Praga, o novo mundo - Capítulo 3 - Perdas e Ganhos - Part 1

Um conto erótico de T.B
Categoria: Homossexual
Contém 2444 palavras
Data: 17/11/2016 23:34:15

Dando continuação a saga temos o Capítulo 3 divididos em dua partes.

Capítulo 3 - Perdas e Ganhos - Part 1

“Em pé diante da grande varanda da casa central eu olho os habitante andando pelas poucas ruas da comunidade. Muitas delas vieram até nós com ferimentos horríveis, famintas e apavoradas… tudo isso era um presente do novo mundo. Impiedoso ele tirava tudo de valor que uma pessoa em Praga poderia conquistar… sua humanidade.

Moças chegavam traumatizadas pelas barbáries praticadas pelos saqueadores, homens tinham seus rostos quase que desconfigurados e seus corpos abusados, os idosos quase não olhavam em nossos olhos como se esperasse uma reação violenta e familiar.

Me lembro da primeira família que recebemos quando a comunidade ainda era um conjunto de duas casas. Agradeço a minha mãe por gostar de morar no meio do campo desde os tempos de paz onde a sociedade caminhava rumo ao progresso… progresso nada duradouro.

Madame Sara, como gostava de ser chamada, acolheu de braços abertos a mãe e suas três filhas que chegaram através da grande rodovia. Pelos Deuses, os olhos da mulher pareciam ter visto o inferno, e de acordo com seus relatos ela realmente havia conhecido e experimentado a primeira avalanche de terror.

Martha - o nome da mulher - ficou tão grata pela oportunidade que de qualquer forma queria pagar pelo favor, atitude que mamãe levou quase como uma ofensa. Servir um convidado estava na sua lista de coisas preferidas, logo atrás de tiro ao alvo e cantar (não posso nem explicar o cerne de Sara quando percebeu que havia dado uma nova chance a quatro seres inocentes, e foi a partir desse dia que ela cultivou a ideia da comunidade).

Agora, diante de mim, se encontra uma grande família, pessoas de bem que amam com todas as forças os seus companheiros. Sempre foram acreditados a manter a ordem e o respeito dentro daqueles limites.

Todas as religiões, amores e etnias eram aceitas sem sequer questionar a possibilidade de jogar ao mundo desconhecido alguém apenas por ser diferente, pensar diferente ou amar diferente.

O sol brilhava em fim de tarde em um tom alaranjado e o vento de outono minimizava o calor do campo. Os risos das crianças correndo pela ruas da vila e misturavam com as vozes de cantoria dos religiosos que lançavam ao vento seus agradecimentos aos dias tranquilos.

-Uma cena digna de uma pintura, pequeno César… ou quem sabe um Alexandre - diz mamãe caminhando até onde eu me encontrava e tocando o meu ombro.

-Se algum dia você não for teatral… saberei que está doente - me viro e vou em direção a uma mesa no centro da sala.

-Se esse dia chegar, tenha certeza, eu estarei morta.- Sara era mais do que dramática, era misteriosa - Se existe algo que Praga não pode me tirar é minha essência, meu brilho e meu talento.

-Aproveitando que vossa reverendíssima deu as caras na casa central essa semana eu gostaria de lhe mostrar isso - pego o caderno de capa vermelha de cima da mesa e indico a página. - Está vendo que o campo não está produzindo o necessário, fico temeroso que mais pessoas cheguem antes do Inverno e o estoque não dê conta.

Sara afasta o caderno com a mão com expressão negativa, como se a notícia a retirasse de um sonho maravilhoso e a levasse a um pesadelo de criança.

-Pelo amor de Monroe, eu estou de féria e hoje pretendo cantar até o amanhecer, afinal de contas só se vive uma vez.

Dou um pulo de susto quando ouço vozes alteradas vindas do bar, localizado nas extremidades da colônias, aquele lugar sempre me deixava apreensivo. O meu medo de algo horrendo ser criado dentro daquele recinto era mais claro e expressivo o possível - eu me refiro ao lado ruim do ser humano quando digo horrendo, a pior das criaturas.

Caminho até a janela em passos pesados demonstrando minha indignação, a noite já chegara e pela minha experiência em dias de cantoria aquele lugar era insuportável.

-Não preciso expressar a minha total desaprovação quanto aquele lugar, nós acolhemos pessoas da violência externa e criamos um ambiente daqueles - digo com revolta misturada com um toque de preocupação.

-Venha comigo criança - a voz de Sara mudou para um tom acolhedor, - Olhe o que você construiu, olha quantas pessoas você salvou… Dê uma olhada naquele bebê, ele é o fruto do seu trabalho.

-Nosso… - eu sussurro com intuito de corrigi-la sem interromper.

-Não, você… eu apenas dou a trilha sonora, porém todo o enredo é você quem cria. - Sara se vira para mim e acaricia meu rosto. - Tudo começou com a Martha, e mesmo depois que eu morrer este lugar vai continuar crescendo graças a você.

