Desvirginado pelo padre tarado

Um conto erótico de Kherr
Categoria: Homossexual
Contém 22204 palavras
Data: 27/10/2016 16:20:15

Desvirginado pelo padre tarado*

O chão estava forrado por uma grossa camada de folhas de olmo secas, em diversas nuances, que iam do amarelo ao marrom passando por vários tons de vermelho, que crepitavam sob os pés a cada passo. Caía uma chuva fina por entre o denso e baixo nevoeiro que assolava o cemitério naquele outono que agora me parecia muito distante e, se implantara na minha memória como a cena de um filme. Eu contava então com seis anos, e me lembro da sensação desoladora que sentia enquanto meu tio, a quem eu não tinha visto mais do que uma meia dúzia de vezes até então, segurava a minha mão entre a sua, úmida e fria, como era a nossa relação. Do capuz da capa de chuva impermeável que eu trajava pingavam grossas gotas que escorriam diante dos meus olhos. Havia poucas pessoas, com olhares consternados, ao redor da sepultura. Quando seus olhos paravam sobre mim, eu podia sentir algo como um misto de dó e compaixão. Apesar de não conseguir compreender bem o porquê, sabia que algo de errado havia acontecido e que, de alguma maneira, isso me afetava. Enquanto os dois esquifes desciam numa sequência lenta, o padre falava com uma voz empoada e lenta, algo que eu também não compreendia com clareza. Um dos coveiros colocou uma espécie de pazinha na minha mão que não estava dentro da do meu tio, e me lançou um olhar condoído. Sem entender a razão daquele gesto, fiquei uns instantes encarando-o inquisitoramente. Meu tio sobrepôs sua mão sobre a minha e enfiou a pazinha no monte de terra revolvida que estava ao lado da sepultura, tirando um pouco de terra e lançando-a para dentro da cova, sobre os caixões emparelhados lá no fundo. Depois foram os coveiros que iam lançando toda aquela terra fechando a sepultura, enquanto as pessoas observavam, em silêncio, aquele trabalho ingrato e árduo que, apesar do frio regelante que fazia, fez surgir gotas de suor na testa dos coveiros. Aquela pouco mais de uma dúzia de pessoas ao redor da sepultura era tudo que se movia no cemitério desolado, à exceção das folhas do arvoredo fustigadas pelo vento e pela chuva. Quando o trabalho dos coveiros havia terminado, eles fizeram uma ligeira reverência na minha direção e do meu tio, antes de se afastarem em silêncio. Enquanto as pessoas iam se despedindo do meu tio com um aperto de mão e algumas palavras murmuradas, eu olhava para aquele monte de terra revolvido, coberto com coroas de flores, que sobressaia da relva aparada. Duas mulheres me encararam e fizeram um carinho no meu rosto. Meu tio me conduziu até o carro onde um motorista, solicitamente, havia aberto a porta traseira para que pudéssemos entrar. Meu olhar se dirigiu mais uma vez para aquela sepultura enquanto o carro deslizava lentamente pela alameda que conduzia à saída do cemitério. Algo me dizia que eu havia deixado uma parte importante da minha vida debaixo daquela terra úmida.

Quando chegamos a casa, a Sra. Fintch veio abrir a porta antes mesmo de alçarmos os degraus diante da porta de entrada. Ela cumprimentou meu tio parcimoniosamente antes de me ajudar a tirar a capa de chuva encharcada.

- Veja se ele está precisando de alguma coisa, Sra. Fintch. Depois, sirva-lhe o jantar e leve-o ao seu quarto. Acho que ele teve um dia cheio por hoje e, o de amanhã não será diferente. – disse meu tio, antes de entrar no escritório de papai.

- Sim, senhor. Que lástima! Será que ele tem noção da tragédia que se abateu sobre sua vida? – respondeu a mulher que trabalhava para os meus pais desde antes de eu nascer.

- É provável que não! E, que essa ignorância seja uma benção para ele. – retorquiu meu tio. – Depois venha ao escritório, preciso ter uma palavra com a senhora. – emendou, enquanto eu e ela seguíamos em direção à cozinha.

Desde aquela manhã houve tanto movimento na casa, com a chegada de pessoas que eu jamais havia visto. Saídas e retornos apressados, a vinda daquele meu tio com os carros de polícia e, por fim, aquela ida ao cemitério quase ao final da tarde, que só agora, sentado diante do prato de sopa fumegante que a Sra. Fintch havia colocado diante de mim, é que me lembrei de que meus pais haviam se despedido de mim com um beijo na testa, prontos para saírem na noite anterior.

- Sra. Fintch, faz tempo que a mamãe e o papai saíram, quando eles vão voltar? – perguntei entre uma colherada e outra.

- Oh! Meu menininho querido! Tome a sua sopa para que não esfrie. – respondeu, depois de um silêncio constrangedor, onde vi que enxugava os olhos molhados.

- Vai ser antes de eu ir para a cama? – insisti, embora sempre achasse que meus pais demoravam a voltar quando saíam.

- Não, meu pobre queridinho! – exclamou. – Eles não vão voltar! – acrescentou, segurando meu rosto entre suas mãos ainda molhadas de lágrimas.

Eu interpretei aquilo como se eles não fossem voltar antes de eu me recolher. Só na manhã seguinte, quando meu tio entrou novamente comigo naquele carro e percorríamos um caminho que nos levava para fora da cidade, é que eu me dei conta de que algo de muito errado estava acontecendo. Comecei a chorar baixinho encolhido como um caracol naquele banco de couro e no silêncio daquele percurso.

Quando voltei a levantar a cabeça, o carro transpunha um portão de ferro todo ornado e, seguia até a frente de uma construção austera de pedra com inúmeras janelas voltadas para o extenso gramado que se estendia a sua frente. O motorista desceu e abriu a porta para que meu tio e eu descêssemos. Encarou-me com um olhar triste.

Lá dentro, ficamos sentados num sofá de couro numa sala ampla e com pouca luz, até que um homem de idade avançada e andar vagaroso, vestido de padre veio nos receber. Meu tio o cumprimentou sem muita empatia, enquanto ele se esforçava para se mostrar servil e satisfeito por ter sido agraciado pela indiferença do homem reconhecidamente importante que estava diante dele. Ele nos conduziu a um gabinete onde as paredes eram forradas de estantes repletas de livros, só interrompidas por três janelões de onde se via um céu cinzento. Sentamo-nos ao redor de uma mesa com poucos objetos, ele de um lado e meu tio e eu do outro. As cadeiras, com braços de madeira entalhada e forradas com couro reluzente, não me deixavam alcançar o chão com os pés. Fiquei a balança-los enquanto meu olhar percorria toda aquela sala. O homem não olhou para mim mais do que duas vezes enquanto durou a longa conversa entre ele e meu tio. Era um homem alto e magro, com a cabeleira quase toda grisalha, tinha as faces côncavas que deixavam as maçãs do rosto salientes sobre a pele seca e enrugada. Os olhos eram fundos nas orbitas e havia um brilho estranho neles. O discurso dele era monótono e, o tom de sua voz inexpressivo. Falou muito mais do que o meu tio, como se quisesse convencê-lo de alguma coisa. Mas, ao que parecia, ele pouca atenção dava para as palavras do velho reverendo, tinha pressa em resolver a questão. O olhar do velho padre só se iluminou quando meu tio lhe estendeu um pequeno papel no qual havia escrito alguma coisa e que destacou de um bloco onde havia outras folhas semelhantes. O velho chegou mesmo a espichar os lábios numa espécie de sorriso grotesco, enquanto examinava com os óculos redondos de aro metálico o papel que acabava de pegar em suas mãos. Em seguida, pegou o telefone e grunhindo algumas palavras, deu o que me pareceu uma ordem, pois minutos depois alguém bateu à porta e outro padre, mais jovem, entrou no gabinete, cumprimentando meu tio com muita reverência.

- É este nosso novo hóspede? – perguntou numa voz firme, mas contida, dirigindo-se a mim.

- Por favor, padre Andrew, poderia mostrar a essa bela criança o seu quarto e ajudar a instala-lo? – disse o velho reverendo, como se tivesse acabado de fazer um bom negócio.

- Adeus, Philip! - Meu tio não me encarou enquanto eu procurava desesperadamente por seu olhar e pela razão daquilo tudo. Aquela foi a última vez que eu o vi.

Nunca cheguei a tomar conhecimento da notícia publicada, naquele mesmo dia, em destaque, na primeira página do The Courier com uma fotografia mostrando os destroços de um automóvel sob o chassi empenado de um caminhão, ao lado de outra que mostrava um casal em trajes a rigor sorrindo para a câmera, sob o título – EMPRESÁRIO CONEY MANSON, DO RAMO NAVAL, RESPONSÁVEL PELA MODERNIZAÇÃO DO PORTO DE DUNDEE, MORRE COM A ESPOSA EM TRÁGICO ACIDENTE AUTOMOBILÍSTICO – embora esse fato tenha selado meu destino definitivamente.

O internato jesuíta funcionava num monastério secular que fora construído por volta do século XVII, numa extensa propriedade nas colinas dos arredores da cidade de Brechin, às margens do rio Esk, na Escócia. Funcionava como uma mistura de orfanato e colégio interno para meninos a partir dos dez anos de idade, dirigido por uma confraria que se valia de padres jesuítas para gerenciar suas atividades. O velho reverendo Moesly foi empossado como diretor depois de afastado do cardinalato de Glasgow, num incidente obscuro envolvendo sua pessoa, como uma espécie de punição. A ele foram se juntando aos poucos outros sacerdotes que, insubordinados, mas com uma sólida bagagem intelectual, de alguma forma não eram bem quistos dentro das fechadas comunidades católicas. O fato de eu ter sido admitido ali, aos seis anos de idade, já representava uma excepcionalidade que, a rigor, não fazia muita diferença para eles, mas sim, o polpudo cheque que meu tio entregou ao velho Moesly e, que seria suficiente para cobrir com muita folga todos os custos da minha hospedagem e educação até que eu me tornasse independente e senhor de mim mesmo.

Como eu ainda não podia frequentar as aulas com os outros internos, quem se encarregou da minha alfabetização foi o recém-admitido padre Lend, que o fazia fora da rotina de seus outros afazeres, que não eram poucos, por terem lhe incumbido das tarefas menos gloriosas e mais exaustivas, já que era novato e, ainda não totalmente aceito pelos demais. Ele havia se mostrado indisciplinado e causador de tumultos durante todo o seminário. Fora ordenado padre e também foi rejeitado pela comunidade para a qual havia sido designado por comportamento inadequado. Para não ser expulso foi-lhe concedida uma derradeira chance entre as paredes enclausuradas daquela instituição perdida nos confins do nada. Pareceu-me que, de todas as suas tarefas, a que mais prazer lhe dava era a minha instrução. Talvez por que eu assimilasse com muita facilidade os seus ensinamentos, e me dedicasse, com avidez, a dominar aquelas letras que, fantasticamente, iam me permitindo compreender tudo o que encontrava escrito nos livros da enorme biblioteca do monastério. Era ali que eu permanecia longas horas do meu dia, uma vez que só me era permitido participar de algumas das atividades junto com os demais internos. Para o padre Lend, àquelas horas na biblioteca também representavam uma fuga e um esconderijo, pelo qual ele se via livre da sanha impiedosa dos demais padres em lhe arranjar trabalho. Por isso, se mostrava paciente e dedicado com seus ensinamentos. Mesmo por que, do bom êxito do meu progresso dependia igualmente uma melhor condição no seu futuro.

Os dormitórios ficavam no terceiro, e penúltimo, andar do edifício de duas alas. Na ala da frente ficavam os dormitórios individualizados dos padres e, na dos fundos os dormitórios comuns dos internos, que alojavam entre quatro e seis internos cada um. Somente eu dividia o amplo quarto com banheiro e altos janelões, situado na extremidade norte da construção, com apenas dois outros internos. Nos dias de sol, ele logo penetrava no quarto e se esparramava sobre a minha cama, fazendo com que eu acordasse cedo, geralmente antes dos meus companheiros, e eu me sentia contente com aquele calor extra que aquecia as grossas paredes de pedra e, consequentemente, todo o aposento. Meus colegas de quarto eram David Defoe e Mark Kendrick. David tinha onze anos, ficou órfão depois que a mãe solteira morreu logo depois do parto e, as circunstâncias o trouxeram ao internato de Brechin, sua terceira morada em sua curta existência. Muito expansivo e curioso, foi ele quem primeiro procurou se aproximar de mim, até então calado e perdido, não conseguindo compreender como tinha ido parar naquele lugar, longe da minha casa e sem os meus pais. Não fosse pelo sorriso amável e receptivo de David talvez ainda estivesse chorando desalentado, como fiquei depois que padre Andrew me deixou sozinho naquele quarto, sem dar maiores explicações do que os horários em que eu deveria me apresentar no andar térreo para as refeições e, me mostrar onde deveria colocar todos os meus pertences, basicamente roupas, num armário amplo que ficava diante da minha cama, bem organizados e numa sequência que fizesse com que os mais utilizados ficassem mais acessíveis para, segundo ele, inspecioná-los antes que eu fosse dormir naquela noite. Mark era o oposto de David, aos treze anos era muito calado e reservado. Pareceu-me estar escondendo uma grande dor, talvez por que eu próprio estivesse fazendo o mesmo. Tinha os olhos tristes que vagavam perdidos como duas esmeraldas em seu rosto angelical, por muitas vezes eu os veria mergulhados em lágrimas, sem compreender a razão de toda aquela tristeza. Seus olhos começavam a se umedecer sempre que padre Andrew entrava em nosso dormitório, bem depois de havermos nos recolhido e, mandar que ele o acompanhasse, geralmente só retornando pouco antes do alvorecer com as feições perturbadas, como se tivesse tido um pesadelo. Logo me dei conta de que isso acontecia de duas a três noites durante a semana e, que no dia seguinte, Mark se comportava de maneira estranha, tal qual um autômato, sem vontade própria e, alheio a tudo a seu redor.

Quando completei nove anos, padre Lend achou que eu estava pronto para acompanhar os demais internos, apesar de ser um ano mais novo do que todos os que haviam ingressado naquele ano. Eu só vim a descobrir a data do meu aniversário um ano antes, quando casualmente vi meu nome diante de uma data – 15 de maio – num mural, instalado à entrada do refeitório, onde se fixavam os aniversariantes do mês, embora nunca houvesse comemorações para nenhum dos internos. Apenas aqueles estudantes que tinham os pais ou parentes recebiam uma visita com presentes e bolo, normalmente dividido com os colegas, quando a data não coincidia com as férias ou as datas comemorativas do final de ano. Desde que havia chegado a Brechin, só uma única vez recebi uma visita. Foi na véspera do Natal daquele mesmo ano em que fui internado. Era a Sra. Flintch com uma lata cheia de biscoitos coloridos de gengibre no formato de bonecos de neve, e um urso de pelúcia macia, cujos olhos muito azuis se pareciam com os meus. Mas, ele me foi confiscado pelo padre Ungar, pouco mais de uma semana depois, sob o pretexto de ser um objeto inútil para a minha formação naquele lugar. Depois disso, nunca mais alguém se lembrou da minha existência e, por algum motivo que desconheço, ela também nunca regressou.

Todo início de ano letivo representava uma grande transformação no internato. A saída dos mais velhos e, a chegada de novatos criava uma agitação que durava alguns meses até que todos se conhecessem, os grupinhos se formassem, e as muitas atividades preenchessem os nossos dias. Meu primeiro ano escolar não foi diferente. Embora dois eventos permaneçam destacados na minha memória.

O primeiro foi a chegada ao internato de Harry, um garoto de dezesseis anos, que já se parecia com um homem feito. Sua estatura e porte físico se destacava entre todos aqueles adolescentes em idade escolar, bem como seu jeito taciturno e sua tendência a se envolver em brigas. Dizia-se que logo depois de ter perdido o pai, e sua mãe ter se casado com outro homem, ele dera para enveredar pelo crime junto com as más companhias com as quais andava envolvido. E ainda, que já estivera num reformatório por mais de um ano, motivo pelo qual estava atrasado nos estudos. Nenhum desses boatos podia ser confirmado, mas serviam de explicação para a fama de truculento que ele próprio não tratava de desmentir. Curiosamente, ele e eu nos demos bem desde o primeiro instante em que o vi vagando pelo mesmo corredor do meu dormitório, a procura do dele, que ficava contíguo ao meu.

