em direção a janela. Pelos Deuses.

Nesse momento percebo que a crueldade de Praga não pode ser medida, não pode ser graduada e nem limitada. Cada vez que instauramos um limite às atrocidades que os seres humanos são capazes de praticar, as expectativas se superam.

Todas as casas ardiam em chamas. As labaredas percorriam da base até o topo em uma dança mortal. A luz que emanava dos focos continham feixes esverdeados e avermelhados em um meio tipicamente alaranjado… hipnotizante.

Tudo acontecia tão rápido e o criptar das madeiras que se consumiam em fogo eram pontos de intervalo entre os gritos desesperados que vinham de dentro das moradias. Mulheres, homens, crianças, idosos… todos bradavam a dor de seus corpos sendo agredidos pelo calor que os envolvia de todos os lados.

Os poucos que se aventuravam em sair daqueles fornos de morte eram abatidos por tiros que não conseguia localizar de onde vinham.

Tudo havia se conectado. A barbárie estava em andamento.

Quando os gritos cessaram Madame e eu já estávamos cientes de que todos os moradores haviam sido mortos… queimados em suas casas. A imagem repentina de seus corpos incinerado brotava frente a minha visão mesmo contra a minha vontade, me fazendo cambalear para trás.

O barulho dos motores e os gritos insanos aumentavam com o passar dos segundo. Em questão de minutos todo o centro da vila estava preenchido de saqueadores. Não eram apenas dez como Sara havia arriscado. Incontáveis devido a situação, aqueles degenerados se amontoavam em busca de espaço.

Agora os tiros do fuzil de Sara começam a abater um a um. Cada disparo me trazia de volta a realidade, fazendo com que os barulhos dos tiros se tornassem mais vívidos. A cada novo som, um corpo diferente tombava.

Sua agilidade em atirar e recarregar era assustadora. Como em uma dança exaustivamente ensaiada seus movimentos harmoniosos se alternavam: atirar, recarregar, atirar, recarregar.

-Vamos César… mate-os, agora. - ordenou em um grito com seu olhar fixo em seus alvos.

No entanto meus músculos não me obedeciam, e nem um movimento foi executado. De longe pude ver um velho alto bradando comandos mediante a sequência de mortes.

-Se espalhem… tragam-na aqui, agora. - disse o velhote cuja voz quase desaparecia em meio a som dos disparos.

Dali por diante foi apenas uma sequência de cenas. Aquele coquetel hormonal que circulava meu corpo parecia transformar meu sangue em cimento, me deixando imóvel.

Atrás de nós a porta do recinto estourava com o pontapé desferido pelo homem que invadia o local. Rapidamente Sara se vira e dispara em sua direção. E eu apenas presenciando, imóvel.

Os tiros eram certeiros, e o movimento de atirar e recarregar garantia a morte rápida da sequência de homens que adentravam o local. Os corpos iam se empilhando a medida que os aventureiros se atreviam contra ela.

-César… - Madame gritou tentando me despertar.

Mas nada adiantou, minha mente e meu corpo era duas coisas independentes agora.

A morte sequenciada perpetuou até que, em questão de um segundo apenas, seus movimentos se atrasaram. O último saqueador aproveitou o deslize e disparou contra o ombro de Sara, fazendo-a largar a arma.

-Sara… - sussurro tentando alcança-la mas sem conseguir me mexer.

Sinto apenas a sequência de golpes em meu rosto. As cenas passam em fragmentos devido aos insistentes socos. Fomos arrastados para fora da casa e postos de joelhos em frente ao velho. Pude notar melhor agora sua fisionomia.

Seu rosto denunciava sem qualquer sombra de dúvidas a sua idade avançada, mas seu corpo ainda era robusto e firme. Cabelos brancos e longos caiam sobre seus ombros e seu sorriso era extremamente assustador.

Olhando para o lado vejo Sara firme, sem demonstrar medo diante aquela situação… mas eu sabia o que ela pensava.

