"Irresistivelmente Cretino" 4

Um conto erótico de Bennett Ryan
Categoria: Homossexual
Contém 3699 palavras
Data: 21/04/2017 00:33:39

BENNET

Você tem que estar brincando.

Girei a chave na ignição e acelerei até o indicador de rotações por minuto atingir o vermelho. Eu queria queimar o asfalto, deixando a marca preta dos pneus na rua como um sinal da minha frustração.

Eu estava cansado. Merda, eu estava mesmo cansado, e odiava ter que arrumar a bagunça dos outros no trabalho. Eu vinha trabalhando por doze, quinze, inferno, até dezoito horas por dia há meses, e na única noite em que pude deixar tudo de lado e ter um tempo com o Daniel em casa, recebo uma ligação de emergência. Fiz uma pausa quando essa palavra ficou reverberando em minha mente: casa. Fosse na minha casa ou na dele, fosse saindo com os amigos ou indo àquele restaurante chinês que ele tanto gosta, com ele eu me sentia em casa. A parte mais estranha era que a casa que me custou uma fortuna nunca pareceu um lar até ele começar a passar um tempo por lá. Será que ele também sentia que sua casa era onde quer que estivéssemos juntos? Ainda nem tínhamos tido a chance de escolher onde íamos morar em Nova York. Encontramos um bom lugar para a RMG, fizemos um mapa com todos os novos escritórios, desenhamos as plantas, planejamos as reformas e contratamos uma designer… mas não escolhemos um apartamento para morar. O que era o maior sinal de que velhos hábitos custam a morrer, pois, na realidade, minha relação com ele mudou completamente minha relação com o trabalho. Apenas um ano atrás, eu estava comprometido com apenas uma coisa: minha carreira. Agora, o que mais importava para mim era o Daniel, e sempre que minha carreira atrapalhava meu tempo com ele, isso me consumia por dentro. Eu nem sei especificamente quando isso aconteceu, mas suspeito que a mudança surgiu muito antes de eu admitir. Talvez tenha sido na noite em que Joel foi jantar na casa dos meus pais. Ou talvez no dia seguinte, quando eu caí de joelhos diante dele e me desculpei da única maneira que eu sabia. Talvez tenha até sido antes de tudo isso, na primeira noite em que eu o beijei, desesperadamente, na sala de conferência, em meu momento de maior fraqueza. Graças a Deus eu fui tão idiota! Olhei para o relógio no painel. A data, iluminada em vermelho, me atingiu como um soco no peito: cinco de maio. Exatamente um ano atrás, eu vi Daniel sair do avião vindo de San Diego, com os ombros curvados de raiva e dor por eu ter praticamente o jogado debaixo de um ônibus depois dele salvar a minha pele com um cliente. No dia seguinte, ele pediu demissão e me deixou. Eu pisquei os olhos, tentando tirar essa lembrança da minha mente. Ele voltou, lembrei a mim mesmo. Nós tínhamos acertado os ponteiros nos últimos onze meses e, apesar de toda minha frustração com a agenda do trabalho, eu nunca estive tão feliz. Ele era o único homem que eu queria. Lembrei da última vez que terminei uma relação, com Steven, quase dois anos antes. Nosso namoro começou como uma escada rolante: com um solitário primeiro passo e depois seguindo automaticamente em uma mesma direção. Começamos de um jeito amigável e rapidamente entramos na intimidade física. A situação funcionava perfeitamente para mim, pois ele me oferecia companhia e sexo, e nunca pedia nada além do que eu oferecia. Quando terminamos, ele admitiu que sabia que não daria mais. Disse que, por um tempo, o sexo e a quase-intimidade foi suficiente, mas que não era mais o bastante. Após um longo abraço e um último beijo, eu o deixei partir. Fui jantar sozinho e em silêncio no meu restaurante favorito, e depois fui direto para a cama, onde dormi a noite inteira. Nada de drama. Nada de coração partido. Tudo acabou e fechei a porta dessa parte da minha vida, completamente pronto para seguir em frente. Três meses depois, voltei para Chicago. Foi engraçado comparar aquela época à minha reação quando perdi o Dan. Eu praticamente me transformei em um mendigo, sem comer, sem tomar banho e sobrevivendo inteiramente com uísque e autopiedade. Eu lembro de ficar obcecado com cada detalhe que Sam me trazia sobre Daniel – como estava sua aparência, como estava lidando com tudo – a partir do qual eu tentava adivinhar se ele sentia minha falta e se estava tão miserável quanto eu. O dia que o Daniel voltou para a RMG, coincidentemente, foi o último dia de Sam na empresa. Embora tivéssemos feito as pazes, Daniel tinha insistido que deveria continuar a dormir em sua casa e eu na minha, para podermos descansar um pouco. Então, após uma manhã caótica, entrei na sala de descanso e encontrei Daniel atacando um pacote de amêndoas e lendo alguns relatórios de marketing. Sam estava esquentando algumas sobras no microondas, depois de recusar nossas tentativas de preparar um grande almoço de despedida. Eu tinha ido até lá para tomar uma xícara de café, e nós três ficamos quietos por uns quinze minutos. Então, finalmente, quebrei o silêncio.

