Cuca fundida

Um conto erótico de Aparecido Raimundo de Souza
Categoria: Heterossexual
Contém 1287 palavras
Data: 26/11/2016 18:03:33
Assuntos: Heterossexual

Cuca fundida

(*) Texto de Aparecido Raimundo de Souza.

(**) Sobre este trabalho.

1

A PROFESSORA Esther entrou na sala de aula, mandou um alegre e bem humorado bom dia a todos e comunicou que, naquela manhã, no lugar da aula normal, realizaria uma brincadeira. No final, daria um smartphone última geração de presente a quem respondesse, de forma criativa, uma pergunta que endereçaria à classe. Para que ninguém saísse prejudicado, convidou a diretora, professora Yolanda e a professora Fafá, para ajudarem na empreitada. Elas se prestariam a participar do certame intercedendo na escolha como representantes do corpo de jurados.

2

Realmente, ao chegarem minutos depois, as duas convidadas deram com os alunos perfilados em sinal de respeito, ao lado das suas respectivas carteiras, como se preparados para cantar o Hino Nacional. Tiveram ordem para se sentarem, o que fizeram de imediato. A peleja, para a melhor resposta e o ganho do anunciado, teria o tão esperado início.

- Combinei com a nossa diretora, professora Yolanda e, igualmente, com a professora Fafá, que uma única pergunta seria feita a todos, para evitar atropelos e confusões. Podemos começar?

3

Um sim em uníssono se ouviu de canto a canto. A galera agonizava de alegria para que a disputa principiasse de vez e sem mais delongas. O smartphone prometido brilhava aos olhinhos ávidos da garotada, obviamente à espera do vencedor, acondicionado numa caixinha ao lado do trio de docentes. Um prêmio desses seria, de fato, uma bênção do céu. O afortunado (ou afortunada) sairia feliz. A maioria dos frequentadores daquele estabelecimento de ensino (não só daquela sala, mas das outras que compunham toda a escola), era oriunda de famílias pobres e sem condições de adquirir um desses aparelhos, ainda que em prestações a se perderem de vista. Fizeram um sorteio e o escolhido para encabeçar a lista, foi o Paulinho.

— Muito bem, meu jovem. Preparado?

— Sim professora...

— Boa sorte, pra você. Agora diga para nós: qual a coisa mais pesada que existe?

4

O menino não titubeou e mandou brasa.

— O canhão, professora.

A professora Fafá imediatamente anotou ao lado do nome do estudante, a resposta fornecida.

— Sua vez, Jerônimo: qual a coisa mais pesada que existe?

— Um avião de carga.

— Muito bem, Jerônimo. Pedro Paulo, qual a coisa mais pesada que existe?

— Um transatlântico desses que viajam pelos mares do mundo.

— Legal. Soninha, por favor, se levante e nos diga: qual a coisa mais pesada que existe?

— Um prédio de cem andares, professora.

— Estamos indo bem. Vamos em frente. Adriana, minha linda: qual a coisa mais pesada que existe?

— A ponte Rio-Niterói, lá no Rio de Janeiro.

— Interessante Adriana. Ok. Rúbia: qual a coisa mais pesada que existe?

— Fácil professora. A consciência pesada.

— Uau! Muito boa a sua resposta. Criativa. Extremamente criativa. Dudu: qual a coisa mais pesada que existe?

5

— A caixa d’água na entrada da nossa cidade.

— Boa observação, Dudu. Pode sentar. Serginho: qual a coisa mais pesada que existe?

— Um cofre de banco.

— Pode voltar ao seu lugar. Luciano: qual a coisa mais pesada que existe?

—?

— Luciano, quer, por favor, responder a indagação?

— Que isso, professora?

— Indagação é o mesmo que pergunta.

— Tô ligado, professora...

— E qual é a sua opinião?

— Meu Deus, professora, que opinião?

— À pergunta que fiz a todos os seus coleguinhas.

— Claro professora. Que viagem! Dá pra repetir, por favor?

— Luciano, já avisei que não admito celular em sala de aula. Por gentileza, desligue o seu e entregue à diretora Yolanda, por obséquio.

— Sim, senhora. Poderia repetir a pergunta?

— Qual a coisa mais pesada que existe?

— Uma carreta transportando uma peça de duzentos e oitenta toneladas.

— Ok. Armandinho, para você, qual a coisa mais pesada que existe?

— O elefante, professora.

— Junior, diga aí: qual a coisa mais pesada que existe?