Todos os seus amigos estavam mortos, todos aqueles que confiaram sua segurança à ela. Até as crianças… jaziam queimadas dentro daquelas casas que ainda ardiam em chamas.

-Desculpe a maneira como nos conhecemos… - disse o velho em tom sarcástico, -... deixe eu me apresentar. Meu nome é Coronel, e estes são meus filhos e filhas.

Seu modo de falar, seus gestos… claramente eram uma afronta e zombaria a situação.

-Você deve ser a famosa Madame Sara… - disse enquanto caminhava em direção a mesma. -...a senhorita é uma exímia atiradora, matou quase um terço do meu contingente. Eu a respeito por isso.

-E você deve ser o pequeno César… - continuo, agora se dirigindo a mim. -... inteligente, forte e muito bonito. Miguel tinha razão, afinal.

-Você mandou aquele porco até nós. Você matou todos… todos eles… - Sara gritou enquanto fitava as casas em chamas.

-Sim, sim. Você matou muitos dos nossos antes disso. Toda vez que nos aproximávamos o seus cães abriam fogo contra nós, e ninguém retornava. Por meses eu vi os meus caírem. Só havia um modo de conseguir destruir a sua preciosa vila, por dentro. Deu muito trabalho arquitetar tudo isso, a senhorita é uma mulher muito forte. Mas no final eu consegui, ataquei no seu ponto mais fraco… seu filho, o elo mais fraco de uma forte corrente.

Aquele homem era maligno. Sua admiração por Sara era inegável e suas ações brutais pareciam uma tentativa de demonstrar a sua vontade de superá-la.

-Enfim, temo que você tenha chegado ao fim, minha cara. Mas antes, tenho um presente para você.

Seus capangas se movem, esbarrando uns nos outros, enquanto dois deles traziam algo nas mãos. O calor do fogo havia se intensificado naquele local e a movimentação frenética dificultava a respiração de um ar renovado.

-Eis aqui os seus cães… deram trabalho, mas no final eles pararam de se debater. - disse o velhote erguendo suas mãos.

De primeiro momento achei que estava vendo coisas por causa do calor intenso e dos golpes repetitivos em minha cabeças, mas depois que sua visão se acostumou a cena eu puder presenciar a imagem profana.

O Coronel segurava em suas mãos as cabeças decapitadas de J.B e Afrodite enquanto ria freneticamente.

-Nãooooooo… - Sara gritava em desespero diante da cena desumana, enquanto tentava avançar no velhote, claramente ignorando a dor de seu ombro.

Tudo estava girando, o ar se tornava intragável. Meu peito parecia estar prestes a explodir. Estava perdendo a consciência diante daquela barbárie envolta pelos gritos da Madame”⧫Como se alguém me resgatasse de um afogamento, sou puxado daquela terrível cena para a realidade. Aquilo não era um sonho ruim ou um pesadelo monstruoso. Era pior, era a realidade, meu passado que se revelava em mais um episódio de recordação.

Sinto todos os músculos do meu corpo tremerem, o suor tomava conta de cada centímetro cúbico da minha pele e pela minha face escorria um rio de lágrimas salgadas.

Tudo aquilo que eu tinha visto era real, infelizmente era real. O episódio foi tão intenso que meu corpo expressou tudo aquilo que eu já havia sentido. O coração disparado, a respiração pesada, a dor de presenciar toda aquela cena terrível, o choro insistente. Ainda buscando ar, percebo a insistência de todos os músculos que oscilam de medo ou tensão.

Bob não havia acordado com o meu súbito despertar, o ruivo estava deitado de costas para mim envolto pelo lençol. Tão sereno, tão relaxado. Seus pequenos suspiros ritmados me ajudavam a tranquilizar minha respiração em busca da calma.

Mas como me acalmar depois de reviver todo aquele massacre? O calor do fogo, os tiros, os gritos, aquela imagem das cabeças. Pelos Deuses. Todas aquelas pessoas… mortas… por minha causa. Não tinha como me acalmar, era impossível.