- Olá! Sou Philip. Está perdido? – perguntei quando ele deixou cair uma das malas que trazia debaixo do braço.

- Onde fica o raio do dormitório 12? Que numeração mais maluca é essa? – questionou, com uma voz grave e possante, enquanto eu tentava erguer a pesada mala que ele havia deixado cair.

- É um pouco confuso mesmo no início, este é o corredor dos dormitórios pares que ficam deste lado da escada, do outro lado ficam os ímpares. O doze é aqui, bem em frente ao meu. – esclareci.

- Deixe esta mala aí, depois eu volto para apanhá-la, você não vai dar conta de carrega-la, deve pesar tanto quanto você. – seu tom era um pouco agressivo, mas havia simpatia em seu olhar.

- Eu dou conta sim! – respondi contrafeito. – Não é por que eu não me pareço com um gorila como você que não vou dar conta de carregar esta mala. – emendei.

- Então está bem! – revidou com um ligeiro sorriso. – A propósito, não sou gorila e me chamo Harry, entendeu? – sentenciou.

- Seja benvindo Harry! E aqui está sua mala. – disse, depois de haver arrastado a mala até os pés de uma das camas do dormitório doze, numa espécie de prova de que eu não era tão fracote quanto ele havia afirmado.

O segundo evento aconteceu pouco depois do recesso de final de ano, algumas semanas após o reinício das aulas. Foi na noite de uma sexta-feira de janeiro, em pleno inverno, quando padre Andrew entrou em nosso dormitório já passado das onze e meia, fazendo com que Mark se levantasse e o acompanhasse. Eu estava cada vez mais curioso com essas misteriosas saídas e, não consegui mais conciliar o sono a espera do regresso do Mark. Eu cochilava e quando acordava continuava vendo a cama dele vazia e, desta vez, mesmo com a sineta do corredor fazendo seu alarde matinal, indicando que era hora de levantar e, se preparar para o café da manhã, ele não havia regressado. Eu me vestia ainda bastante sonolento, quando um grito pavoroso ecoou num dos dormitórios, logo seguido por mais alguns e, de uma algazarra interminável. David, que já estava completamente vestido, me chamou até junto a uma das janelas do nosso quarto. Seu rosto estava lívido e ele gaguejava quando me chamou apressadamente.

- Veja aquilo! Deus do céu, aquele é o Mark! – exclamou desesperado.

Quando me aproximei das vidraças embaçadas e olhei para a fileira de salgueiros que se estendia por uma pequena alameda diante do edifício, vi o corpo completamente nu e alvo do Mark pendurado pelo pescoço num dos galhos da primeira árvore da fileira. Tive que me segurar no parapeito, pois minhas pernas não queriam me sustentar em pé e, repentinamente, vi tudo escurecendo diante dos meus olhos. Segundos depois, padre Lend entrou em nosso quarto e, numa voz apressada, ordenou que fossemos diretamente para o refeitório e lá permanecêssemos até que nos autorizassem a sair.

- Ninguém deve deixar o refeitório antes que receba uma ordem expressa nesse sentido! Estão entendendo! Agora rápido, já lá para baixo! – berrou, quase histérico.

Minhas pernas tremiam quando desci as escadas junto a um bando de outros garotos e, um nó se fechava na minha garganta. As vozes dos outros garotos entravam nos meus ouvidos e me deixavam ainda mais agoniado.

- Mataram o Mark! Um assassino invadiu o colégio! O Mark se suicidou, ele era esquisito mesmo! Deve ter sido o Sr. Gadsby, o jardineiro, quem matou o Mark, dizem que ele matou o próprio filho, por isso está escondido aqui junto com os padres no internato! – as frases partiam aleatoriamente da boca dos garotos tentando encontrar uma explicação para aquilo que viram pelas janelas.

Do refeitório não se podia ver a frente do edifício, portanto, ficamos trancafiados lá até perto do meio dia. Quando tivemos autorização para deixar o refeitório e, nos dirigimos até as salas de aula, só dava para ver dois carros da polícia e mais uma meia dúzia de outros automóveis, por entre os quais circulavam alguns policiais e outros homens de terno, além do velho reverendo Moesly e outros padres do internato.

Naquele dia o almoço só foi servido perto das duas horas da tarde e, quando todos os internos estavam no refeitório diante dos pratos, o reverendo Moesly ao se levantar na ponta da mesa onde ficavam todos os padres para fazer a oração de agradecimento, limpou a garganta com uma longa expectoração, e sentenciou com a voz mais grave e sensibilizada que conseguiu interpretar.

- Lamento comunicar a todos vocês que uma tragédia se abateu sobre o internato de Brechin nesta madrugada. Um de nossos queridos internos, Mark Kendrick, cometeu o vil ato do suicídio, condenado e punido por Deus, sem que saibamos o motivo que o levou a cometer tal sacrilégio. Peço a todos que oremos por sua alma! E, desde já, proíbo expressamente que se façam comentários e mexericos a respeito dentro desta instituição! Aqueles que forem pegos fazendo qualquer alusão ao fato serão severamente punidos. Vamos orar. – nunca o olhar do velho Moesly me transmitiu tanta falsidade quanto naquele dia.

Nos três dias seguintes um carro da polícia veio diariamente a Brechin, demorava-se algumas horas, enquanto dois policiais fardados e um homem baixinho e careca ficavam fechados atrás das portas fechadas do gabinete do reverendo Moesly. Tratava-se do delegado Lockworth. Numa dessas ocasiões, quando fui levar um recado ao diretor do qual padre Lend havia me incumbido, ouvi a voz exaltada dele antes mesmo de chegar junto à porta.

- O senhor está insinuando que negligenciamos os cuidados com os nossos internos!

- Os exames necroscópicos iniciais revelaram que o garoto foi violentado. Havia sangue e esperma em seu ânus, além de marcas arroxeadas ao redor dos mamilos e nas nádegas. Foram colhidas amostras e, lamento informar que teremos que proceder a uma série de exames com todos os internos e também com todos os religiosos que estiveram no internato naquela madrugada, a começar por estes últimos. – a voz era do homem baixinho, pois por meio de uma fresta da porta eu conseguia ver os dois policiais parados próximos a uma das estantes que circundavam o gabinete. A voz do homem soava calma, mas ameaçadora. Embora eu não pudesse vê-lo da posição em que estava, pude constatar que ele não se deixou abalar pela destemperança do velho diretor.

- Isso vai gerar uma tremenda confusão entre os internos e abalar o conceito da instituição, delegado e, desnecessariamente. Vou hoje mesmo comunicar ao bispo regional este descalabro e essa afronta contra a igreja e seus sacerdotes, tenho a certeza de que o senhor terá que prestar esclarecimentos a seus superiores! – o diretor havia se levantado de sua cadeira e vociferava em direção ao homem. – Eu já lhe expliquei que o garoto sofria de depressão, como atestaram ao senhor alguns dos seus professores aqui mesmo nesta sala. Sempre mantivemos um rígido controle sobre os atos dele, mas, infelizmente, naquela madrugada algo escapou do nosso controle e sobreveio a tragédia. Não há outra explicação! – emendou, fazendo menção de dar por encerrada a conversa.

- Aí é que o senhor se engana. Há muito a esclarecer, e não haverá de ser um bispo, cardeal ou até o papa que mudará o destino das investigações. Eu torno a afirmar que amanhã pela manhã estarei de volta com uma equipe de peritos que vão iniciar a coleta de amostras de todos os senhores e, assim que o juiz expedir a autorização, também de todos os internos. Passe bem! – abruptamente ele abriu a porta e fui pego de surpresa, me assustando, a ponto de quase esquecer o que tinha vindo fazer ali.

- O que faz aí parado atrás da porta bisbilhotando, senhor Manson? – berrou o reverendo Moesly quando me viu. – Está procurando por algum castigo que preencha seu tempo?

- Eu...eu...o padre Lend...quer dizer...eu vim... – gaguejei, tremendo e confuso.

- Fale de uma vez! E suma da minha frente, se não quiser passar o resto da semana de castigo. – continuou berrando, enquanto o delegado me encarava com um sorriso de piedade.

- Padre Lend me mandou chama-lo, ele está lá nas quadras esportivas e disse que o senhor já sabia do que se trata. – despejei de um só fôlego.

- Sim, sim, sim. Já estarei lá. Agora saia já daqui!

Corri em disparada pelo corredor para longe do gabinete. No entanto, fui longe o suficiente para que ninguém me visse, escondendo-me no fim do corredor junto à porta que levava à sacristia da capela. De lá, observei o diretor se despedindo do delegado na porta do gabinete e, voltando imediatamente para dentro, assim que os homens desceram os degraus em direção ao hall de entrada. Mal a porta da frente do edifício havia se fechado quando, do andar superior, desceram alvoroçados o padre Ungar e o padre Andrew, dirigindo-se apressadamente para dentro do gabinete do diretor. Num arremedo de ousadia e coragem, que tirei nem sei de onde, caminhei pé ante pé até o gabinete. Lá dentro só se ouvia outra vez a voz alterada do velho reverendo.

- Eu já os havia alertado outras vezes! Se este delegado não se intimidar como fizeram os outros, podemos ter encrenca e, me parece que esse não é daqueles que se intimidam por qualquer coisa. Tratem de sair daqui esta tarde mesmo. Ele não sabe quem esteve aqui naquela noite fatídica, portanto, não haverá de perguntar por vocês. – ele falava atabalhoadamente, como se estivesse resolvendo uma questão no mesmo instante em que a solução lhe vinha à cabeça.

- Já havíamos pensado nisso e decidimos ir à arquidiocese em Edimburgo, como se o senhor nos tivesse enviado por alguns dias a pretexto de solicitar uma visita do arcebispo à Brechin. – disse padre Ungar, no momento exato em que ouvi passos descendo as escadas do primeiro andar e, mais uma vez, saí correndo dali para não ser flagrado.

- O que aconteceu com você, está branco e porque toda essa agitação? – questionou padre Lend quando voltei às quadras. – Deu o recado ao reverendo Moesly?

- Eu vim correndo. E, sim, senhor! Ele disse que estará aqui dentro em breve. – respondi com o coração aos pulos e uma série de dúvidas nos meus pensamentos.

Tive uma noite péssima. Acordei por diversas vezes e, enquanto meu olhar vagava perdido pelo quarto vendo a neve cair diante das janelas e ir se acumulando no parapeito, não conseguia me desvencilhar da imagem assistida várias vezes, do padre Andrew vindo chamar o Mark no meio da noite. E, por que ele e padre Ungar precisaram deixar o internato às pressas naquela tarde? Como ficariam as nossas aulas de química e álgebra no dia seguinte? Quem os substituiria? Ou íamos ter uma folga? Já me antevia com uma porção de lição a menos naquela semana. Mas, que exames seriam aqueles que o delgado falou? E então, me voltava a cena do Mark pendurado na árvore e o medo se apossava de mim com o mesmo temor que as nuvens cinzentas encobriam o céu num dia de tempestade.

Para minha frustração, na manhã seguinte, tanto a aula de química quanto a de álgebra foram dadas por outros professores, sendo o padre Lend quem deu as aulas de álgebra. Antes disso, o reverendo Moesly entrou na sala de aula e comunicou a necessidade do padre Andrew e padre Ungar terem que realizar uma viagem a Edimburgo para resolver questões religiosas. Eu sabia que ali estava mais uma mentira do diretor.

O delegado e alguns auxiliares circularam pelo internato por toda aquela semana, numa frequência obstinada. Depois, por mais de dois meses, mas a intervalos cada vez mais espaçados. Não havia dúvida de que ele procurava por pistas que o levassem a elucidar a morte de Mark. No entanto, com a mesma determinação tenaz, os clérigos se fechavam num pacto de silêncio acaçapado. Um juiz havia indeferido o pedido para recolher amostras dos internos e, as tentativas do delegado de obter alguma informação conosco eram imediatamente frustradas pela intromissão dos padres. Numa destas tentativas, o delegado me surpreendeu sozinho enquanto eu saía da biblioteca pouco antes do horário do jantar, que acontecia bastante cedo em Brechin, lá pelas dezoito e trinta.

- Atrasado com seus afazeres? – disse, quando me pegou no corredor parcamente iluminado, me assustando com seu vulto saindo detrás de uma das colunas que se perfilavam como saliências das paredes de pedra.

- Não. Já fiz minhas lições. Vim apenas pegar este volume que padre Wingliff, meu professor de literatura, sugeriu. – respondi, com o coração ainda disparado no peito devido ao susto.

- Esses corredores são um tanto sinistros quando anoitece não lhe parece? – perguntou, como para iniciar uma conversa.

- Já me acostumei! – exclamei

- Você me parece um garoto bastante corajoso. Todos os seus colegas também são tão corajosos? – questionou.

- Sim, acho que sim. – por que ele não chega logo ao ponto, vai me fazer chegar atrasado no refeitório e o reverendo Moesly vai me dar uma advertência, pensei com meus botões.

- Sabe me dizer se o Mark também não tinha medo de andar por esses corredores durante a noite? – ele formulou a pergunta olhando para um quadro que pendia da parede próxima de onde nos encontrávamos, como se fosse uma mera e inocente curiosidade. Mas, eu já estava prevendo aonde ele queria chegar com aquela conversa.

- Não. Não sei dizer. – eu demorei a responder. Fiquei pensando, o Mark não andava pelos corredores sozinho, padre Andrew vinha busca-lo no quarto.

- O que foi? Por que esta pergunta te deixou preocupado? – insistiu ele, parecendo ler meus pensamentos.

- Não fiquei preocupado. É que eu não sei se o Mark tinha medo. – esclareci.

- Ah! Mas você dormia no mesmo dormitório que ele, não é? – ele estava fazendo seu trabalho com muita atenção e minúcia.

- Sim, eu e o David. – respondi.

- E você nunca o viu saindo do quarto à noite, sozinho ou acompanhado? – Pimba! Lá estava o que ele vinha fazendo rodeios para saber.

- Eu estranhava quando padre Andrew ... – um berro às minhas costas, com a voz zangada do revendo Moesly, ecoou pelo corredor escuro, interrompendo minha resposta.

- Aí está você, senhor Manson! Sempre atrasado para as refeições! Talvez esteja precisando de mais algumas horas de castigo no meu gabinete para se lembrar dos horários em que deve estar no refeitório. Saia já daqui, ou vai ficar sem jantar. – determinou, fazendo meu corpo girar cento e oitenta graus e me dando um safanão no ombro para que eu saísse dali.

- A culpa foi minha! Eu o distraí com perguntas acerca do livro que ele acabara de tirar da biblioteca. – disse o delegado, ciente de que o velho diretor não acreditou em sequer uma de suas palavras.

- Já está tarde para o senhor perambular pelo internato, não acha? – havia hostilidade na voz dele.

- Nunca é tarde para se cumprir com o nosso dever, reverendo! Tenha uma boa noite! Boa leitura, Philip! – disse, elevando a voz para que eu pudesse ouvir suas últimas palavras, quando já me achava a certa distância deles.

No final das orações da noite, enquanto deixávamos a capela para seguir para nossos quartos, o diretor me mandou acompanha-lo até seu gabinete. Algo me dizia que não seria uma conversa muito agradável para mim.

- O que foi que o delegado lhe perguntou? – ele foi direto, tão logo fechou a porta após eu ter cruzado o umbral.

- Nada. Me disse que já tinha lido o livro que eu tinha nas mãos e que tinha a certeza de que eu ia gostar da leitura. – menti. Pois ter dito a verdade naquele momento seria a certeza de receber um castigo. Havíamos sido proibidos de falar sobre o que acontecera ao Mark.

- Tem certeza de que foi apenas isso que ele conversou com você? – insistiu.

- Tenho, sim senhor. – eu não sabia mentir, e ele viu isso no meu semblante.

- Quero lembra-lo que de conversas, com quem quer que seja e, especialmente, estranhos ao internato, sobre o que aconteceu ao seu colega, podem lhe render uma bela dor de cabeça. O senhor entendeu bem isso? – ameaçou.

- Sim, senhor.

- Vá para o seu quarto! – algo me dizia que desde esse momento eu estaria sob uma vigilância restrita.