Madame Sara, por mais que teatral e misteriosa, tinha em seu interior um toque de velha sábia com seus conselhos indispensáveis. Olho novamente para fora e vejo que, diferente de tudo lá fora, aquele era um oásis em meio a um deserto.

-Agora eu preciso me retirar, aquecimento é o mais importante, Sir…. Que os Deuses ouçam a minha voz, um presente às divindades como forma de agradecimento a tudo o que conquistamos. - diz Sara rodopiando pelo meio da sala em direção a porta.

-E você garoto, precisa transar - Sara alerta novamente com a expressão séria.

-Mamãe… - respondo com indignação e constrangimento.

-Ache um homem e transe… garoto teimoso - Sara se retira batendo a porta de forma dramática.”Bob!!!

Acordo com um suspiro tão profundo que a dor é notável. Já havia escurecido e aquela floresta tinha se transformado em um cenário de terror, os poucos raios de luz da lua cheia davam a cada árvore um aspecto demoníaco.

A umidade tornava o frio mais cortante e os sons naturais do local me arrepiava inteiro. Em condições normais aquele cenário era romântico porém Bob tinha acabado de ser assassinado por um psicopata e nem uma hidromassagem e rosas faria aquele lugar reconfortante.

“Bob…” sussurro deixando as lágrimas escorrerem ao lembrar do evento anterior, parece que toda a emoção que eu não tivera tempo de expressar durante o acontecido veio a tona naquele exato momento.”Não… Bob…”, não havia jeito de me conformar com o ocorrido, o que mais Praga poderia me tirar, o homem que me fizera insistir em sobreviver e que me salvou a tempos atrás agora está morto.

Meu corpo não consegue se decidir entre respirar e chorar, minha cabeça dói com todos aqueles eventos para processar. Eu não consigo tirar a imagem do Bob da minha cabeça, o que acaba se tornando uma condenação… olhar sem poder tocar, nunca mais.

Em momentos semelhante Bob me abraçaria com tanta força, sempre me fazendo sentir seguro. O seu rosto transmitia uma paz; aquele cabelo liso e barba ruiva era típica de um soldado que parecia ser proibido de expressar um sorriso… mas mesmo assim eu havia me apaixonado, não de imediato mas ele me conquistou por completo.

“Não demonstre fraqueza, por mais cruel que seja a situação você deve prosseguir” dizia Bob durante as lutas… mas parecia que ele havia previsto aquele momento, como se estivesse me preparando para o pior que Praga pudesse me oferecer.

Eu não consegui fazer mais nada além de ficar encolhido no mesmo local em que eu havia acabado de acordar, não existia plano ou segunda opção… Bob estava morto, e por consequência eu também. Porém no fundo eu sabia que não deveria desistir, morrer sentado seria uma ofensa ao bravo homem da minha vida.

Resolvi então olhar em volta a procura de algum lugar seguro, algum abrigo em que eu pudesse ficar até o amanhecer. Andar por aquela floresta desconhecida onde eu mal podia ver dez metros à minha frente era desencorajador. Menos de cinco passos a direita eu percebo dois grande troncos sobreposto em forma de L, então resolvi ficar por entre eles apenas até o sol nascer.

Encosto em um deles e junto os joelhos como uma criança medrosa e, por mais que Bob desaprovasse desperdiçar forças com choro, eu permiti que aquelas lágrimas escorressem pelo meu rosto… apenas mais uma vezDesperto de repente e me decepciono quando percebo que a tragédia do dia anterior era a realidade com a qual eu deveria conviver para sempre. Parecia uma ironia do cosmos, as folhas verdes eram irradiadas pelos raios do sol criando vários feixes de luz que atingiam o solo.

Dava para perceber pelo menos uma dúzia de melodias das aves que eram completadas pelo vento das folhas velhas do solo sendo levadas pelas rajadas de vento aleatórias. O chão chegava a ser macio pela quantidade de folhas e o cheiro da floresta era reconfortante.

Nesse momento, como se a minha mente quisesse esfregar na minha cara a recente tragédia, aquela terrível cena de Bob caindo e sendo deixado para trás é estampada me fazendo querer gritar de raiva. As lágrimas se preparam para cair, mas como eu havia prometido noite passada, aquela teria sido a última vez.

Levanto me apoiando nos troncos ao lado procurando decidir para que lado eu seguiria viagem, eu não poderia ficar naquele lugar. Não queria voltar para trás e ver o corpo de Bob desfalecido, aquela era uma imagem que eu não suportaria ver. Decido seguir em frente por mais que a vista não mostrasse um objetivo, voltar estava fora dos planosSou puxado pelas memórias revividas anteriormente enquanto estava desacordado.

“Me sinto ofendido pelo fato de Sara expressar em alto e bom som a sua opinião sobre a minha vida sexual, um dos dois deveria trabalhar para manter a ordem do local.

-Pelos Deuses, essa mulher não tem concerto. Eu não estou desesperado e nem sinto necessidade. Madame rabugenta - digo em voz baixa como uma criança fazendo piada.