– Sam – eu disse, sentindo o volume da minha voz alto demais. Seus olhos se viraram para mim, arregalados e límpidos. – Obrigado por me procurar no dia em que o Daniel se afastou. Obrigado por me atualizar sempre que podia. Por isso, e outras razões, eu sinto muito por você ir embora.

Ele deu de ombros, passando a mão nos cabelos e me dando um pequeno sorriso.

– Apenas estou feliz em ver vocês dois juntos de novo. As coisas estavam quietas demais por aqui. E por “quietas”, quero dizer “chatas”. E por “chatas”, quero dizer ninguém gritando ou chamando o outro de Emissário do capeta – ele tossiu e tomou um gole de sua bebida, de uma forma barulhenta e quase cômica.

Daniel gemeu.

– Isso não vai mais acontecer, eu te asseguro – ele jogou uma amêndoa na boca. – Ele pode não ser mais meu chefe, mas definitivamente ainda adora gritar.

Rindo, dei uma olhada em sua bunda quando ele se abaixou para pegar uma garrafa de água na parte de baixo da geladeira.

– Mesmo assim – eu disse, virando de novo para Sam –, eu te agradeço por ter me mantido atualizado. Sem isso, eu provavelmente enlouqueceria.

Os olhos de Sam relaxaram e, quando começou a mexer os dedos inquieto, eu percebi que ele ficou um pouco desconfortável com a minha rara demonstração de sentimentos.

– Como eu disse, estou feliz por ter funcionado. Vale a pena lutar por esse tipo de coisa – ele ergueu o queixo e deu um último sorriso para o Daniel antes de sair da sala.

A felicidade que eu senti após o retorno do Dan facilitou ignorar os sussurros que nos seguiam pelos corredores da empresa. Eu tinha meu escritório e ele agora tinha o dele, e nós dois estávamos determinados a provar a todos (e a nós mesmos) que conseguiríamos conciliar isso. Conseguimos ficar separados por quase uma hora inteira.

– Senti saudade de você – ele disse, entrando na minha sala e fechando a porta. – Você acha que eles vão me dar minha antiga sala de volta?

– Não. Por mais que eu goste dessa ideia, seria completamente inapropriado.

– Eu meio que estava brincando – ele revirou os olhos e fez uma pausa, olhando ao redor. Eu quase podia ver as memórias voltando à sua mente: quando se punhetou em cima da mesa para mim, quando eu o fiz gozar para distraí-lo de suas preocupações e, imagino, todas as vezes que sentamos juntos no escritório, sem falar aquilo que deveríamos ter falado há tanto tempo.

– Eu te amo – eu disse. – Eu te amo faz um bom tempo.

Ele piscou os olhos, se aproximou e me beijou. Então me puxou para o banheiro e implorou para eu fazer amor com ele contra a parede, ao meio-dia de uma segunda-feira.