Padre Andrew e padre Ungar voltaram quase três meses após sua partida, quando o delegado e a polícia já não vinham mais a Brechin, a não ser esporadicamente. E, nessas ocasiões, encontrar um dos dois em qualquer recanto do internato parecia ser uma missão impossível.

Dois dias antes de eu completar onze anos, tive uma séria discussão com o Harry. Ele e eu havíamos nos tornado muito próximos e, apesar dele ser mais velho, eu o considerava o meu melhor amigo, a pessoa de quem eu mais gostava. A primeira pessoa que aprendi a amar, uma vez que a cada dia as lembranças vagas dos meus pais iam se desvanecendo da minha memória. Ele havia se tornado uma espécie de meu defensor. Não eram incomuns as desavenças e provocações entre os internos, particularmente, entre os mais velhos e os mais jovens, dos quais os primeiros tentavam obter toda espécie de vantagem, ou simplesmente, se valiam para suas zoações e sacanagens. Eu consegui uma certa imunidade a estas tentativas depois que o Harry, ao me defender, andou distribuindo alguns socos entre os incautos que me provocavam. Depois que ele terminava de brigar com os garotos, sempre sobrava para mim também, pois ele me censurava por eu ser tímido demais ou por não ter dado essa ou aquela resposta que, se fosse com ele, teria certamente dado.

- Não sou como você. Fico sem saber o que fazer ou o que dizer. Eu não queria ser assim, mas sou. – retrucava, quando ele me dava as broncas.

- Também não precisa ficar com essa cara de chorão. Pronto, já passou. Mas, da próxima vez, veja se revida, ou vai ter que se haver comigo. – ele dizia isso fazendo cara de bravo, mas no fundo eu sabia que ele não gostava de me ver triste.

Nossa briga começou quando ele entrou no vestiário das quadras esportivas, logo após a aula de ginástica do padre Lend, e me flagrou sendo beliscado na bunda por uns internos. O que vinha acontecendo com uma frequência cada vez maior, desde que meu corpo começava a deixar os contornos infantis serem substituídos por uma compleição adolescente, mas sensualmente frágil. Feito um leão enfurecido partiu para cima dos garotos que fugiram antes de ser apanhados por seus punhos devastadores.

- Por que você tirou a roupa na frente dos garotos? Está gostando de sentir uma mão se esfregando na sua bunda? – berrou alucinado.

- O que você está insinuando? Eu não fiz nada demais. Todos estavam se trocando, eles cismaram comigo. – revidei, contrariado.

- Pois não é o que estava parecendo!

- Você é um nojento! Só pensa em sacanagem. – retruquei, deixando-o falando sozinho.

- Volte aqui que eu ainda não terminei. Se eu pegar alguém mexendo na sua bunda, vou dar uma surra nele e em você, entendeu? – ele me segurava com força e torcia meu braço.

- Você não manda em mim! – berrei, quase chorando. Na verdade eu me sentia humilhado quando zoavam comigo, sabendo que não tinha forças para revidar ou encarar uma briga com quem me provocava.

- Bem! Você está avisado. E, tem mais. Eu já te falei uma vez, numa boa, que era para você ficar o mais longe que puder das vistas do padre Andrew e do padre Ungar. Mas, ontem depois da aula você foi tirar uma dúvida da aula de álgebra com o padre Andrew, quando todos já estavam saindo da sala. Portanto, me desobedeceu. Eu também não vou mais repetir essa ordem, você está me entendendo? – ameaçou, enquanto eu tentava entender a razão daquele pedido estranho e enfático que, de fato, ele estava reiterando algumas vezes.

Não nos falamos por dois dias. No dia do meu aniversário ele ainda estava com a cara amarrada quando entrou logo cedo no meu dormitório e veio me dar um pequeno embrulho feito de papel brilhante e que, certamente, já havia sido usado para embrulhar algum outro objeto. Ao desfazer o pacote encontrei um cachorrinho esculpido a partir de um pedaço de madeira. Lembrei-me então, de que o havia visto umas duas vezes trabalhando com um canivete num pedaço de madeira e, que ele havia feito mistério a respeito, quando perguntei do que se tratava.

- É lindo! Está perfeitinho. Um dia ainda quero ter um desses de verdade! – exclamei, radiante com a surpresa. Desde o ursinho que a Sra. Flintch tinha me trazido no meu primeiro Natal em Brechin e, que me foi confiscado, aquele era o primeiro presente que alguém me dava.

- Sei que você é apaixonado por cães. Lembro-me de você ter me dito que queria um de verdade. Então fiz esse, enquanto o de verdade não vem. – respondeu, contente por ver a felicidade que aquele mimo me causou.

- Obrigado! Você é demais! – disse, correndo na direção dele e abraçando-o ardorosamente. Ele meio desconsertado me apertou em seus braços e eu senti o calor do corpo dele. Foi a sensação mais gostosa que já havia experimentado.

Algumas semanas depois do meu aniversário começou o verão. Um pouco atrasado e tímido de início, mas na primeira semana de julho o sol e o calor se faziam sentir desde as primeiras horas da manhã. Faltava uma semana para as férias e, havia um bocado de coisas para estudar para as provas que ocupariam toda aquela semana. Depois disso, os internos começaram a ser buscados por seus pais ou parentes para desfrutar as semanas de férias longe de Brechim. Mas, isso não se aplicava para todos. Os órfãos ou aqueles que, como eu, haviam sido colocados ali para não ser um estorvo, permaneceriam sob a tutela dos clérigos. Por isso, aquela expectativa que deixava os alunos em polvorosa, nunca me abalou. Seria um verão como todos os outros, sem as aulas, mas com uma rotina que pouco se modificava das demais épocas do ano.

O rio Esk delimitava toda a porção sudeste da propriedade onde se achava o monastério. Ele acompanhava o contorno do declive das colinas e, antes de desaparecer de vista, por entre um denso arvoredo numa curva, havia uma espécie de píer onde um tablado de pranchas de madeira se apoiava sobre colunas de pedra erguidas dentro do leito do rio. Não tínhamos permissão para nos aproximarmos das margens do rio, exceto com a supervisão de algum dos padres. No entanto, os internos mais velhos costumavam dar uma escapulida e se sentavam sobre o pranchado e, improvisando varas de pescar, passavam horas se distraindo fisgando trutas que depois o padre Noxwell ficava feliz por preparar na cozinha. Foi no meio de uma tarde abafada que vi o Harry, da janela da biblioteca, se dirigindo até as margens do rio. Ele estava sozinho. Como o calor não me deixava concentrar na leitura, resolvi colocar uma roupa mais leve e segui na mesma direção. Do alto da colina avistei-o sentado na beirada do tablado com as pernas penduradas sobre o rio que corria caudaloso por entre as pedras logo abaixo. Ao contrário do que eu havia imaginado, ele não tinha se dirigido ao rio para pescar. Parecia estar apenas admirando o bosque composto de salgueiros, mostajeiros cobertos com suas flores brancas, vidoeiros e abetos que cobriam toda a margem oposta. Embora eu não estivesse me aproximando sorrateiramente, ele não percebeu a minha chegada, de tão entretido que estava. A princípio, não reparei no que ele estava fazendo. Mas, assim que me aproximei mais e ouvi uns grunhidos que ele soltava, notei que o short dele estava ligeiramente arriado e ele segurava com uma das mãos seu cacetão que emergia completamente duro do meio de suas coxas. Ele fazia o dedo indicador da mão que segurava o cacetão acariciar a cabeçorra vermelha e lustrosa e, de vez em quando, batia uma punheta fazendo o caralhão ficar cada vez maior e mais rijo. Meus olhos se arregalaram e não queriam se desviar daquele pau imenso, tão diferente do meu, cercado por um denso tufo de pelos.

- O que faz aqui, seu merdinha intrometido! – berrou quando me viu, escondendo rapidamente o caralhão dentro do short. – Suma daqui se não quiser levar uns cascudos. Anda!

- Eu achei que você estava pescando. Não vim bisbilhotar. – respondi gaguejando. Sem, contudo, desviar o olhar daquele volume dentro do short que começara a delinear uma mancha circular e úmida no tecido.

- Vou te ensinar a ficar me vigiando! – disse, partindo para cima de mim com os punhos cerrados.

- Eu não estava te vigiando, juro! – imediatamente cobri minha cabeça e meu rosto esperando pela avalancha de socos que estavam prestes a me acertar.

- Corre! Se não quiser apanhar. – gritou. Mas, por alguma razão, ele não me bateu, apesar de eu não ter arredado nenhum milímetro de onde estava.

- O que você estava fazendo? – arrisquei num arremedo de coragem, pois sabia que ele seria incapaz de me machucar, apesar da raiva que brilhava em seus olhos.

- Não é da sua conta! – vociferou. – Está perdendo o medo de levar uma surra? – emendou, irado. – Eu devia te dar uns safanões.

- Mas eu não te fiz nada! – ousei exclamar. – Por que o seu pinto é tão grande e peludo? – atrevi-me a perguntar.

- Por que eu já sou quase um homem. Logo serei maior de idade e dono do meu nariz. E, quer saber de uma coisa? Nesse dia vou desaparecer daqui. – respondeu, tentando segurar um riso que começava a se formar em seus lábios, pois eu continuava a encarar aquela jeba distendida.

- Vou ficar triste no dia em que você for embora! – exclamei.

- Por quê? – indagou surpreso.

- Por que eu gosto muito de você. – respondi acanhado

- Eu também gosto muito de você. E, não pense nisso agora. Ainda vai demorar a chegar esse dia. – disse, para me consolar.

Os primeiros ventos outonais começaram a soprar, gelados, duas semanas depois do reinício das aulas. Parecia que, com eles, ia desaparecendo aquela alegria que predominava em nosso espírito durante o verão. Os dias ficavam mais curtos e a tarde chegava precocemente cobrindo as colinas de Brechim com um nevoeiro denso. Um dos motivos pelos quais eu andava meio macambuzio nos últimos dias. O outro, foi o fato de me sentir incomodado com os olhares sequiosos e ávidos que padre Ungar começara a me lançar. Era algo que ele nunca havia feito antes, mas agora, frequentemente, eu surpreendia aqueles olhos com expressão impudica e libertina pousados sobre mim durante as aulas de química. Até que certo dia, me mandou permanecer na sala após o término da aula.

- Senhor Manson, o que está acontecendo com suas notas? No teste desta semana houve novamente um decréscimo na sua pontuação. Está com dificuldades de assimilar a matéria? – sua voz grave não tinha o tom de censura, tinha mais um certo contentamento com o fato das minhas notas realmente terem caído.

- Mas eu tenho as notas mais altas da classe, padre! – exclamei.

- Não resta dúvida! Mas, desde o semestre passado elas estão declinando. Não acha isso estranho e preocupante? – revidou.

- Um pouco. Estou achando a matéria mais complexa. No entanto, não deixei de estudar. – retruquei, estranhando o fato de eu ter tirado oito pontos e seis décimos no último teste, enquanto boa parte dos alunos mal havia conseguido cinco pontos. E, eles não estavam sendo questionados.

- Quero que venha ao gabinete dos professores todas as terças e sextas-feiras após o jantar para repassarmos o conteúdo das aulas, estamos entendidos? – disse, com os lábios retorcidos num sorriso irônico.

- Eu acho que não será necessário. Vou me esforçar ainda mais e o senhor verá que no próximo teste tirarei uma nota melhor. – retorqui, na tentativa de me livrar de mais essa obrigação.

- O senhor não entendeu, senhor Manson, eu não estou sugerindo que o senhor venha para esses encontros. Eu estou mandando! Até a noite, senhor Manson! – ele havia fechado a cara e se retirou sem me dar a chance de outro revide.

Quando cheguei ao meu quarto joguei os livros e cadernos sobre a cama enquanto praguejava comigo mesmo. David me olhou atônito, pois eu não era dado a rompantes de rebeldia.

- O que foi que aconteceu? Você está com uma cara! – exclamou, inquieto e curioso.

- A droga do padre Ungar me obrigou a cumprir um horário de reforço, duas vezes por semana, após o jantar, no gabinete dos professores, na companhia dele. – respondi exaltado.

David me encarou com uma expressão que misturava pavor e comiseração. O que me deixou ainda mais atormentado. Nesse dia, sem que nunca tenhamos falado sobre o assunto, eu descobri que ele também tinha visto o Mark sendo levado pelo padre Andrew no avançado da noite. De um momento para o outro, percebemos que estávamos conluiados no mesmo segredo.

- Isso não é nada bom! – exclamou, depois de um longo silêncio.

- Tenho a mesma impressão. E, para ser sincero, estou com medo. – disse, tentando evitar seu olhar de piedade, pois aquilo me dava a sensação de que algo realmente ruim podia me acontecer.

- Vá falar com o reverendo Moesly. Diga que você tem as maiores notas da turma e não está entendendo o motivo pelo qual só você precisa fazer esse reforço. – sugeriu prestativo.

- Ele pode me repreender por estar contradizendo o padre Ungar. Vai alegar que eu não tenho condições de saber se preciso ou não desse reforço, que essa premissa cabe ao meu professor. Estou até ouvindo as palavras dele. - retorqui.

- Tem razão. Mas, o que vai fazer então? – questionou, preocupado.

- Acho que não me restam muitas opções. Mas estou com medo, muito medo. – respondi.

As primeiras noites transcorreram sem nenhum incidente. Havia apenas o constante entra e sai dos padres, preparando suas aulas para o dia seguinte e, isso me tranquilizou. Até que numa noite, apenas ele e padre Andrew ficaram no gabinete. Padre Ungar me reteve por muito mais tempo naquele dia e, comecei a sentir uma consumição que não deixava eu me concentrar naquilo que ele explicava.

- Você está muito desatento esta noite. Está com pressa de dormir? Ou tem algum compromisso? – perguntou, com sarcasmo, enquanto procurava pelo olhar conivente do padre Andrew que estava sentado numa mesa ao lado.

- Não senhor. Claro que não! – respondi.

- Então pode ir. Até sexta-feira! – disse, me encarando enquanto eu recolhia meus apetrechos da mesa.

- Promissor. Bastante promissor! – exclamou padre Andrew, esboçando um riso sádico que logo foi repetido pelo padre Ungar.

Embora não tivesse compreendido o significado dessa observação, tive a impressão de que se referia a mim e, quase fiquei petrificado de pavor. A expressão do rosto daquele homem e, algumas de suas frases enigmáticas tinham o poder de fazer regelar os meus ossos. No meu íntimo eu tinha a convicção de que ele tinha algo haver com a morte do Mark, embora não soubesse dizer o quê.

- Que história é essa de ter horário de reforço com o padre Ungar, após o jantar? – questionou o Harry, quando invadiu o meu quarto, de supetão, na manhã seguinte, me surpreendendo no exato momento em que tirava a toalha de banho que estava enrolada na minha cintura e, me preparava para vestir a cueca.

- Ei! Dá licença! Eu estou me vestindo. – retruquei.

- Isso não vem ao caso! Apesar de que, ver essa bundona arrebitada, sempre seja um prazer incontrolável. – disse, me medindo de cima abaixo. – Mas, não mude de assunto. Diga, que história é essa? Eu não te mandei ficar longe desse padreco? – perguntou furioso.

- Mas, foi ele quem mandou. O que eu podia fazer? – retruquei.

- Simplesmente não ir. Fácil assim. – sentenciou.

- Pois sim! Ele me poria de castigo, ou sabe-se lá o que faria.

- Não importa! Tudo menos ficar trancado com esse sujeito numa sala longe de qualquer movimento. – ele parecia ter uma solução para tudo, mesmo que isso lhe custasse algumas provações.

- Eu não tenho coragem de desafiá-lo. Vai ser pior para mim, tenho certeza. Além do mais, sempre há mais alguém no gabinete dos professores. Ontem mesmo estava lá o padre Andrew. – respondi.

- Santa ignorância ou santa ingenuidade! O padre Andrew! Não podia ser pior. – disse irritado.

- O que você quer dizer com isso? – aquela conversa já estava me deixando tonto. Está certo que nenhum dos alunos gostava desses dois, eu mesmo não me sentia confortável próximo deles, mas qual seria a razão de toda essa implicância?

- Êta garotinho bobo! É isso que dá ficar enfiado com a cara nos livros dentro de uma biblioteca. – resmungou.