— Pra mim, professora, é a baleia. O que a senhora acha?

— Não sei. Vamos avaliar no final. Lurdinha, queremos saber de você. Valendo este smartphone zerado, com câmera frontal, dentro da caixa: qual a coisa mais pesada que existe?

— Fácil demais, professora. A balança da farmácia do seu Cunegundes.

6

Assim seguiu a professora Esther com a pergunta, até que chegou no vigésimo sétimo, o derradeiro.

— Adamastor, finalmente chegou a hora de sabermos a sua resposta. Como já dito anteriormente, valendo este smartphone: qual a sua resposta para a coisa mais pesada do mundo?

O menino se mostrou meio amedrontado. Parecia um tataranha recém chegado do sertão mais distante do planeta.

— Posso falar de verdade, professora?

— Sim, Adamastor.

— A senhora não vai brigar?

— De forma alguma.

— Nem me deixará de castigo, depois da aula?

— Não, Adamastor. Por que faria tal coisa?

O guri continuou cabisbaixo e pensativo.

— Estamos esperando, meu jovem simpático? Qual a coisa mais pesada que existe?

— Por acaso, professora, a dona Yolanda, a diretora ai a seu lado, não me levará para a diretoria?

— Não, Adamastor. Responda...

— A professora Fafá...

—Adamastor, pela última vez, qual a sua resposta?- Diga agora ou serei obrigada a riscar seu nome da disputa...

— Está bem, professora. A coisa mais pesada que existe é o pinto do meu pai...

7

Nesse momento as três mulheres se olharam, espantadas e boquiabertas. Ficaram em pé, ao mesmo tempo, como se uma corrente elétrica tivesse sido acionada e as cadeiras que ocupavam houvessem recebido uma forte descarga de energia.

— O que é isso, Adamastor? Respeite a nossa diretora, professora Yolanda, a professora Fafá, e, sobretudo, seus coleguinhas. Olhe para os lados. Temos meninas aqui. Onde já se viu dizer uma barbaridade dessas?

Envergonhado, o piá seguia ereto em seu lugar, os olhos fixos no chão.

— Professora, a senhora disse que eu podia dizer...

— Eu sei filho, mas...

— A professora Fafá e a dona Yolanda estão de prova...

— Está legal, Adamastor. Dessa vez vou fazer vistas grossas e pedirei encarecidamente à nossa diretora, professora Yolanda e à professora Fafá que relevem a sua insensatez, a sua descompostura e falta de modos.

8

A diretora, professora Yolanda, aparteou chamando o moleque à frente.

— Meu filho, como diretora desta escola, lhe asseguro que não vamos tomar nenhuma providência com relação ao que acabou de acontecer aqui. Perdoaremos você, desta vez, rogando que não volte a repetir uma coisa feia dessas na frente de seus amiguinhos.

9

A professora Fafá, por sua vez, pediu licença e quis um esclarecimento mais detalhado em torno daquele ato que considerou estranho, tendo em vista a idade do menino e a sua resposta tão certeira e ao mesmo tempo contundente em cima de um assunto sério demais.

— Quem foi que te disse isso, Adamastor, ou melhor, meu filho, quem revelou a você tal e tremenda asneira?

— Minha mãe, professora...

— Sua mãe? Como assim, meu querido? De onde ela tirou essa loucura?

— Toda a vizinhança sabe disso, professora Fafá. Até os cachorros da rua se duvidar... eu só repeti aqui o que escuto a todo instante... não só em casa, mas nos comentários das amigas quando se encontram com ela na feira, no supermercado, na padaria, no açougue...

— Confesso que continuo não entendendo. Quer ser mais explícito, mais claro, mais objetivo? O que você escuta a todo instante em casa e igualmente quando sai com sua mãe?

— A senhora não vai pedir para me expulsar da escola?

— Não...

— Nem falar para a professora Esther me deixar de castigo, ou mandar chamar o pessoal lá de casa?

— Prometo. Juro. Tem minha palavra.

10

Em prantos, o moleque com cara de fome e magreza de esqueleto concluiu a sua breve história.

— Quase todas as noites, sempre ouço a mamãe dizer para o meu pai, depois de algum tempo que se deitam: “Ricardo, esse negócio seu, no meio das pernas, nem Deus levanta”.

(*) Aparecido Raimundo de Souza, 63 anos, é jornalista.

(**) Especialmente escrito para o site “CASA DOS CONTOS”

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