Por mais que eu aparente não gostar da ideia bem no fundo eu sentia uma vontade de criar laços. O tempo passa eu eu não quero apenas me dedicar a ‘cidadela’ por toda a minha vida, na verdade recentemente eu venho me flagrando pensando sobre um possível cônjuge.

Sem nada a perder, e traindo a minha recente desaprovação para com o recinto, eu resolvo descer e caminhar até o bar.

Desço pela escada chegando ao andar de baixo da casa central. Apenas uma sala enorme cheio de mapas e papéis fixado a parede, possuía uma mesa grande centralizada - nada de luxuoso, o suficiente para o moradores terem acesso a tudo o que era feito e as decisões tomadas pelos responsáveis.

Não existia um líder maior… não existia a necessidade de um líder maior, nunca houve alguém que quisesse se por a um cargo inexistente de chefe transparecendo a ganância. Esse desejo de poder, dentre outros desejos destrutivos, eram mantidos fora de nossos portões - digamos que o passado nos ensinou algo muito valioso sobre o excesso de poder nas mãos de uma só pessoa.

Na verdade, para não dizer que não existia uma figura de respeito, Sara era tida como uma matriarca que possibilitou a tranquilidade a cada alma cansada que vinha do mundo exterior… por isso que para todas as questões importantes todos os olhares se voltavam para ela.

Sem nem notar a passagem do tempo de caminhada eu chego a frente do bar, tomara que eu não tenha ignorado o ‘Boa Noite’ de alguém… as vezes parecia que eu me desligava.

Ao entrar no bar eu sou recebido, de forma inusitada, por um grito feminino e forte que faz com que a maioria pare e olhe para a porta por onde eu entrei. “Seja bem vindo, Grande César”. Era Sara, sentada em uma mesa no fundo com seu grupo de homens e mulheres.

-Pelo amor de Zeus mãe… - digo em voz baixa caminhando até o balcão.

Todos voltaram a suas conversas, cantos e gargalhadas enquanto eu tento não ficar vermelho de vergonha. Ter Sara como mãe exigia uma dose a mais de paciência, principalmente para quem não conseguisse entender sua alegria teatral.

-Que surpresa pequeno Thom - saudou Elias, um senhor baixinho que cuidava do estoque para que nenhum travesso tomasse um porre e causasse problemas, - Deixe-me ver o que eu tenho para o senhor.

Elias trabalhava cuidando dos animais da vila, isso inclui todos os tipos de tratamento desde alimentação até partos, e não se deixe levar pela estatura pois o temperamento do moço era explosivo - deve ser por isso que ele tomava conta do bar.

-Aceito qualquer coisa, obrigado.

Exploro ao redor apenas para conhecer aquele ambiente, não era do meu feitio beber e dançar… e sei lá o que eles fazem além disso. Umas sete mesas de seis lugares todos lotados, as pessoas se comunicavam de mesa a mesa dando suas gargalhadas e brincando uns com os outros. Observo também intrigado que em suas mesas havia poucos copos e nem uma garrafa, e isso se repetia em quase todas as mesas… menos é claro na da mamãe.

-As pessoas não bebem tanto assim, pelos gritos ouvidos de fora pode até parecer que sim - disse Elias colocando meu copo perto da minha mão chamando minha atenção.

-Pois é, eles estão tão alegres que eu pensei terem consumido todo o bar - replico dando risada de forma descontraída.

-Obrigado Thomas - disse Elias em olhar de gratidão eterna antes de sair para arrumar o outro lado do bar.

Olho mais uma vez e noto que aquele lugar na verdade era um ponto para amigos após as tarefa da vila. Eu estava começando a gostar da ideia do bar, essas pessoas são tão dignas.

Correndo com meu olhar pelo lugar eu percebo que ao meu lado no balcão, duas banquetas de distância, estava um homem de cabelos pretos e longo com barba por fazer. Usava uma camisa de manga longa cinza e calça preta, que parecia bem justa.

O homem não fazia questão de esconder o fato de estar me encarando, desenvolve um sorriso de canto de boca como se demonstrasse felicidade em me ver. Nesse momento eu me sinto totalmente tímido e para disfarçar eu viro os dois dedos da bebida transparente de uma só vez.

-Porra… que merda é essa? - falo em alto e bom tom ao sentir aquilo descer pela minha garganta.

-Hahahaha… Vai com calma Senhor, tem mais se o senhor quiser - Elias expressa em piada a minha cara de rejeição a bebida.

Sem eu notar o moço sai do seu lugar e se põe de pé ao meu lado. Eu, sem notar a sua mudança de lugar, sou surpreendido quando ele fala com sua voz rouca bem perto do meu ouvido:

-Ave, César. Posso me sentar ao seu lado e pagar mais uma bebida. - diz o moço já puxando a banquetaContinua parte

Se vocês puderem comentar para um Feedback eu agradeceria. Obrigado.

Siga a Casa dos Contos no Instagram!

Este conto recebeu 0 estrelas.
Incentive T.B a escrever mais dando estrelas.
Cadastre-se gratuitamente ou faça login para prestigiar e incentivar o autor dando estrelas.

Comentários

Este comentário não está disponível