- Eu não sou bobo! Vocês é que ficam me zoando e me confundindo. Todos vocês! – berrei exasperado, embora já começasse a sentir aquele nó subindo pela garganta querendo me fazer chorar. Era em momentos como esse que eu mais sentia falta de uma família, alguém em quem pudesse confiar sempre que me sentia perdido, alguém que pudesse me orientar quanto ao que fazer.

Numa determinada noite não pudemos ocupar o gabinete dos professores, por que boa parte daquela ala estava sendo pintada e, a sala estava completamente revirada. Encontrei padre Ungar parado junto à porta do gabinete me esperando.

- Venha comigo. Hoje não poderemos ter nossa aula nesse lugar. Vamos até meus aposentos. – disse, disparando na minha frente. – Vamos! O que está esperando? – emendou, quando se virou e, viu que eu continuava estancado feito um poste.

- Mas, padre Ungar. Os alunos não têm permissão de circular na ala dos quartos dos padres. – disse, mais assustado com a possibilidade de ficar a sós com ele em seus aposentos do que com a bronca que ele ia me dar.

- Deixe de besteiras! Você está acompanhado da minha pessoa, não está circulando por lá sozinho. Anda, mexa-se! – disse impaciente.

Segui dois passos atrás dele tremendo mais do que uma vara verde. Era a primeira vez que eu andava por aquela parte do edifício. O quarto dele não era muito diferente dos nossos dormitórios, embora só houvesse uma cama em cada quarto. A arrumação era impecável, tudo parecia ter o seu lugar e, a parca mobília brilhava de tão conservada. Ele puxou uma cadeira para junto de uma mesa sob as duas janelas e mandou que eu me sentasse. E, antes de acomodar-se na cadeira giratória que já estava perto da mesa, desabotoou a batina lançando-a sobre a cama. Usava apenas calças e, o peito grande e peludo ficou exposto. Não me atrevi a levantar o rosto, mas de soslaio, consegui ver um riso malicioso naquele semblante que parecia se divertir com o meu acanhamento.

- Nunca viu um homem sem roupa? Parece que viu um fantasma de tão pálido que está. – comentou.

- Não...não senhor. – gaguejei.

- Bem! Vamos ao que interessa. Prestou atenção na aula desta manhã? Então me diga quais são os tipos de ligações químicas que podemos encontrar nas substâncias? Não consulte seus apontamentos! – disse, olhando para as árvores lá fora que balançavam ao sabor do vento.

- Prestei, sim senhor. São....são, são três tipos. A ligação, ligação ... a ligação iônica. A ligação cova ... covalente. E, a ligação ... ligação me ... metálica. – minha voz tremia tanto quanto todo o meu corpo.

- Pare de cacarejar feito um pintinho assustado! Repita isso e me explique o que caracteriza cada uma dessas ligações. – ordenou. Seu sarcasmo era cruel e maldoso.

De repente senti como se minha cabeça se esvaziasse. Onde teriam ido parar todas as informações que eu tão bem havia assimilado durante a aula daquela manhã. Meu olhar se fixou e se perdeu num ponto qualquer e, tudo ficou branco, como se eu estive a encarar uma grande tela absolutamente branca. Meus olhos se encheram de lágrimas e elas começaram a rolar pelo meu rosto. Pensei que ia me mijar nas calças e quis sair correndo dali.

- O que está acontecendo? Engoliu a língua? – disse, antes de desviar o olhar na minha direção e constatar que eu estava completamente paralisado. – Não seja bobinho! Para que estas lágrimas? Vem cá, sente-se aqui. – continuou, apontando para as suas pernas.

Como eu não me mexia, ele mesmo se levantou e veio me colocar em seu colo. Ao me abraçar senti os pelos do peito dele roçando meu rosto. Suas mãos enormes e peludas, feito as patas de um urso, deslizavam pela minha face e por todo o meu tronco. Achei que fosse desmaiar.

Padre Ungar era um sujeito de compleição robusta. Não chegava a ser gordo, mas tinha um corpo roliço e rijo. Devia estar próximo dos quarenta anos. O fato de ser quase completamente careca deixava-o com aspecto mais envelhecido. Os cabelos que lhe faltavam na cabeça ele compensava com uma barba hirsuta que lhe cobria quase todo o rosto. As sobrancelhas muito grossas escondiam seus olhinhos negros e muito brilhantes. A estatura e os ombros muito largos eram intimidadores, nós internos o temíamos por seu aspecto truculento e, uma voz que mais se parecia com o ribombar de um trovão.

Eu parecia um ratinho perdido entre aquele corpanzil. Apesar de atordoado pelo nervosismo, eu percebia que as mãos dele não paravam de apalpar meu corpo e, não fosse o estado quase catalético no qual me encontrava, eu podia jurar que ele chegou a apertar e acariciar as minhas nádegas. De supetão, dei um salto para longe do colo dele e, tão logo senti que minhas pernas conseguiam suster meu corpo, saí correndo do quarto dele numa velocidade com a qual jamais pensava ser capaz de correr. Quando cheguei ao meu dormitório quase atropelei o David antes de me lançar sobre a minha cama num choro convulsivo e desesperado.

- Philip! Philip! Pelo amor de Deus, o que foi que aconteceu? De onde você está vindo? O que aconteceu à sua camisa? – perguntava ele, atônito com aquela entrada abrupta.

Demorei bem mais que um quarto de hora para conseguir formular as primeiras frases com algum nexo. Até então, só chorava com a cara enfiada no travesseiro. Os olhos do David ainda me encaravam estupefatos e cheios de compaixão.

- Padre Ungar... padre Ungar. – balbuciei inseguro.

- O que tem o padre Ungar? Cadê os seus cadernos e livros? Você não deveria estar fazendo o reforço com o padre Ungar? – ele olhava incrédulo para o meu estado deplorável.

Quando consegui me sentar na cama apoiando as costas na cabeceira, notei que os botões da minha camisa estavam abertos e um dos meus mamilos estava inchado e ao redor dele havia marcas arroxeadas como se tivessem me mordido. O David me viu deslizando os dedos sobre o mamilo e, pelo olhar dele, puder ver que havia compreendido tudo.

- Foi padre Ungar que fez isso com você? – a voz dele era quase um sussurro, como se tivesse medo de pronunciar algo tão vil. Só consegui balançar a cabeça assentindo.

O sábado amanheceu chuvoso. Acordei com o David me chamando para descermos ao refeitório para o café da manhã. Disse que não iria, que preferia ficar na cama. Nem o apelo dele para que eu não criasse mais um episódio que poderia me prejudicar serviu de argumento para que eu me movesse. Preferia morrer a ter que encarar aquele dia e, mais ainda, encarar o padre Ungar. Também não fui almoçar. Passei horas diante das janelas vendo a chuva cair, ora mais fina, quase uma garoa, ora torrencialmente, criando posas no gramado ao redor do edifício. Aos sábados nossas atividades se resumiam a uma missa após o café da manhã, a limpeza e arrumação dos dormitórios, e qualquer atividade que desejássemos no período da tarde, até a hora do jantar que, excepcionalmente aos sábados, era servido uma hora mais tarde que de costume.

- O reverendo Moesly está perguntando por você. Quer que vá vê-lo em seu gabinete antes do jantar. – disse David, quando entrou no dormitório já tomado pela penumbra do anoitecer. Eu nada respondi. Fiquei com o rosto colado na vidraça e sentia como se meu corpo pesasse mais de uma tonelada, e eu fosse incapaz de movê-lo. – O Harry também perguntou de você. Disse que vai passar aqui mais tarde. – emendou.

As dez para as oito eu bati na porta do gabinete do diretor. Encontrei-o falando ao telefone e, ele sinalizou para que eu me sentasse na poltrona que fica diante de sua mesa. Quando olhei para a batina dele um arrepio percorreu a minha coluna.

- Quer dizer que o senhor não está se sentindo bem, senhor Manson. Seu colega de quarto me disse que o senhor não desceu para as refeições por estar adoentado. Quer me dizer o que o senhor está sentindo? – disse, quando desligou o telefone e voltou toda a sua atenção sobre mim.

- Sim, senhor! Acordei com febre, eu acho. – minha voz tinha dificuldade de irromper da garganta.

- O senhor acha, ou estava com febre? – indagou, procurando captar o que eu estava escondendo.

- Eu estava. – confirmei. – Creio que me resfriei e gostaria de pedir a permissão para não participar da missa de amanhã. – arrisquei.

- Um resfriadinho não é motivo para deixar de cumprir suas obrigações. Um homem de fibra se faz superando os obstáculos, e não se entregando às provações. – sentenciou. Naquele momento me perguntei se aquele homem já tivera alguma privação e se, como um religioso espiritualizado, alguma vez, teve a capacidade de ler o sofrimento humano num semelhante.

- Reverendo Moesly! Eu queria dizer... isto é, eu gostaria de contar um fato que aconteceu comigo ontem à noite. É que o padre Ungar...quero dizer, as aulas de reforço...explicando melhor... – eu não conseguia encontrar as palavras para narrar o que aconteceu e, ao mesmo tempo, procurava coragem para contar.

- Deixe de lenga-lenga! Vá direto ao assunto. Não temos a noite toda. – rosnou.

- Padre Ungar me levou ao seu quarto para as aulas de reforço ontem à noite. Tirou a batina e me fez sentar no colo dele, também me apalpou. – disse, num rompante só.

- Sabe meu jovem! Cuidar de um bando de fedelhos indisciplinados como vocês, requer um grande esforço e muita dedicação de nossa parte. Praticamente deixamos de ter nossa vida particular. Tudo é em função de vocês. – ele fixou os olhos amargurados em mim. – Há quantos anos você recebe a nossa benevolência? Praticamente a vida toda. Você não acha que nós também temos direito a um pouco de diversão? Ou pensa que somos mártires que dão suas vidas em prol de vocês? – questionou, esperando que eu me manifestasse.

- É que nas aulas de religião foi ensinado que era pecado ter qualquer intimidade com outro homem. E, por isso eu achei ... – balbuciei.

- Você achou o que? Achou que padre Ungar queria qualquer intimidade com você, seu pervertido? Meça as suas palavras. Não saia por aí dizendo besteiras das quais pode se arrepender amargamente. E esta conversa está encerrada. Nunca mais quero ouvi-lo mencionando um descalabro desses. Não é por que seus hormônios começam a inquietar seu corpo que você não vai se comportar com decência e respeito. – sentenciou furioso.

Contrariando as ordens dele voltei ao meu quarto sem jantar. Afundado em meus pensamentos, de repente, consegui decifrar aquela angústia e aquele sofrimento que caracterizavam o Mark. Ele fora abusado por aqueles padres e carregava essa dor numa solidão impar. Se alguém sabia, ou desconfiava do que estava acontecendo, nunca lhe prestou qualquer ajuda, com receio das represálias. E, ele precisou carregar aquele fardo sozinho, uma vez que órfão como eu, não tinha a quem recorrer. A imagem de seu corpo jovem e nu pendurado naquela árvore voltou à minha mente. E, eu tive medo. Seria também esse o meu destino?

A semana recomeçou na mesma rotina. Para todos os alunos tudo estava como sempre esteve, uma normalidade construída por afazeres que se sucediam com a mesma monotonia. Exceto para mim. Num único final de semana minha inocência infantil e virginal ficou para trás. Era passado.

- Philip Manson! Espere. Preciso conversar com o senhor. – disse padre Ungar, na saída da primeira aula de química logo após o incidente. Meu coração começou a palpitar.

- Quer dizer que o senhor foi se queixar junto ao diretor. – sua voz era pausada e ele falava com mesma tranquilidade que antecede uma tempestade.

- Não, não...não senhor. – comecei a gaguejar, diante do olhar penetrante que ele me lançava.

- Cale-se! Não pense que suas aulas de reforço serão interrompidas pelo fato de ter ido se queixar com o reverendo Moesly. O senhor está confundindo as coisas, como é natural na sua idade. E, há de se haver comigo por sair por aí falando inverdades e levantando calúnias. Após o jantar esteja no gabinete dos professores que já pode ser utilizado novamente.

- Eu não vou! Não acho que esteja precisando de aulas de reforço. Como já lhe expliquei, vou me esforçar mais nos estudos para o próximo teste, e sei que vou me sair melhor. – pela primeira vez eu olhava bem dentro de seus olhos enquanto despejava de uma só vez a minha resposta. Saí da sala antes que ele pudesse articular uma palavra que fosse.

Menos de uma hora depois eu estava no gabinete do diretor diante de seu semblante enfurecido, tendo ao lado o padre Ungar, sentado displicentemente sobre uma das poltronas.

- Senhor Manson, parece que estamos diante de um problema de indisciplina. Saiba, para seu infortúnio, que sabemos como ligar com esse tipo de transgressão. A partir deste instante, estão suspensas todas suas folgas. O senhor vai tomar as aulas de reforço, nos dias e horários em que o padre Ungar determinar, vai se dirigir à cozinha logo após todas as refeições e ajudar nas tarefas que padre Noxwell lhe determinar, vai se incumbir dos preparativos de todas as missas e arrumar a sacristia logo que elas terminarem. Além disso, a partir de hoje, não haverá mais rodízio de estudantes para guardar os apetrechos utilizados durante as aulas de ginástica, será o senhor o encarregado único de guarda-los após as aulas do padre Lend. Voltaremos a conversar quando o senhor tiver compreendido o seu lugar nesta instituição. Agora, saia daqui! – ele caminhou pelo gabinete durante todo o seu discurso, mal dirigindo o olhar para mim. Enquanto isso, padre Ungar não tirava o sorriso malévolo do rosto.

Estranhamente não sentia mais aquele pavor que sempre me dominava quando algum deles me repreendia. Entrei no dormitório tão possesso que o David titubeou em questionar o motivo de tanta raiva. Contei a ele tudo o que aconteceu e os castigos que me foram impostos.

- Agora você é um cara marcado. Hão de fazer de tudo com você. Pouco antes de você chegar a Brechim fizeram o mesmo com o Mark. Era tanta pressão que ele acabou ficando daquele jeito que você conhecia. Eu o ouvia chorar todas as noites, mesmo quando padre Andrew não vinha busca-lo. – disse David, visivelmente preocupado com o meu futuro.

- Sabe de uma coisa? Desde que o reverendo Moesly não deu ouvidos ao que lhe contei, estive pensando em escrever uma carta ao delegado Lockworth, uma carta anônima, relatando o que aconteceu e contando tudo o que acontecia com o Mark. – declarei resoluto.

- Você enlouqueceu? Eles vão saber que foi você, e então, ninguém poderá dar conta da fúria desses padres contra você. – ele tremia enquanto me aconselhava. – Por Deus, não faça isso! – acrescentou, tão apavorado quanto eu sempre me sentia.

- Temos que encontrar outra solução. Mas, você fica ciente de que não vai colocar seu plano em execução, até encontrarmos uma maneira de obter a ajuda de alguém. Olhe para mim e jure, jure pelo que lhe é mais sagrado. – disse o Harry, depois que o David lhe contou o que eu pretendia fazer.

- Mas, até quando vou ter que aguentar isso? – retorqui desconsolado.

- Prometa! Não discuta comigo. Apenas prometa não fazer nada, por hora. – ele segurava meus ombros e me sacudia, não me deixando outra alternativa, senão concordar.

Cumprindo as tarefas do meu castigo, estava terminando de guardar as bolas, redes e halteres que haviam sido usados durante uma aula de uma turma de alunos mais velhos, quando reparei que dois alunos retardatários ainda estavam debaixo dos chuveiros. Eram dois sujeitos que já tinham implicado comigo algumas vezes, mas que, depois de uns safanões do Harry, haviam me deixado em paz.

- Ora, ora, veja se não é o viadinho bundudo que vai pedir a ajuda do delinquente do Harry. – exclamou um deles, enquanto mexia despudoradamente em sua pica.

- Deve ser o machinho dele. Vem ensaboar o meu cacete vem. – disse o outro, em cumplicidade. Antes de ambos caírem no riso.

- Está de castigo por que sentou no colo do padre Ungar, ou porque não quis chupar o caralho dele? – recomeçou o primeiro. Eu me perguntei como foi que ele, e talvez todo o internato, sabiam do que havia acontecido? Será que o David ou o Harry ... não, não podia ser. Eu não suportaria uma traição destas. Mas então, como?