Minha respiração volta e se tornar acelerada. Tento apertar os lençóis para transmitir a tensão dos meus músculos, mas não faz diferença.

Sem o menor controle, um rio de lágrimas começa a escorrer pelo meu rosto. Não consigo formular sequer uma frase para chamar Bob, necessitava mortalmente do seu abraço.

Era uma sensação excruciante, que sufocava e rempria todo meu ser. Me sentia sozinho e indefeso. Aquela cena. Eu, apertando os lençóis com as mãos, de braços abertos, me contorcendo, com um pranto incontrolável e sem conseguir chamar por Bob… era amedrontador.

-Não… não… não. - sussurrava de maneira quase inaudível tentando negar que tudo aquilo havia acontecido.

Agora vem a falta de ar. Pânico. Estava abandonado e impotente. Tentava buscar o ar enquanto jogava minha cabeça para trás. A cada nova inspirada, tentava fazer mais força pois o oxigênio era insuficiente. Pânico.

-Bob… Bob, por favor. - sussurrei, mas com pouco som.

O ruivo não se mexeu, permanecia inerte. Em seus sonhos não havia como escutar uma súplica tão inaudível.

-Por favor… Bob. - disse com mais intensidade, ainda com pouca potência em sonoridade.

Vendo que o ruivo não reagia, o meu desespero cresceu e minha respiração ficava cada vez mais difícil. Acelerada e curta. Medo… eu sentia medo.

-Bob… Bob. - tentei mais uma vez com todas a minhas forças enquanto ainda me derramava em prantos.

-Vai dormir Thommy. - o ruivo responde com uma voz rouca, quase sem se mexer.

-Por… favor. - disse quase sem ar e envolto em pânico.

Aquelas duas palavras, quase inaudíveis e cheias de sofrimento trazem Bob de seus sonhos para a realidade em questão de segundo. O ruivo então se vira para mim, pondo-se sentado em um pulo.

Ele então me encara tentando entender o que estava acontecendo. Eu apertando os lençóis com os dedos, chorando sem parar, sem conseguir falar e mal conseguindo respirar.

-Thommy… Thommy… - o ruivo se aproxima com as duas mãos envolvendo meu rosto.

Sentir o seu toque era reconfortante, protetor. Bob então me puxa para entre as suas pernas enquanto me envolvia com seus braços. Meu rosto agora estava pressionado contra o seu peito em um balanço rítmico.

-Pelos Deuses Thommy, o que aconteceu? o ruivo perguntava me apertando com carinho enquanto afagava meus cabelos.

-Eles morreram… todos eles… todos morreram. - disse ainda em um choro eterno mas inaudível.

-Quem? Quem morreu Thommy?

-Queimados… todos eles… cabeças cortadas. - descrevi as cenas aleatórias que se repetiam na minha cabeça.

Bob me deita de costas na cama enquanto se aconchega ao meu lado. Suas pernas se entrelaçam nas minhas. Um de seus braços envolve o topo da minha cabeça enquanto sua outra mão afaga meu rosto, fazendo eu me acalmar.

-Queimados, todos eles. - disse atônito olhando para o teto do quarto com o rosto molhado.

-Shhiu… Eu estou aqui Thommy. Feche os olhos e se acalme.

Claramente o ruivo percebeu o meu ataque de pânico e tentava me acalmar o mais rápido possível. Minha respiração voltava ao ritmo normal e o choro diminuía a cada segundo - talvez por ter esgotado meus estoques de lágrimas.

Bob desliza sua mão pelo meu rosto secando meu suor e lágrimas e acariciando minhas bochechas. A presença do ruivo ao meu lado, com seu corpo nu colado ao meu, me consolava e trazia segurança. A tensão dos meus músculos diminui e meu corpo começa a ceder as consequência do esforço repentino.

-Eu estou aqui ThommyMuito bem "conteiros", é só isso por hoje.

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