Enquanto eu entrava na garagem do escritório e estacionava em minha vaga, lembrei das palavras do Sam. Vale a pena lutar por essas coisas. Sam seguia seu próprio conselho com o pior cafajeste de Chicago. Ele cuidou de mim quando sabia que eu estava perdido sem o Daniel. Em comparação, deixei Sam continuar com um homem que eu sabia ser infiel, tudo porque sentia que interferir não era o meu papel. Onde eu estaria se Sam tivesse pensado o mesmo? me Perguntando o que essa atitude dizia sobre mim, saí do carro e entrei no saguão principal. O segurança da noite acenou e voltou a ler seu jornal enquanto eu andava até os elevadores. O prédio estava tão vazio que eu podia ouvir cada som das máquinas ao meu redor. As polias trabalhavam e o elevador soltou um pequeno barulho quando chegou ao 18º andar. Eu sabia que mais ninguém estava ali. A equipe estava se virando para encontrar a versão mais recente do arquivo, e no meio de seu pânico eles estavam, provavelmente, olhando nos laptops pessoais de todo mundo. Duvido que alguém tivesse pensado em ir até ali e checar os servidores do trabalho. No fim, tive que deixar Daniel em casa por causa de um trabalho que durou apenas vinte e três minutos, era por isso que meu humor na segunda-feira era terrível. Eu odiava ter que fazer o trabalho dos outros. O contrato foi nomeado errado e – exatamente como suspeitei – colocado na pasta errada do servidor. Na verdade, uma cópia física estava em cima da minha mesa, onde alguém com competência poderia tê-lo encontrado, e poupado essa minha viagem até ali. Enviei o arquivo para um dos meus executivos de marketing e fiz várias cópias do documento, destacando na primeira página os responsáveis e deixando uma cópia na mesa de cada um dos envolvidos antes de finalmente ir embora. De certa maneira, foi um gesto bem cretino da minha parte. Mas isso é o que eles ganham quando me tiram do Daniel. Eu sabia que esses pequenos inconvenientes me irritavam mais do que o normal, mas é esse tipo de detalhe que define uma equipe. E era exatamente por isso que eu precisaria de uma pessoa extremamente competente no escritório de Nova York.

De volta ao carro, resmunguei enquanto dava a partida no motor, sabendo que isso era apenas mais uma das coisas que eu precisaria resolver no mês seguinte. Com meu humor atual, eu não podia voltar para o meu Dan. Eu apenas seria uma companhia irritada e ranzinza… e não de um jeito divertido. Deus, eu só queria ficar com ele. Por que isso precisava ser tão difícil? Nós já tínhamos tão pouco tempo do jeito que as coisas estavam, eu não queria desperdiçar ainda mais tempo por estar estressado com o trabalho, com a busca por um apartamento, com a busca por uma pessoa que conseguisse trabalhar sem precisar de uma babá. Nós reclamávamos por não nos vermos tanto quanto queríamos, por trabalhar tanto… Então, por que simplesmente não… concertávamos isso? Podíamos viajar. Daniel pensava que essa era uma hora ruim, mas quando é que a hora seria boa? Ninguém iria simplesmente nos entregar um tempo livre, e desde quando eu sou o tipo de pessoa que espera algo acontecer? Foda-se isso. Dê um jeito.

– Acorda para a vida, Ben! – minha voz ecoou no interior do carro e, após uma rápida olhada para o relógio, para me certificar de que não estava ligando tarde demais, peguei meu celular e disquei o número. Dirigi para fora da garagem e entrei na Michigan Avenue. Após seis chamadas, a voz do Max Stella surgiu nos alto-falantes do carro.

– Fala, Ben!

Eu sorri, acelerando para longe do trabalho e seguindo para um dos lugares mais familiares do mundo para mim.

– Max, como vai você?

– Tudo bem. Tudo ótimo. E o que é essa boataria toda que estou ouvindo sobre você mudar suas coisas para Nova York?

Assenti e disse:

– Pois é, estaremos aí em pouco mais de um mês. Vamos ficar entre a Fifth Avenue e a 50th Street.

– Perfeito, fica perto do meu escritório. Vamos nos encontrar quando você chegar… – sua voz sumiu de repente.

– Sim, sim, com certeza – eu hesitei, sabendo que Max provavelmente estava imaginando por que eu lhe ligara às onze e meia da noite em uma terça-feira. – Olha, Max, eu queria pedir um favor.

– Manda.

– Eu queria viajar um pouco com o meu namorado e…

– Namorado? Nossa Bennett Ryan namorando serio– sua risada preencheu o carro. Eu ri também. Eu tinha certeza de que nunca apresentei ninguém para Max dessa maneira.

– O Daniel, sim. Nós trabalhamos na RMG e estamos entalados até o pescoço com a campanha da Papadakis. Está indo tudo bem até agora, e talvez a gente arrume um tempinho antes de mudarmos… – eu hesitei novamente, sentindo as palavras fugirem de mim. – Seria maluco demais se eu contratasse alguém para fazer a nossa mudança e encontrar um lugar para a gente em Nova York enquanto nós dois apenas… fugimos por algumas semanas? Apenas para sair da cidade?

– Isso não parece loucura para mim, Ben. Na verdade, parece a melhor maneira de se manter são.

– Eu também acho. E sei que é impulsivo, mas eu estava pensando em levar o Daniel para a França. Queria saber se você ainda tem aquela casa em Marselha, e se poderíamos alugar por algumas semanas.

Max estava rindo silenciosamente.