- Vem cá, vem, tesudinho. Vem fazer um boquete na minha pica. Eu estou cheio de porra para te dar! – insinuou o segundo.

Próximo à porta de saída da sala dos chuveiros ambos me alcançaram e, me arrastaram para debaixo da água, com roupa e tudo. Eu distribuía chutes e socos a esmo tentando fazer com que me soltassem, mas em vão. À medida que a minha roupa se encharcava, ficava cada vez mais colada ao meu corpo, evidenciando a silhueta esguia e sensual. Eles arriaram meu short e, prensando-me entre seus corpos, começaram a se esfregar em mim e a passar as mãos ávidas nas minhas nádegas lisas. Ao fazer menção de que iria gritar um deles apertou a mão contra a minha boca e, não mais que alguns grunhidos ecoaram pelo ambiente. Quando um deles, com o caralho em riste, se preparava para meter no meu cuzinho, ouvimos a voz de padre Andrew me chamando. Eles me soltaram no mesmo instante e, pegando suas toalhas, correram em direção ao vestiário. Enquanto eu, ainda trêmulo e agitado, puxava meu short até a cintura.

- O que faz aí com as roupas todas molhadas? – inquiriu desconfiado, virando-se na direção para onde os garotos haviam corrido. – Vocês estavam de promiscuidade? – acrescentou, num tom que estava longe de ser uma reprimenda, mas o de quem a sorte lhe havia feito cair dos céus um motivo para me chantagear.

Naquela mesma noite descobri o motivo pelo qual um daqueles garotos sabia do que tinha acontecido nos aposentos do padre Ungar. Outro garoto da turma deles havia encontrado, há alguns dias, entre seus cadernos, um bilhete no qual se lia em letra de forma – PHILIP MANSON ANDOU SONDANDO O QUE SE ESCONDE SOB A BATINA DE PADRE UNGAR NA CALADA DA NOITE. Naturalmente não havia identificação do autor da denúncia. Quem veio me questionar a respeito foi o Harry e, segundo as desconfianças dele, também corroboradas pelo David, fora o próprio padre Ungar o autor daquele bilhete. A represália à minha insubordinação havia começado.

Mal haviam se passado duas semanas quando, pouco depois da meia noite, padre Andrew entrou em nosso dormitório e, tal qual nos tempos do Mark, veio me chamar para que eu o acompanhasse. Apesar dos passos de gato e de sua voz sussurrada quando me acordou, percebi que o David também despertara, e seus olhos me encararam com um brilho de terror. Padre Andrew me levou até a ala dos padres e, diretamente, para os aposentos do padre Ungar. Ele nem bateu na porta, me fazendo entrar com umas das mãos apoiada na minha nuca. Ao atravessarmos o umbral ele trancou a porta. O reflexo de uma lua cheia penetrando pelas janelas se refletia no assoalho lustroso de madeira, e era a única claridade que iluminava a penumbra que pairava lá dentro. Mesmo assim, logo que meus olhos se adaptaram à escuridão, consegui distinguir a figura do padre Ungar, sentado transversalmente na cama e com as costas apoiadas na parede. Ele estava praticamente nu, não fosse uma cueca bastante folgada que me permitia ver, através da abertura nas pernas, a cabeçorra rubra de seu pinto emergindo ao lado da coxa peluda. Padre Andrew forçava minha nuca me fazendo caminhar até junto à cama. Um sorriso sádico se formou no rosto de padre Ungar. Nas minhas costas, padre Andrew tirava apressadamente a batina e, quando ele a lançou sobre o espaldar da cadeira na qual eu já havia me sentado para ter a aula de reforço, constatei que ele também estava nu. Uma pica comprida e flácida pendia entre as coxas dele.

- Então nosso garotinho com carinha de anjo gosta de praticar atos libidinosos com dois machos ao mesmo tempo! E eu, que quase acreditei em sua reação pudica quando o sentei em meu colo. – rosnou sarcasticamente padre Ungar.

- Diga a ele o quanto esses hormônios abrem o seu apetite pelo proibido, pela lascívia que afogueia seu corpo. – sugeriu padre Andrew, ao mesmo tempo em que voltava a abraçar meu tronco.

- Eu suplico, por favor, me deixem voltar para o meu quarto. – as palavras mal conseguiam sair da minha garganta, tomado pelo pavor.

- Não precisa se acanhar. Tal como seus amiguinhos, nós também sabemos brincar com um corpinho tentador como o seu. – disse padre Andrew.

- Eu não sei do que o senhor está falando. Eu não estava fazendo nada com aqueles garotos. – balbuciei

- Eu não sou tolo, garoto! Sei muito bem o que vocês estavam fazendo. – sentenciou padre Andrew.

- Você vai gostar de partilhar esse seu segredinho conosco, tenha certeza. Nós vamos lhe dar muito prazer. Vai ser como uma viagem ao paraíso celestial. – assegurou padre Ungar. – Agora, deixe de frescuras e venha até aqui. – emendou, enfiando uma das mãos na fenda da braguilha e tirando o cacetão.

Aterrorizado com a visão daquela jeba e, antes que eu pudesse dizer qualquer coisa, padre Andrew forçou minha cabeça para dentro das coxas abertas de padre Ungar. Eu me vi cara a cara com seu falo, e pude sentir o cheiro almiscarado que emanava dele. Padre Ungar segurou minha cabeça enquanto pincelava a pica pelo meu rosto. Enquanto isso, padre Andrew apertava as minhas nádegas em suas mãos. Meu corpo tremia tanto que eu mal conseguia suportar os espasmos.

- Abra a boquinha e chupe meu cacete! – ordenou padre Ungar.

A minha relutância foi vencida pela intrasigência dele, fazendo a cabeçorra melada atravessar meus lábios e entrar até minha garganta. Tive engulhos e, as lágrimas pingavam dos meus olhos, diante dos quais uma imagem embaçada de seu sacão globoso pairava pornograficamente. Padre Andrew arriou minha cueca e, como um garanhão excitado pelo cio de uma égua, começou a mordiscar e a enfiar sua língua úmida no meu cuzinho. Eu gemi com a onda de luxúria que perpassou meu corpo.

Padre Andrew era um irlandês ruivo de pouco mais de quarenta anos. As sardas, que ponteavam suas bochechas rosadas, estavam espalhadas por todo seu corpo, muito alvo e musculoso. No peito e na virilha seus pelos ruivos formavam redemoinhos densos. Um sacão revestido por uma pele muito avermelhada deixava ver os dois bagos bem definidos. A sanha que cintilava em seus olhos azuis era toda dirigida ao meu corpo virginal.

Eu chupava a pica de padre Ungar e sentia o sabor da sua masculinidade na minha boca. Enquanto padre Andrew não parava de manipular minha bunda, apartando as nádegas e enfiando, primeiro um, depois dois dedos entre as minhas preguinhas anais. O cuzinho piscava alucinadamente, estimulado pelos dedos hábeis dele que se movimentavam em círculos dentro da minha ampola retal. Depois de algum tempo os dois trocaram de posição. Mudou o sabor que eu sentia na minha boca e o cheiro que atingia minhas narinas, mas não a tara com a qual eles se satisfaziam em meu corpo. A madrugada ia avançando, embora eu houvesse perdido a noção do tempo. Tudo aquilo fez com meu cérebro se sentisse com se tivesse sido narcotizado. Eu sabia onde estava e o que se passava ao meu redor. No entanto, estava tão entorpecido que meus músculos não queriam responder ao meu desejo de sair dali. Num relance, percebi que uma água tépida encharcava minha camiseta, a única vestimenta que ainda cobria minha carcaça, pois era essa a percepção que eu tinha do meu próprio corpo. Eu era o recheio de um sanduiche que os corpos nus do padre Ungar e do padre Andrew formavam. Estávamos debaixo do chuveiro e, a minha roupa íntima colara-se ao meu corpo como uma segunda pele transparente, deixando visíveis meus mamilos e, os ralos pelos pubianos que havia pouco mais de alguns meses começaram a se espalhar pela minha virilha. Ora eu sentia os lábios de padre Andrew, ora os de padre Ungar grudados nos meus, numa volúpia irrefreada, que fazia suas línguas se moverem na minha boca. De repente, um clarão estourou sobre nossas cabeças e, a água que jorrava morna sobre mim, foi se tornando angustiadamente gelada. Todo o edifício mergulhou na escuridão.

- Estamos sem energia. – disse a voz de padre Ungar.

- Diabos da porra! – exclamou a de padre Andrew.

Subitamente me vi livre deles dois, que tateavam a procura de alguma luz. A porta do quarto, que em nenhum momento havia deixado de ser o meu alvo, foi alcançada em segundos. Antes que os dois pudessem se dar conta, eu já corria pelo corredor mergulhado no mais profundo breu. Cheguei ao meu dormitório arfando e ainda pingando água do meu corpo encharcado. David e Harry estavam a minha espera. Um choro convulsivo se apossou de mim quando os vi, e Harry me tomou em seus braços.

- Depois que padre Andrew levou você, fui ao dormitório do Harry para avisá-lo, temi pelo seu destino. Ele provocou um curto circuito na caixa de distribuição elétrica. Estávamos certos que isso provocaria um corre-corre. – disse David.

- Você está encharcado, o que ele fez com você? – inquiriu Harry. – Tire essa roupa você vai molhar toda sua cama e pode pegar uma gripe. – acrescentou.

Não encontrei forças para responder, agora que estava seguro, apenas conseguia chorar. Um choro de ódio, de repulsa e de asco. Harry tirou a minha roupa e me fez deitar na cama, começando a ajeitar o cobertor sobre mim. Peguei seu braço, o puxei sobre meu tronco e o fiquei segurando apertado contra meu peito até que os soluços foram amainando e, eu adormeci sentido o calor do corpo dele junto ao meu. Harry ficou um tanto quanto desconsertado com aquela proximidade tão íntima com meu corpo nu. Mas, quando David, com um furtivo aceno de mão, o encorajou a me oferecer sua proteção, ele se aninhou a mim sentindo uma estranha e agradável sensação de prazer. Focou seus pensamentos em outras coisas, a fim de evitar uma ereção que já começava a tomar forma.

Eu agora já tinha a mesma expressão indefinida que era a característica mais visível do Mark. Era como se tudo a minha volta me fosse indiferente ou até mesmo hostil. Foi apenas três dias depois que tive condições emocionais de relatar ao Harry e ao David o que tinha acontecido, embora eles diariamente insistissem na minha narrativa.

- Temos que acabar com isso. – sentenciou Harry.

- Como? O que podemos fazer? Somos reféns da perversidade desses padres. – retrucou David.

- Eu vou morrer como o Mark. – disse, me sentindo incapaz de ir contra o meu destino.

- Nunca mais repita isso! Você não vai morrer. Eu nunca vou permitir isso! – exasperou-se Harry.

Finalmente, o reverendo Moesly revogou meu castigo. Estávamos a poucos dias do Natal. No final de semana anterior os pais vieram buscar os filhos internos para comemorarem o final de ano em suas casas. Um abeto foi todo enfeitado e colocado junto ao altar da capela. Essa foi uma das últimas tarefas que ainda cumpri sob o regime de castigo, em parceria com alguns outros garotos. No sábado que antecedeu o Natal, padre Noxwell havia me pedido para buscar alguns ramos de abeto no bosque próximo à margem do rio, onde eles abundavam viçosos e, podiam ser colhidos a baixa altitude, para que ele pudesse fazer uma guirlanda enfeitando o refeitório. A uns duzentos metros do edifício principal do monastério, atrás de uma cerca de murtas, havia uma construção que abrigava os apetrechos de jardinagem do senhor Gadsby, um sujeito mal encarado, sobre o qual pairava uma sentença judicial que, no momento, o fazia estar sob regime condicional, depois de haver quase matado um enteado a pancadas. Pela proximidade do Natal, ele não estava trabalhando e tinha ido visitar uns parentes em Glasgow. Pelas duas janelinhas entrava pouca luz, pois a construção estava sob a copa das árvores que a cercavam. No meio de uma bagunça generalizada, fiquei procurando pela tesoura de poda nas prateleiras atulhadas e quinquilharias. Não ouvi os passos que se aproximaram da entrada e, só dei pela presença de padre Andrew quando as dobradiças da porta rangeram. No mesmo instante fiquei lívido, pois a única saída era aquela porta e ele a obstruía com seu corpo.

- Hoje esse cuzinho não me escapa! Será o meu presente de Natal. – gracejou malévolo.

Eu tentei correr e me espremer entre o corpo dele e a fenda da porta aberta, mas ele, com facilidade, me conteve. Quando senti que ele me puxava para junto dele, comecei a distribuir chutes, acertando alguns em suas pernas.

- Desgraçado! Não pense que vai conseguir sair daqui antes de eu ter conseguido o meu presente. – rosnou, quando quase acertei um chute no saco dele.

Ele se debruçou sob mim me encurralando entre dois caixotes que tinham quase a minha altura. Arrancou minhas calças e apalpou minhas nádegas num delírio extasiado. Cravei os dentes no braço com o qual ele me aplicava uma chave. Ouvi seu grito quando o sangue começou a escorrer pelo braço dele. Um bofetão acertou meu rosto e eu fui parar no chão úmido, cheio de limo. Ele voltou a investir sobre mim e, ao me erguer até que meus pés flutuassem no ar, lançou-me contra a parede. O baque foi tão forte que perdi a respiração. Deslizei pela parede como uma lagartixa, caindo sentado com a bunda nua no piso gelado.

- Isso vai lhe ensinar a não desprezar as minhas carícias. – grunhiu ensandecido.

Ele me puxou pelo braço e voltou a se esfregar em mim, agora com a batina soerguida e o cacete rijo roçando minhas coxas. Suas mãos tapavam minha boca, e ele tentava alcança-la para me dar um beijo. A porta se abriu violentamente e o Harry pulou no pescoço do padre Andrew tentando esganá-lo. Ele precisou me soltar para conseguir tirar aquele peso de suas costas. Quando conseguiu, atirou o Harry contra a parede com tal ímpeto que eu ouvi o som oco da cabeça dele batendo nos tijolos. Os olhos dele se arregalaram e ele caiu sem sentidos.

- Agora vamos a você. Chega de reagir. Vou foder esse cuzinho nem que seja a última coisa que eu faça. – gritou colérico.

Ele se atirou sobre mim e o peso do corpo dele me comprimia contra o chão frio. Eu me agitava tentando escapar, mas só conseguia com isso atiçar o desejo dele. Ele abriu as minhas pernas e as dobrou fazendo meus joelhos quase tocarem os ombros. A pica melada deslizava pelo meu reguinho à procura das preguinhas e da entrada do meu cuzinho. Soltei um grito quando percebi que a cabeçorra estava bem na entrada do meu cu. Mas, subitamente, senti que a força que ele empregava para me conter começava a ceder. Seus olhos se esbugalharam e um estertor saiu de sua garganta. Então vi o Harry em pé, segurando entre as mãos enroladas num trapo, o cabo de uma picareta que formara uma protuberância no meio do peito do padre Andrew, quando se cravou nas costas dele. Deslizei para longe do corpo dele e o vi estrebuchando, enquanto o sangue aflorava de suas costas e começava a escorrer pelo piso. O Harry soltou o cabo da picareta, mas ela continuava fincada nas costas do padre. Ele ainda tentou se levantar mais uma vez, mas seu corpo caiu inerte, enquanto a boca tomava um aspecto distorcido e arreganhado. O meu olhar e o do Harry se cruzaram num pacto cúmplice e secreto.

- Vamos sair daqui. Já! – gritou o Harry. Ele me puxou pelo braço e saímos correndo dali.

- Espere! Padre Noxwell me mandou pegar uns ramos de abeto. Ele sabe que eu estava aqui. – consegui dizer, como se um facho de claridade abrisse meu pensamento.

- Venha. Vamos quebrar alguns ramos e ele vai ver que não foram cortados, e sim, arrancados.

Eu entrei na cozinha com um feixe de ramos debaixo do braço com a maior tranquilidade que consegui imprimir a meu espírito perturbado. O corpo só foi encontrado depois do jantar, quando as buscas pelo padre desaparecido já perduravam algumas horas. A polícia e o delegado Lockworth chegaram pouco depois. Era tarde da noite quando o rabecão transportando o corpo atravessou o portão rumo à cidade. O delegado voltava ao internato diariamente, mas, no terceiro dia veio acompanhado por um séquito muito maior que o usual. Todos os internos que haviam permanecido em Brechim, juntamente com todos os padres, foram reunidos na capela.

- Como é do conhecimento de todos, estamos prosseguindo as investigações sobre o assassinato do padre Andrew. – começou o delegado, numa voz pausada e segura. Pensei que fosse ter uma síncope, sentado numa das últimas fileiras de bancos, ao lado do David e do Harry, quando ele verbalizou a palavra assassinato. Foi como se dentro de instantes ele fosse apontar o dedo para mim e para o Harry. – Embora hoje nossa presença no internato tenha outro cunho. Este é o juiz Andrew Hagedorn, representante da alta corte de justiça, que está acompanhando o caso. E, este é o senhor Allan Boyd, chefe do serviço de assistência social e da infância da região centro-leste das terras baixas, sediado em Dundee. Vou passar a palavra a eles, para que informem sobre o futuro do colégio e, principalmente do internato de Brechim. – continuou, formal e soberbo.

O alívio que senti ao perceber que não seria apontado pelo delegado como um dos responsáveis pela morte de Andrew foi, aos poucos, sendo substituído por uma sensação aflitiva, à medida que prosseguiam os discursos do juiz e do chefe da assistência social. O colégio e o internato seriam fechados. Os pais dos alunos que estavam no recesso de Natal já estavam sendo comunicados do encerramento das atividades do colégio. Quanto a nós, internos, seríamos transferidos para outras instituições. Os com menos de doze anos, como era o meu caso, seriam alocados em casas de famílias adotivas, num programa recém-criado pelo ministério da ação social, onde estas famílias seriam remuneradas pelo Estado para dar abrigo e amparo a crianças órfãs. Enquanto tomava ciência do meu futuro incerto, minha mão saiu à procura da do Harry, que eu a apertei com força, como se o calor que vinha dela pudesse aplacar o meu sofrimento.

Na tarde daquele mesmo dia, o velho reverendo Moesly e padre Ungar foram colocados numa viatura da polícia e levados dali. Foi padre Lend quem respondeu minhas perguntas sobre o destino dos dois, quando ajudava os internos e prepararem suas coisas para a mudança que aconteceria no dia seguinte.

- Os peritos da polícia encontraram no chão do galpão de jardinagem material do padre Andrew que confirmou ser o mesmo encontrado no corpo do Mark. Como padre Ungar agora também precisou passar pelo mesmo exame que foi feito em todos os religiosos por ocasião da morte do Mark, descobriram que ele também coincidia com o encontrado no Mark. Isso os ligou ao crime como os supostos assassinos. E, o reverendo Moesly foi indiciado por acobertamento e cumplicidade na morte do Mark, por ter dado fuga aos padres Andrew e Ungar. Além disso, o delegado encontrou num dos bolsos de seu casaco, que havia deixado sobre uma poltrona da sala dos professores, enquanto fazia o acompanhamento do trabalho dos peritos lá no galpão, uma folha de papel datilografada, onde o reverendo Moesly era acusado de ter sido omisso quando, tanto o Mark quanto outro interno, cujo nome não foi mencionado, foram procura-lo relatando o abuso que sofreram por parte dos padres Ungar e Andrew. Do mesmo bilhete constava a informação que ele havia dado fuga aos dois logo após a morte do Mark. Mas, deixe de ser curioso e continue a arrumar suas coisas. Isso não é assunto para um garotinho como você. – concluiu, explicitando que apenas estava me pondo a par dos fatos por ter um carinho muito especial por mim. Enquanto eu ouvia atento o relato dele, algo me dizia que o autor do bilhete fora o David.

- Obrigado, padre Lend! Eu também gosto muito do senhor. Nunca vou me esquecer de como me ensinou a ler, escrever e fazer contas, para que eu pudesse acompanhar os outros alunos. Vou sentir muito a sua falta! – agradeci, indo abraça-lo com os olhos marejados.

- Tudo vai dar certo, Philip. Não precisa ter medo. Você já é um garotão e, essas lágrimas não combinam com um menino forte e corajoso. – retorquiu, embora eu constatasse que seu olhar estava tão mergulhado em lágrimas quanto o meu.

Um sol tímido finalmente reapareceu na manhã gelada, na qual o carro da assistência social veio me apanhar, com mais dois internos, para nos levar à casa do casal que nos abrigaria, em Edimburgo. David, bastante emotivo, procurou se poupar daquela despedida. Vi seu rosto desolado, acompanhando o que se passava no pátio em frente ao edifício, colado às vidraças das janelas do que foi meu quarto nos últimos seis anos. Harry trouxe minha mala para baixo e me abraçou antes de eu entrar no carro. Mas, não conseguiu dizer nenhuma única palavra. Eu balbuciei um adeus, antes daquele nó que sufocava a minha garganta se transformar em choro. Quando o carro estava prestes a cruzar o portão, eu me virei e vi o Harry acenando. Aquela mesma sensação sofrida de que estava a perder alguma parte muito importante da minha vida, sufocou o meu peito, tal como no dia em estava dentro do carro com o meu tio e deixávamos aquela sepultura coberta de flores no cemitério de Dundee.

O senhor e a senhora Seager eram um casal de mais ou menos quarenta anos. Não tiveram filhos. Ele era médico e ela tinha um cargo na municipalidade de Edimburgo. Haviam se inscrito no programa de assistência social à infância, na expectativa de trazer um pouco de agitação para a enorme casa que haviam construído num bairro residencial de Edimburgo. Eles nos esperavam com uma série de mimos. Conheciam as nossas histórias e, não foi difícil identificar aquele olhar de comiseração com o qual nos recepcionaram. Tiveram muita paciência e compreensão com aqueles longos silêncios e as poucas palavras que pronunciávamos, geralmente monossilábicas, em resposta às suas perguntas. Nos dedicavam todo o seu tempo livre, e não mediram esforços para nos acolher como verdadeiros filhos, embora nem adotivos fossemos. Cada um de nós foi instalado num quarto com banheiro e, o perfume de macela que impregnava a roupa de cama fez com eu tivesse uma das melhores noites de sono de que me lembrava. E, fez com que eu nunca mais me esquecesse da acolhida e do afeto que recebi naquela casa.

Estava fazendo quase um ano, desde que vim morar com os Seager, quando entrei correndo em casa, vindo da escola, num final de tarde de primavera, feliz com a notícia que tinha para dar.

- Papai! Mamãe! ... Papai! Mamãe! – berrava, a procura deles. – Adivinhem só. As minhas fotografias vão para a exposição anual da escola. Ficarão expostas à visitação no saguão da prefeitura durante todo esse mês. – despejei esbaforido, ao encontra-los na cozinha preparando o jantar. – O que foi? Não gostaram da surpresa? – perguntei, quando me encararam perplexos.

- Não ... não é isso, Philip, meu filho! – respondeu o senhor Seager, depois de um silêncio no qual tentou se recompor. Enquanto isso, pelas faces da senhora Seager rolavam lágrimas, que ela enxugava com as costas das mãos.

- O que aconteceu então? Não gostaram da surpresa?– perguntei, sem compreender aquela situação.

- Do que foi que você me chamou? – perguntaram quase simultaneamente, antes de se entreolharem e começarem a rir.

- Papai e mamãe? – quem ficara sem jeito, de um instante para o outro, era eu. Será que não queriam ouvir isso?

- Venha cá meu querido. – disse a senhora Seager, ajoelhando-se no chão da cozinha e me tomando em seus braços. – É a primeira vez que alguém me chama de mamãe, e eu juro que nunca ouvi uma palavra mais linda do que esta. – disse, voltando a chorar.

- Achei que nunca fosse ouvir alguém me chamando de pai! – exclamou o senhor Seager, vindo juntar-se a nós no mesmo abraço.

- Então? Não é legal as minhas fotografias terem sido escolhidas? – tornei a perguntar, no que ambos aquiesceram. – E eu gosto de poder chama-los de papai e mamãe. – acrescentei, orgulhoso.

- Sim, foi muito legal! No sábado vamos todos ver como ficaram, está bem? – disse papai.

Essas fotografias foram o resultado da primeira conversa que tive com papai poucos dias depois de ter vindo morar com os Seager. Ela aconteceu no pequeno escritório que ele mantinha em casa. Havia uma câmera fotográfica sobre uma prateleira da estante atrás dele, que despertou minha curiosidade. Para quebrar o gelo daqueles primeiros dias, ele me mostrou como ela funcionava e, ao final da demonstração, colocou-a em minhas mãos.

- Acha que consegue manuseá-la? E cuidar dela? – perguntou.

-Sim, creio que sim. – respondi, ainda tímido, com aquela casa estranha onde o destino havia me colocado.

- Então ela é sua! Espero que faça lindas fotos com ela. – disse, com um sorriso paternal e cativante.

Esse presente, sem que ele o soubesse naquele dia, acabou por determinar o meu futuro quando, anos depois, ingressei na faculdade de publicidade e propaganda da Universidade de Edimburgo, motivado pelas possibilidades que vi nas fotografias tiradas com ela.

Treze anos depois, eu consegui um emprego numa das mais afamadas agências de publicidade e propaganda de Londres, onde comecei a desenvolver a minha carreira. Estava morando num pequeno loft, em Highbury, que dividia com outro colega da agência. Certo dia, eu e uns colegas da agência nos dirigimos até o Bluebird Restaurant no Chelsea, num horário já bastante tardio para o almoço. Tínhamos acabado de fazer os pedidos quando três executivos entraram no restaurante. Um deles chamou muito a minha atenção. Seu corpo musculoso se movia com extrema agilidade, durante o caminhar pesado e determinado, debaixo do terno elegante e caro. Os cabelos estavam harmoniosamente desalinhados. E, seus olhos, aqueles olhos tinham algo de familiar. Foi com eles que ele me encarou, quase trombando com o garçom que vinha servir nossos pratos. Mais uma vez nossos olhares se encontraram, e eu senti o coração palpitando aflorar na minha boca. Harry. Seria ele? Era ele. Eu não podia estar enganado. Ele olhava com frequência para a nossa mesa. Assim que o vi se dirigindo ao banheiro, fui atrás dele.

- Harry? Harry Nicholls? – balbuciei.

- Sim! Pois não? – perguntou, enquanto fechava a braguilha e se dirigia às pias.

Precisei me apoiar na parede mais próxima, pois um breve apagão se formou diante dos meus olhos. Ele avançou na minha direção a fim de me amparar.

- Você está se sentindo bem? Posso ajuda-lo com alguma coisa? – inquiriu, enquanto eu me restabelecia do choque.

- Harry, sou eu, o Philip! – murmurei. Mas, antes que terminasse a frase e ele sentisse o toque com a minha pele, ele já havia me reconhecido.

- Philip! Oh! Deus do céu! Lá no salão eu senti que havia algo de familiar em você! – exclamou, me apertando com tamanha força contra seu peito que achei que ia ficar sem ar. Há anos tenho procurado por você. E, finalmente, agora o reencontro. – Quem diria que aquele garotinho tímido fosse se transformar num cara tão ... tão lindo! – acrescentou, me examinando de cima abaixo. Corei. Há tempos eu não ficava tão encabulado.

Ele estava ocupado com os clientes que esperavam por ele no salão do restaurante, por isso me intimou a encontra-lo, em seu apartamento, naquela mesma noite. Trocamos telefones e nos despedimos contrafeitos, pois ambos não queriam quebrar o encanto daquele reencontro e, temíamos nos afastar novamente. Talvez demorássemos outra década para nos reencontrarmos. Ele me abraçou mais uma vez e, tomando meu rosto entre as mãos, beijou-me com tanta doçura que esquecemos que estávamos num lugar inapropriado. Um cara entrou no banheiro e nos flagrou.

- Como é lindo o amor! – disse. Harry e eu retribuímos com um sorriso vexado.

Quando voltei para a mesa, meus colegas perceberam a minha agitação. E, também, o fato do Harry e eu continuarmos a trocar olhares através do salão. Creio que ambos não estavam mais conseguindo se concentrar no que acontecia a nossa volta. Ao deixar o restaurante, dei uma última olhada na direção dele. Era o homem mais lindo e confiável que eu já tinha visto. Ele sorriu e acenou, para espanto dos que estavam com ele à mesa.

- Quem é? – perguntou uma das amigas que estava comigo.

- Um amigo dos tempos do internato. – respondi.

- É um pedaço de mau caminho. Você precisa me apresentar a essa preciosidade. – disse, fazendo pilheria.

Nesse instante, um calafrio percorreu minha coluna. Dei-me conta de que, durante todos esses anos, eu havia sonhado e idealizado uma vida da qual o Harry era a parte mais importante. Mas, agora, me veio a ideia de que ele talvez estivesse casado e com filhos. Como bem constatou minha amiga, ele não era o tipo de homem que aos trinta anos ainda continuasse solteiro. Não um homem como aquele, que transpirava virilidade pelos poros.

O expediente daquela tarde parecia não ter fim. Eu nunca estivera tão desfocado e distraído. A cada instante alguém me perguntava se eu estava nas nuvens ou, se não estava me sentindo bem. A cada instante entrava uma nova mensagem no meu celular. Foram cinco, todas do Harry. NÃO SE ESQUEÇA DO COMPROMISSO. FELIZ POR TER VOCÊ OUTRA VEZ PERTO DE MIM. SAUDADES SÃO ENORMES. FALTA POUCO MAIS DE DUAS HORAS PARA QUE VOCÊ ESTEJA COMIGO. JÁ ESTOU AQUI, ESPERANDO POR VOCÊ. Aquilo foi me enchendo de esperanças, ele também sentia a minha falta. Mas, apesar de contrafeito, minha razão me trazia a realidade. Pode ser que ao chegar ao apartamento dele, ele lhe apresente a esposa e os filhos. Esteja preparado.

Meia hora antes do combinado, tomado de ansiedade, eu estava tocando a campainha do apartamento. Para meu alívio, quem abriu a porta foi ele mesmo. Durante o longo abraço que me deu assim que pode me alcançar com seus braços, percebi que não havia outras vozes no apartamento. No entanto, foi apenas quando ele voltou a me beijar, apertando seus lábios quentes e úmidos contra os meus, é que me convenci de que não podia haver uma esposa ali.

- Philip! Meu menininho assustado. Como senti sua falta. – murmurou, não me deixando sair de seus braços.

- Sempre tive esperanças de reencontra-lo outra vez. Quase morri naquele dia em que você ficou acenando para mim da entrada do internato. – meus olhos insistiam em ficar marejados, tanta era felicidade que estava sentindo.

- Nunca mais vamos ficar distantes um do outro. Não fique assim! – sussurrou, enxugando, com o polegar, uma lágrima que desceu pelo meu rosto. – Eu vou te proteger até ficarmos velhinhos e caquéticos! – emendou, brincando.

- Eu sou mesmo um pirralho chorão, não é? – sentenciei.

- O pirralho mais chorão e mais gostoso que eu já vi. O pirralho que me deixava de pau duro, e que me fazia bater muita punheta para aliviar o tesão que me fazia sentir. – confessou, tornando a colar sua boca na minha.

- Eu sempre confiei em você. Achava que nada de ruim podia me acontecer quando você estava por perto. Quanta falta você me fez! – balbuciei, acariciando seu rosto hirsuto.

Quando dei por mim, estávamos nus na cama. Ele olhava para mim com um sorriso doce e um olhar de desejo. Deslizava as costas dos dedos pelos meus ombros, tocando minha pele tão suavemente como se ela fosse queimá-lo. Eu a sentia em brasa. Cada toque dele me provocava um arrepio, algo como um choque, que se distribuía por todo o meu corpo. Pela primeira vez eu senti tesão por estar sendo tocado daquela maneira. Fiquei admirado com o fato de estar sentido um toque tão carregado de volúpia e cobiça, e desejar que ele prosseguisse. Não havia repulsa e nem aversão, só aquela vontade de que as mãos dele se apossassem de mim. Eu passei a fazer o mesmo com ele. Deslizava meus dedos pelo seu rosto, descia delicadamente pelo pescoço e acariciava sua nuca junto à implantação do cabelo. Senti que aquela região era extremamente sensível e o excitava. Ele não escondeu isso de mim, muito menos a ereção que minhas carícias estavam lhe provocando. Beijei seu ombro e ele enfiou os dedos nos meus cabelos, aspirou o perfume deles e grunhiu.