– Sim, ainda tenho. Mas esqueça essa coisa de alugar, pode usar sem se preocupar. Vou te passar o endereço agora mesmo e pedir para Inês ir limpar para vocês. O lugar está vazio desde que passei o Natal lá – ele fez uma pausa. – Quando você está pensando em ir?

O aperto em meu peito pareceu dar uma trégua quando o plano começou a se solidificar em minha mente.

– Neste fim de semana?

– Claro, vou cuidar de tudo. Quando tiver os detalhes do seu voo, envie para mim. Vou ligar para ela amanhã de manhã e dizer para encontrar você lá com as chaves.

– Isso é fantástico. Obrigado, Max. Fico devendo uma.

Eu podia praticamente ver seu sorrisinho quando ele disse:

– Vou me lembrar disso.

O que eu não sabia é que num futuro muito próximo ele iria me cobrar esse favor. Filho da puta.

Eu me senti relaxado pela primeira vez em décadas e aumentei o volume do rádio, imaginando nós dois entrando no avião, sem nada pela frente exceto tardes ensolaradas, longas manhãs preguiçosas na cama e a melhor comida e vinho que o mundo podia oferecer. Mas eu precisava fazer mais uma parada. Eu sabia que era tarde para ir até a casa dos meus pais, mas eu não tinha escolha. Minha mente estava girando com planos e eu não poderia ir para a cama até que cada detalhe estivesse decidido. Na viagem de vinte minutos até a casa deles, eu liguei e deixei uma mensagem para a minha agente de viagens. Depois deixei um recado para meu irmão Henry dizendo que viajaria por três semanas. E não me permiti imaginar sua reação. Nós tínhamos um novo escritório, tudo no trabalho já estava preparado e o empacotamento podia ficar a cargo de outra pessoa. Deixei uma mensagem para cada um dos meus executivos seniores falando sobre meu plano e o que eu esperava de cada um na minha ausência. E então baixei as janelas e deixei o ar gelado da noite me envolver, levando todo o meu estresse para longe.

Estacionando na frente da casa dos meus pais, eu ri ao lembrar da primeira vez que o Daniel e eu viemos até ali como um casal. Três dias haviam se passado desde sua apresentação do MBA. Durante dois desses dias nós pouco saímos da minha casa ou da minha cama. Mas, após as constantes ligações e mensagens da minha família nos convidando para jantar e me pedindo para compartilhar um pouco do Daniel, nós concordamos em encontrá-los na casa dos meus pais. Todos estavam com saudade dele. Nós conversamos bastante durante a viagem, rindo e nos provocando, minha mão livre entrelaçada com a dele. Com os dedos da outra mão, ele distraidamente fazia pequenos círculos no topo do meu pulso, como se quisesse ter certeza de que era tudo real, de que eu era real, de que nós éramos reais. Ainda não tínhamos encarado o mundo exterior, com exceção da primeira noite, em que saímos com seus amigos. A transição com certeza seria um pouco estranha. Mas eu nunca imaginaria que o Daniel ficasse ansioso por causa disso. Ele sempre encarava todos os desafios com sua própria dose de coragem.

Apenas quando já estávamos de pé em frente à casa e eu estava abrindo a porta, percebi que sua mão estava trêmula.

– O que foi? – soltei sua mão e o virei para me encarar. Ele deu de ombros.

– Nada. Estou bem.

– A quem você quer enganar?

Ele me lançou um olhar irritado.

– Estou bem. Apenas abra logo a porra da porta.

– Uau! – eu disse, surpreso. – Daniel Bennitiz está nervoso de verdade.

Desta vez ele parou para me encarar direto nos olhos.

– Você reparou? Meu Deus, você é um gênio. Alguém deveria te contratar como CEO e te dar um escritório grande e chique – então, ele estendeu o braço para abrir a porta. Eu o impedi de girar a maçaneta e um sorriso malicioso se espalhou em meu rosto.

– Dan?

– É que eu não os vi mais desde… você sabe. E eles sabem como você ficou quando… – ele fez um gesto ao redor, e eu entendi que ele queria dizer – Quando Bennett estava um completo desastre depois que o Daniel foi embora. Só… vamos tentar não fazer nenhum drama, certo? Estou bem – ele completou.

– Estou apenas me divertindo com essa rara visão do Daniel nervoso. Me dê um segundo, quero aproveitar o momento.

– Vá se foder.

– Você quer me foder? – dei um passo em direção a ele, até seu corpo ficar pressionado contra o meu. – Você está tentando me seduzir, sr. Bennitiz?

Finalmente, ele riu, os ombros desistindo de sua tensa determinação.