- Como eu desejei ter você só para mim! – sussurrou, mordiscando meu pescoço.

Aos poucos fui me reclinando sobre os travesseiros e ele começou a lamber e chupar meus peitinhos. Os mamilos se enrijeceram e ele sorriu satisfeito. Deitei a cabeça dele no meu peito e fiquei afagando seu rosto. Ele conseguia ouvi meu coração palpitando acelerado por tê-lo tão junto de mim.

- Eu sempre quis ser seu! – murmurei, beijando a testa dele.

Ele sentou-se na cama e com as costas apoiadas na cabeceira, abriu as pernas e guiou meu rosto para junto da ereção dele. O cacetão empinado pulsava dando breves pinotes à medida que o sangue fluía para torna-lo cada vez mais rijo. A glande lustrosa brilhava com a umidade do pré-gozo que aflorava pela uretra. O cheiro másculo penetrou minhas narinas aumentando meu tesão. Ao invés de asco, eu sentia vontade de lamber e chupar aquela pica. Toquei sensualmente meus lábios na glande sensível e comecei a lambê-la. Ele gemeu e se contorceu. O pré-gozo que molhava minha língua tinha sabor que lembrava avelãs e amêndoas, e era delicioso. Segurei o pau em minhas mãos e o acariciei. Ele latejava cheio de tesão. Fiquei mordiscando e chupando cada centímetro daquela jeba, sentindo seu cheiro e seu sabor indescritivelmente lascivos. Ele segurava minha cabeça entre as mãos e erguendo a pelve metia cuidadosamente a pica na minha boca, fazendo-a atolar-se na minha garganta. Eu tomava fôlego pelas narinas enquanto a jeba descia pela minha goela. Ergui meu olhar para o semblante de satisfação dele, e isso me deu uma alegria tremenda. Tudo que eu queria era que ele sentisse o quanto eu gostava dele, o quando ele representava para mim. Ele começou a passar a mão nas minhas nádegas. Apertava a carne polpuda e rija, imaculadamente lisa e alva. Nunca havia me sentido tão feliz, como naquele instante, por ter uma bunda tão volumosa e empinada, que outrora só tinha sido alvo de escárnio, deboche ou cobiça imoral. Nas mãos dele ela despertava um desejo de luxúria amorosa. Aos poucos ele foi insinuando o dedo médio no meu reguinho, percorrendo-o até se deter na portinha do ânus pregueadinho. Meu cuzinho piscava alvoroçado pelo tesão. Um frêmito se apoderou do meu corpo e me deitei languidamente ao lado do corpo dele. Ele rolou sobre mim, fazendo com que sua ereção se alojasse entre as minhas nádegas mornas, os pelos de seu peito roçassem minhas costas e, o hálito de sua respiração ansiosa cingisse meu cangote. Ele pincelou a rola no meu rego e começou a forçar a cabeçorra para dentro das preguinhas. Eu arfava angustiado e desejoso. Soltei um ganido quando a pica venceu a resistência dos meus esfíncteres anais e se alojou dolorosamente nas minhas entranhas. Agarrei os lençóis cravando meus dedos neles. Ele pousou sua mão sobre a minha fazendo seus dedos se encaixarem nos meus, e esperou até que meu cuzinho se acostumasse com aquele volume que pulsava selvagemente dentro dele. A penetração continuou com estocadas curtas, constantes e sequenciais, até que o sacão, que batia contra minhas nádegas a cada impulso, se comprimisse no meu rego arreganhado. Eu gemia e, ao fazê-lo, excitava-o provocando um arfar gutural que escapa entre os dentes cerrados dele.

- Ah Philip como você é gostoso! Que cuzinho apertado da porra é esse? Me avise se estiver te machucando. – rosnou ardente.

- Nada é tão sublime e tão intenso quanto sentir você dentro de mim, meu querido! – gemi, sublimando a dor que se espalhava pela minha pelve.

Ele passou a me estocar num frenesi cada vez mais intenso e bruto. Nos meus ganidos eu liberava todo o tesão que ele me fazia sentir. O cacete sendo massageado pelos meus esfíncteres apertados e, minha bunda roliça se encaixando em sua virilha como se tivesse sido esculpida exclusivamente para o seu prazer, fizeram-no gozar como um touro. A porra quente e viscosa brotava feito um gêiser, explodindo em jatos abundantes, na consistência de um creme espesso, que escorria pelas minhas entranhas. Ele grunhia de prazer enquanto galava meu cuzinho rasgado. Pingos de sangue tingiram o lençol, e ele me encarou surpreso.

- Machuquei você, me perdoe. – disse, me apertando nos braços e me cobrindo de beijos.

- É que ... bem, na verdade ... esta é a primeira vez que alguém chega tão fundo. – murmurei encabulado.

- Quer dizer que... Então quando você era garoto nunca ... e você, depois disso, nunca .... – ele não conseguia terminar nenhuma das frases de tão feliz.

- Não. Nunca, Harry. E eu nunca quis que fosse outro, se não você! – exclamei.

- Meu menininho tesudo. Eu me culpava todos os dias por achar que não tinha conseguido te proteger daqueles miseráveis. No entanto, você fez isso sozinho. – ele irradiava uma alegria contagiante.

- No mais fatídico dia da minha vida foi você quem impediu que o pior me acontecesse. Foi você sim, quem sempre me resguardou. Eu te amo por isso, e por tudo que você sempre foi para mim. – confessei.

O alvorecer começava a anunciar um novo dia. Nós ainda estávamos abraçados e tínhamos conversado a madrugada toda. Só paramos duas vezes para fazer amor, ensandecida e ardentemente. Aqueles treze anos de afastamento foram como se nunca tivessem existido. Toda a intimidade e cumplicidade continuavam tão intactas como antes, como sempre. E, os meses seguintes só serviram mais torna-las mais sólidas e consolidadas.

Harry tinha ido para um abrigo em Glasgow, que recebia adolescentes mais velhos, poucos dias depois de eu ter deixado Brechim. Terminou os estudos básicos e conseguiu um emprego de escriturário num escritório de advocacia. Seu talento nato para se indignar com injustiças e seu espírito aguerrido fizeram com que seus patrões o estimulassem a entrar na faculdade de direito. Bancaram seus estudos e, quando decidiram transferir o escritório para Londres, onde havia mais oportunidades e casos mais rentáveis, convidaram-no a fazer parte do time. Ele me disse que, desde que relatara seu passado em Brechim e, os tristes acontecimentos ocorridos lá, os fundadores do escritório começaram a acompanhar, à distância e, sem envolvimento direto, o destino do reverendo Moesly e do padre Ungar. Descobriram que o velho reverendo morreu de um enfarto fulminante pouco depois de sua prisão ter sido decretada, acusado de negligência na defesa de vulneráveis e reincidência na cumplicidade em caso de pedofilia. O padre Ungar havia sido condenado pelo assassinato de um interno, Mark Kendrick, pois seu esperma e o do assassinado padre Andrew haviam sido encontrados no ânus do aluno. Descobriram ainda, que o delegado encarregado das investigações da morte do padre Andrew, apontou em seu relatório final, tratar-se de um caso de vingança, cujo autor nunca foi identificado. Apontando que o passado pouco idôneo do padre tenha sido o principal motivo do crime. Quando Harry me contou isso eu não acreditei que o delegado Lockworth não tivesse conseguido chegar ao autor do crime e, nem o Harry, segundo me disse.

- Sabe Philip. Eu tenho certeza que a astúcia do delegado Lockworth o levou a descobrir que um dos alunos matara o padre Andrew, e que com isso a justiça tinha sido feita. Acredito que ele propositalmente não levou as coisas adiante, pois achou que desta forma a justiça prevaleceu e que assim não haveria outras crianças molestadas. – disse, como se aquele passado ainda rondasse em sua memória.

- Também penso assim. – concordei. – Mas, não vamos mais pensar nisso. Você fez o que tinha que ser feito. Você me salvou. Não há dia em que eu não lhe seja grato por isso. E, o amor que sinto por você é fruto de sua bondade e de sua generosidade. Nada vai obscurecer isso, meu amor. – concluí, tocando meus lábios nos dele.

Fazia alguns meses que Harry e eu havíamos nos reencontrado. Desde então, eu não fazia nenhum programa no qual ele não estivesse presente, e vice-versa. Íamos de carro até os arredores de Londres explorar a vida no campo aos finais de semana, fomos a alguns shows de bandas que ambos curtiam, quase nunca perdíamos a estreia de uma peça ou filme, por duas vezes chegamos a ir às apresentações de Don Giovanni no London Coliseum e, de Il Barbieri di Siviglia no Royal Opera House, com tickets que Harry havia recebido de uma firma para a qual o escritório dele estava trabalhando. Entre esses programas mais agitados, também acontecia de ficarmos simplesmente vendo TV ou tomando um vinho sem sequer deixar o apartamento dele, onde eu passava agora todos os finais de semana.

- Philip! Estou passando uma ligação. A pessoa disse que o conhece, mas não se trata de assunto de trabalho. – disse a garota de cabelos longos com mechas tingidas nas cores do arco-íris, contratada há pouco pela agência como auxiliar da Srta. Penwood, nossa secretária.

- Pode passar, Christine. Ele não mencionou do que se trata?

- OK! Não, não disse nada.

- Manson! Philip Manson. – disse a voz impaciente do outro lado.

- Sim. Sou Philip Manson, em que posso lhe ser útil?

- É o David. David Defoe de Brechim, está lembrado?

- Claro! David! Nem posso acreditar! Onde você está? O que anda fazendo? Vamos nos encontrar. – respondi, feliz com aquele contato.

- Encontrei seu nome nos créditos de uma campanha publicitária que a empresa da minha noiva encomendou. Nem pude acreditar quando vi seu nome. Até a pouco estava em dúvida se não poderia haver dois Philip Manson. Que alegria poder falar com você outra vez. Quando podemos nos encontrar? Estou morando em Glasgow. – revelou.

- Também estou imensamente feliz em poder conversar com você. O que me diz deste fim de semana? Posso ir até aí, que tal sábado. Pego um trem em Euston e chegou aí por volta das duas da tarde. – disse, sentindo a ansiedade tomando conta de mim.

- Claro! Claro. O mais breve possível. Estarei a sua espera na estação. – confirmou eufórico.

- E, adivinhe? Vou levar alguém comigo que você também conhece. – disse, aumentando a expectativa dele.

- Quem? Não ... Não me diga que é oHarry! – confirmei, antes que ele concluísse seu pensamento.

- Você está brincando! Como foi que vocês se reencontraram? Nossa! Que alegria vai ser estar com vocês outra vez.

- Sábado te contamos tudo, OK? Abração e até lá.

- Até!

Em seguida liguei para o Harry contando a novidade. Ele ficou eufórico e disse que mandaria um mensageiro comprar as passagens para o sábado de manhã.

- Vai ser um ótimo fim de semana! – disse ele, desculpando-se por não poder se demorar mais, pois estava prestes a entrar numa reunião.

O trem deixou a estação de Euston pontualmente as nove e catorze, sob um nevoeiro denso. Harry e eu pensamos que seria mais um fim de semana nublado e chuvoso, mas cerca de uma hora depois, prestes a entrar na estação de Rugby o sol apareceu entre as nuvens que se dispersavam rapidamente pela ação dos ventos. Identificamos o David pelo boné com o emblema do Scotland. O homem que estava por baixo dele tinha um porte atlético, embora estivesse ligeiramente acima do peso. As bochechas rosadas e o cabelo castanho ondulado ainda eram os mesmos dos tempos em Brechim.

- David! – gritou Harry, pela janela do trem antes mesmo que ele parasse completamente na plataforma.

Ele estava visivelmente emocionado quando nos abraçou simultaneamente, com seus braços que pareciam os de um urso. Harry era o mais controlado, enquanto eu não conseguia evitar que meus olhos se marejassem. Saímos de lá direto rumo a um restaurante. Apesar de ele ter sido o único a admitir que estivesse morrendo de fome, eu também não via a hora de colocar algo substancioso no estômago.

- É bom tê-los aqui. Vocês não imaginam a felicidade que estou sentindo. – disse, após nos induzir a provar as costeletas de cordeiro que, segundo ele, deram fama ao lugar.

- Eu também fiquei muito feliz com o seu telefonema. – retribuí

Ele nos contou que após sua saída de Brechim, que aconteceu no dia seguinte à partida de Harry, fora transferido para um orfanato em Glasgow. Terminou os estudos numa escola local e ingressou na Universidade de Glasgow no curso de engenharia civil. Depois de formado, abriu sua própria empresa, que na época não passava de dois cômodos alugados a um casal aposentado no sótão da casa deles. Trabalhava como construtor. No início, fazia pequenas reformas, mas de uns quatro anos para cá, os trabalhos começaram a se diversificar, e ele já tinha terminado meia dúzia de projetos residenciais completos, além de alguns comerciais nos quais se achava envolvido agora. Nesse meio tempo conhecera Alyssa, sua noiva, com a qual estava de casamento marcado para dentro de um mês e meio. Esse, segundo ele, fora a segunda razão para nos convidar. Fazia questão da nossa presença na cerimônia. Já havia escurecido quando deixamos o restaurante rumo à casa dele, cuja reforma, ele mesmo havia tocado com os palpites da noiva e, onde iriam morar depois de casados. Nossa conversa se prolongou noite adentro, acompanhada de algumas garrafas de vinho e uma pizza que ele pediu pouco antes das onze horas. Tivemos como colocar em dia os principais fatos ocorridos em nossas vidas. Passava da uma da madrugada quando ele nos levou ao andar superior e nos mostrou o quarto no qual ficaríamos acomodados.

- Creio que não se importam, não é? Pensei em facilitar as coisas, caso ainda não tenham chegado a esse ponto. – disse, com uma voz zombeteira e um sorriso malicioso, quando nos apontou a espaçosa cama de casal.

- Desde que reencontrei o Philip não perdi mais tempo. – respondeu o Harry no mesmo tom jocoso.

- Você sabia Philip, que esse sujeito se debulhou em lágrimas no dia da sua partida de Brechim. Acho que foram as únicas que ele derramou na vida. Disse que naquele carro ia o futuro feliz com o qual ele sonhara desde que havia te conhecido. Foi de cortar o coração vê-lo tão desesperançado. E o sufoco dele, naquele dia em que você chegou com as roupas encharcadas no dormitório e você o puxou sobre si como um cobertor. Ficou tão confuso com o cacete duro e cheio de tesão que mal sabia como se ajeitar ao seu lado. Por isso, fiquei tão contente quando soube que vocês tinham se reencontrado e estavam juntos. – revelou, em tom de fuxico.

- Eu sempre notei suas artimanhas bancando o cupido. Sei que muitas das vezes em que eu e o Harry nos encontrávamos, casualmente, a sós, tinha dedo seu nessa história. – retorqui.

- Bem! Aproveitem o que resta da noite. Amanhã vou lhes apresentar minha noiva. Tenho certeza que vão gostar muito dela. – disse, deixando-nos a sós.

Alyssa era mesmo uma criatura especial. Sua força interior e sua bondade eram camufladas por uma delicadeza natural, e por palavras meigas e carinhosas. Parabenizamos o David pela escolha. Formavam um lindo casal.

Quando o trem chegou à estação de Euston, no domingo, já passava de vinte e três e trinta. Harry e eu estávamos cansados, dormimos pouco na noite anterior e, passamos o dia passeando com o David e a Alyssa. Por isso, ele insistiu para que pernoitasse em seu apartamento, alegando que eu ganharia algumas horas de sono, antes de encarar o trabalho no dia seguinte. Ele tinha essa mania de inventar algum pretexto, ao invés de explicitar claramente suas intenções, especialmente quando estas estavam relacionadas a sexo. Ele queria mesmo era transar, uma vez que nos abstivemos de fazê-lo, na casa do David. Eu concordei. Mesmo porque, deixa-lo na secura significaria lidar com seu mau humor por alguns dias daquela semana e, por outro lado, por que eu também estava carente de seus predicados sexuais.

Ele não perdeu tempo. Eu ainda estava debaixo do chuveiro quando ele me abraçou por detrás e começou a esfregar sua verga nas minhas nádegas molhadas. Acariciei seus braços assim que eles me enlaçaram. Ao mesmo tempo, me firmei sobre as pernas ligeiramente abertas e empinei a bunda contra a virilha dele.