– Apenas não quero que seja…

A porta da frente se abriu de repente e Henry apareceu, dando um grande abraço em Daniel.

– Aí está você!

Daniel olhou para mim por cima do ombro do meu irmão e riu.

– … Constrangedor – ele completou, envolvendo os braços ao redor dele. Meus pais estavam de pé atrás da porta, mostrando os maiores sorrisos que eu já vi. Os olhos da minha mãe estavam estranhamente molhados.

– Você ficou longe por tempo demais – Henry disse, soltando meu namorado e olhando para mim. A forma como ele abraçou meu namorado me incomodou horrores.

Resmunguei em minha mente e percebi que aquela noite poderia rapidamente se transformar em uma reedição da novela “O quanto o pobre Daniel sofreu nas mãos do cruel Bennett” – e a personalidade difícil dele seria completamente omitida da história. Ainda bem que ele estava incrível naquela calça jeans azul. Eu precisava de uma distração. Eu havia ligado para o meu pai na manhã da apresentação do Daniel, avisando que pretendia aparecer por lá e convencer ele a apresentar a conta da Papadakis. E também disse que pediria pra ele me aceitar de volta. Como de costume, meu pai me apoiou, mas de um jeito reservado, dizendo que seja lá o que Daniel respondesse, ele estava orgulhoso de mim por ir atrás daquilo que eu queria.

“O que eu queria” agora estava com aquela bunda fantástica entrando na casa e abraçando minha mãe e meu pai, antes de olhar para mim.

– Não sei por que eu estava preocupado – ele sussurrou.

– Você estava nervoso? – minha mãe perguntou, com olhos arregalados.

– É que eu sumi tão de repente. Eu me senti culpado por causa disso e por passar tanto tempo sem ver nenhum de vocês…

– Não, não, não, você precisava se entender com Benn! – Henry disse, ignorando meu suspiro irritado.

– Acredite, nós entendemos.

– Vamos lá – eu grunhi, puxando ele de volta pra mim. – Não precisamos fazer drama.

– Eu já sabia, a cabeça dura do Ben era que atrapalhava tudo. Era impossível não notar a atração que existia entre vocês. – minha mãe sussurrou, pousando as mãos no rosto do Daniel.

– Eu já sabia. – Mas que diabos, mãe! – eu me aproximei e a abracei, antes de fazer uma cara feia para ela. – Você sabia disso mesmo quando combinou o jantar com Joel?, que tipo de mãe e a senhora?.

– Você nunca ouviu dizer “use logo ou desocupe a moita”? – Henry disse.

– Essa não é a frase que eu usaria, Henry Ryan – minha mãe lançou um olhar bravo para ele e depois envolveu Daniel com o braço, conduzindo-o pelo corredor. E se virou para falar comigo por cima do ombro. – Pensei que se você não queria enxergar o que estava na sua frente, então outra pessoa merecia uma chance.

E naquele momento eu percebi que poderia ter perdido meu Daniel por conta do meu orgulho.

– O pobre Joel nunca teve chance alguma – meu pai murmurou, surpreendendo a todos e aparentemente a si próprio. Ele ergueu a cabeça e começou a rir. – Alguém precisava dizer isso.

Saindo do carro, eu sorri com a lembrança do resto da noite: os dez minutos em que todos rimos e compartilhamos nossas histórias sobre ter infecção alimentar em momentos inoportunos, o inacreditável crème brûlée que minha mãe serviu no jantar e, mais tarde, o jeito como eu e Daniel mal chegamos em casa e já caímos em um emaranhado de pernas e braços no chão da minha sala de estar. Girei a maçaneta da porta da frente, sabendo que meu pai estaria acordado, mas esperando não acordar minha mãe. A maçaneta fez um chiado e eu empurrei a porta com o cuidado de sempre, levantando-a um pouco onde eu sabia que a madeira raspava no chão. Mas, para minha surpresa, minha mãe me recebeu na entrada, vestindo seu velho roupão púrpura e segurando duas xícaras de chá.

– Não sei por quê – ela disse, me oferecendo uma xícara –, mas eu tinha certeza de que você iria aparecer por aqui hoje.

– Intuição de mãe? – eu disse, aceitando a xícara e beijando seu rosto. Eu me demorei um pouco, tentando manter minhas emoções controladas.

– Algo desse tipo – lágrimas desceram de seus olhos e ela se virou antes que eu pudesse dizer alguma coisa. – Venha, eu sei por que você está aqui. O anel está lá na cozinha com seu pai.

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