- Gosto quando você se entrega assim tão docilmente. – ronronou no meu ouvido, beijando minha nuca.

Segundos depois a pica entrou sorrateira e gananciosamente no meu cuzinho. Gemi quando as pregas se rasgaram provocando uma dorzinha aguda e penetrante, mas deixei que ele metesse, avidamente, todo o cacetão no meu cu e, começasse a bombar profunda e ritmicamente. Ele apertava intensamente meu corpo contra o dele, para que cada estocada conseguisse se alojar mais profundamente nas minhas carnes, me fazendo ganir de deleitamento. Por duas vezes senti que ele estava prestes a gozar, no entanto, ele se controlou mantendo a rola estancada dentro de mim, até conseguir refrear o tesão. Saímos do chuveiro e nos secamos sem que a pica dele amolecesse. A visão daquela jeba excitada me enlouquecia de prazer. Ao chegarmos junto à cama comecei a chupa-la. O pré-gozo afluiu abundante e deliciosamente cheiroso. Mas, o tesão dele era tanto, que ele não me deixou chupar a pica por muito tempo. Reclinou-me sobre a cama, ergueu minhas pernas até seus ombros e meteu apressadamente a rola no meu cuzinho. A cada passagem da sua glande estufada pelos meus esfíncteres eu gania, pois aquilo estirava minha musculatura anal até além de seus limites, produzindo uma dor lancinante. Puxei-o pelo tronco sobre mim e comecei a beijá-lo com doçura e volúpia, até sentir que meu pinto despejava seu gozo sobre as minhas coxas.

- Já gozou, safadinho? Não consegue ficar muito tempo com a minha rola no seu cuzinho sem gozar, não é? – grunhiu sorridente.

Mas, foi só eu afagar a nuca dele e travar, cingindo minhas nádegas, seu caralhão dentro de mim, para começar a sentir os jatos de porra me invadindo.

- Amo você mais do que tudo na vida! – sussurrei, exausto e arregaçado. Um semblante satisfeito e sorridente me encarava, antes de começar a beijá-lo suavemente.

O cacete dele estava demorando a desenrijar e, ele quis tirá-lo do meu cuzinho e sair de cima de mim. Porém, eu o segurei, voltando a travar os esfíncteres e abraçando seu tórax, para mantê-lo em mim.

- Faz um tempão que estou em cima de você, não estou te machucando? – perguntou, ciente de que ficar debaixo de seu corpanzil com mais de cento e dez quilos não era tarefa fácil.

- Não! Preciso de você exatamente onde está agora. Prisioneiro do meu amor. Encarcerado em mim. Só assim consigo te dar todo o amor que você merece. – balbuciei, pleno de felicidade.

- Então está mais do que na hora de você também não sair mais daqui. Não tem sentido continuarmos a morar em casas separadas. Quero você aqui comigo. Agora. Para sempre. – retrucou decidido. Beijei-o tanto e tão sensualmente enquanto sua língua se entrelaçava com a minha, que comecei a sentir a pica dele se recuperando, mais rija e mais gulosa.

Tanto eu quanto o Harry conseguimos uma licença de alguns dias, por conta disso, depois do casamento do David, permanecemos mais três dias em Glasgow conhecendo suas atrações, que nenhum dos dois conhecia ainda. Como estávamos de carro, durante a viagem de regresso a Londres, fomos parando ao longo do trajeto, nas cidadezinhas que mais nos atraíam.

Enquanto estava fora, Timmy, meu colega da agência que dividira o loft comigo, antes da minha mudança para o apartamento do David, me mandou uma mensagem no celular comunicando que chegara uma correspondência endereçada a mim. Curioso, enviei uma resposta pedindo para ele dizer quem era o remetente. NÃO HÁ REMETENTE. O ENVELOPE TIMBRADO É DE HARPERS & OSBOURNE, ADVOGADOS ASSOCIADOS. O ENDEREÇO É DE EDIMBURGO. Respondeu ele em sua mensagem.

- Você conhece esse escritório de advocacia, Harry? – perguntei, depois de receber a resposta.

- É o mais conceituado grupo de advogados da Escócia. – respondeu ele. – Faz ideia do que possa ser? – emendou.

- Não faço a menor ideia. O que poderão querer comigo? – a mesma preocupação que formou alguns vincos na minha testa, fez a expressão do rosto do Harry se anuviar.

Harry fez questão de passar pelo loft comigo para apanhar a correspondência assim que chegamos a Londres. Dentro do envelope havia uma única folha de papel, também timbrado com a chancela do escritório, dizia apenas para eu entrar em contato telefônico com Thomas Harpers, o mais brevemente possível, para tratar de assunto de meu interesse.

Fiz a ligação logo pela manhã da segunda-feira. A voz melosa e estridente de uma secretária me informou que o senhor Harpers aguardava meu contato e, rapidamente transferiu a ligação. A voz que se seguiu era levemente rouca e, me pareceu ser de uma pessoa de idade.

- Bom dia senhor Manson. Demoramos um pouco para localizá-lo. Na verdade, alguns meses. Precisamos nos encontrar pessoalmente, pois temos uma pendência a resolver com o senhor. Onde posso conversar com o senhor em Londres? – disse, calma e pausadamente, denotando que já deveria ter feito esse tipo de comunicação inúmeras vezes durante sua vida profissional.

- Bom dia! Evidentemente. – respondi. – Pode me adiantar do que se trata? – acrescentei.

- Devido a algumas particularidades e, ao teor do assunto, creio que não seria apropriado através de uma conversa telefônica, se é que me entende. – retorquiu.

- Compreendo. Pode ser esta semana mesmo se for conveniente ao senhor. – disse, agora mais ansioso do que antes.

- Estarei em Londres amanhã mesmo. Temos pressa em resolver a questão. – sentenciou.

Dei-lhe o endereço do apartamento e, em seguida, liguei para o Harry para coloca-lo a par do combinado.

- Fez bem. É melhor que seja lá em casa. Estarei ao seu lado, não se aflija! – exclamou. – Te amo, até a noite!

- Também te amo. Beijão!

Na manhã seguinte acordei cedo. Tive um sono interrompido por pensamentos que tentava, a todo custo, tirar da minha mente. Eram relacionados aos meus tempos em Brechim. Uma fase da minha vida que eu procurava enfiar nas partes mais recônditas do meu cérebro para ver se elas se perdiam por lá. Tomei uma ducha enquanto o Harry continuava a dormir a sono solto. Eu o admirava também por isso, ele era capaz de dormir como um bebe, mesmo que o mundo estivesse prestes a acabar. Depois preparei o café e fui toma-lo com ele na cama.

- Hummm...que maravilha!! Parece que você adivinhou a intensidade da minha fome. – disse, com a voz ainda sonolenta, quando me puxou para junto dele e me deu um beijo.

- Madruguei de tanta ansiedade. Será que tem haver com Brechim? Estou preocupado. – retorqui.

- Não creio. Você precisa esquecer aquilo. É passado e, tal como as águas de um rio, nunca mais hão de voltar. – ele positivamente tinha uma capacidade de sublimar as coisas ruins muito mais facilmente do que eu.

Pouco depois das dez horas o interfone tocou. Era o advogado Thomas Harpers e um assistente. Harry foi recebê-los à porta.

- Senhor Manson? Bom dia! Sou Thomas Harpers. – foi logo dizendo.

- Bom dia! Não, sou Harry Nichols. Sentem-se, por favor. – corrigiu Harry.

- Bom dia! Eu sou Philip Manson. – me apresentei entrando na sala apressadamente.

- Bom dia, Senhor Manson! É um prazer conhecê-lo. Não se parece em nada com o seu tio, se me permite a observação? – cumprimentou gentilmente.

- Como disse? – por instantes achei que estivesse me confundindo com outra pessoa, talvez um homônimo.

- Seu tio Julius Manson, o senhor não se parece com ele. – voltou a comentar.

- Creio que deve estar havendo um engano. Eu não tenho um tio chamado Julius Manson. Sou órfão. – respondi.

- Bem, senhor Manson! Poucos meses antes de morrer, seu tio Julius, que sempre trabalhou com nosso escritório, especialmente, nos assuntos relacionados às empresas, chegou mesmo a mencionar que o senhor provavelmente não o reconheceria, nem tão pouco, se lembraria de ter um parente vivo, no caso ele, seu tio. – esclareceu.

- Como assim? – eu comecei a puxar pela memória quando, subitamente, me lembrei do cemitério. E, aos poucos, aquele dia foi tomando forma em minha mente.

- O senhor está bem, senhor Manson? – questionou o advogado.

- Tudo bem Philip? Está sentindo alguma coisa? – inquiriu o Harry, sentando-se sobre o braço da poltrona na qual eu estava e passando seu braço pelo meu ombro.

- Ahn? Sim. Sim, está tudo bem. – respondi.

- O senhor Julius faleceu há nove meses. Desde então estamos a sua procura. O internato, no qual o seu tio disse tê-lo deixado, não existe mais e, tivemos que enfrentar uma burocracia danada, nessas encruzilhadas que os departamentos governamentais promovem quando se precisa deles. Por isso, a demora em fazermos contato. – continuou. – O fato, senhor Manson, é que as empresas e, a fortuna pessoal de seu tio, fazem parte do testamento que ele nos pediu para redigir poucos meses antes de morrer, quando seu estado de saúde passou a requerer maiores cuidados. Segundo ele, metade de todo o patrimônio das empresas pertencia a seu pai, falecido num trágico acidente automobilístico, juntamente com sua mãe, nas cercanias de Dundee, há dezoito anos. Depois da morte do irmão, o senhor Julius passou a administrar não só as empresas, das quais ele também era sócio, como a fortuna pessoal de seus pais. Como ele havia enviuvado e, nunca tivera filhos, incluiu a sua parte das empresas e sua própria fortuna pessoal no testamento. Na qualidade de único beneficiário, e ainda, para que o senhor tome ciência do conteúdo deste testamento é que estou aqui. Após a abertura e leitura oficial deste documento, também fui incumbido, pelo senhor Julius, de providenciar o repasse do espólio para seu nome, auxiliando-o, ainda, naquilo que venha porventura a necessitar. – terminou, concluindo sua exposição.

- Bem! Eu nem sei, quero dizer ... isto é, o que tenho que fazer? – perguntei atordoado com todas aquelas informações.

- Não se preocupe, não há nada de complicado nisso, não é mesmo senhor Harpers? – disse Harry.

- Este é meu parceiro Harry, senhor Harpers, ele também é advogado. Bem! Eu estou à sua disposição para o que for necessário. – esclareci.

- Ótimo! É bom saber que estamos entre colegas. Os passos a seguir são ... – continuou o advogado, embora eu não estivesse mais prestando atenção em suas palavras. Meus pensamentos se voltaram novamente para aquela sepultura. Então essa era a minha história. Aquela sensação de perda que experimentei naquele dia, de certa forma, acabara de voltar e, eu mergulhei numa melancolia, por tudo o que deixei de viver ao lado dos meus pais.

Eu me despedi do senhor Harpers e do seu assistente, mecanicamente. Foi o Harry quem os conduziu até a porta quando se foram. Ao voltar para junto de mim, eu estava chorando. Ele me abraçou e me deu um beijo. Ele sabia que toda essa história tinha mexido com as minhas feridas. Ele escorregou para dentro da poltrona e me colocou em seu colo. Encostei a cabeça no ombro dele e deixei que ele me afagasse.

Depois de oficializada a transferência dos bens deixados em testamento pelo meu tio para mim, as semanas seguintes foram dispendidas com uma intensiva troca de e-mails e telefonemas com o escritório de advocacia Harpers&Osbourne. Neles, o senhor Thomas ia me informando dos acertos que vinha conduzindo para que eu gradativamente conhecesse e tomasse posse dos bens. As empresas é que demandavam a maior parte dessas transações. Ao final de algumas semanas, ficamos combinados de eu ir a Dundee para uma reunião com os administradores que vinham tocando os negócios desde a morte do meu tio. Pedi ao Harry para me acompanhar. Desde que passei a morar com ele, percebi que dependia cada vez mais dele. Não que houvesse perdido minha capacidade decisória, mas um aval ou uma concordância por parte dele faziam toda a diferença. Longe de representar uma sobrecarga para ele, eu tinha a impressão que isso o deixava imensamente feliz. Era como se a sua postura de macho alfa estivesse sendo reconhecida e valorizada por mim.

Os administradores tinham feito um excelente trabalho. Os seus relatórios e os resultados financeiros e de produtividade mostravam que as empresas não só mantiveram os mesmos níveis como, em alguns quesitos, haviam sofrido um incremento significativo. Eu pouco entendia desses negócios, mas a maneira como eles me colocaram a par da situação, foi inteligentemente simples e clara. Enquanto participava dessas reuniões, percebi que jamais seria a pessoa certa para continuar à frente desses negócios. E, aos poucos, foi-se formando em minha mente, uma solução para esta situação.

- Não conheci meu tio. Se muito, estivemos juntos umas duas ou três vezes e, nessa época eu tinha seis anos. – comecei, diante dos administradores ávidos por conhecer o destino que eu daria aos negócios. – Mas, vejo que ele foi capaz de se cercar de pessoas de extrema competência. Minha intervenção seria inconsequente porquanto me faltam as habilidades para isso e, até que eu as adquirisse e dominasse, talvez já estivéssemos arruinados. Como pude depreender das explanações que os senhores fizeram, muitos funcionários estão há anos conosco, bem como boa parte dos senhores. Portanto, como o bem estar e, o futuro de todos depende das atitudes que tomamos aqui, acho justo que todos tenham o seu quinhão naquilo a que se dedicam há anos. Eu proponho que sessenta por cento dos atuais bens das empresas seja convertido em ações e, que cada funcionário, segundo o tempo que ainda lhe resta na execução de suas funções, seja contemplado com um certo número de ações, tornando-se, desta maneira, um coproprietário do negócio. Com isso, mantemos o interesse e a dedicação de cada um, uma vez que estará trabalhando naquilo que também lhe pertence. – concluí, diante de ouvintes silenciosos e estupefatos.

- Creio que o senhor se subestima, senhor Manson. O senhor, pelo pouco que nos deu a conhecer de sua pessoa, é um administrador nato. Certamente seria um excelente líder. Sua decisão é sábia e inteligente! – exclamou um dos administradores, que logo teve a anuência dos demais, num cochicho unânime.

- Agradeço suas palavras. Mas, como disse, não me sinto apto e nem disposto a assumir essa responsabilidade. E gostaria que os senhores se empenhassem em executar o que propus no mais curto intervalo de tempo possível. – colocando fim às dúvidas quanto ao destino das empresas.

Eu esperei durante todo o trajeto de volta até Londres, que o Harry se posicionasse quanto à minha decisão. Mas, ele dirigiu quase calado o tempo todo. Percebia-se que estava tirando suas conclusões a respeito, eu o conhecia bastante bem para saber quando aqueles silêncios representavam um turbilhão se revolvendo em seu cérebro. Eu estava na cozinha do apartamento, depois de uma viagem que consumiu boa parte daquele dia, preparando um jantar descompromissado para nós dois, quando ele entrou e me abraçou pela cintura. Eu não trajava nada além de uma camiseta e a cueca, após o banho, quando ele se aproximou e começou a chupar meu pescoço enquanto me encoxava contra o balcão da cozinha.

- Sabe que eu te amo? – sussurrou, entre uma chupada na minha pele e outra.

- Sei! Porque eu também te amo. – respondi, sentindo que o cacete dele começava a experimentar uma ereção.

- Eu gostei muito da sua postura diante daqueles diretores. Meu menininho cresceu e se tornou um homem admirado, também por sua perspicácia e inteligência. Além das qualidades e atributos que eu conheço desde a infância. – continuou. Junto com as últimas palavras ele intensificou o aperto que dava em meu tronco e as encoxadas.

- E que atributos e qualidades são essas? – provoquei, franqueando o acesso dele ao meu pescoço.

- Essa sua doçura e carinho! – murmurou, dando uma mordiscada sensual. – E essa bundinha carnuda que esconde o cuzinho mais apertado que eu já provei. – acrescentou, cada vez mais excitado.

O tesão começava a deixar minhas pernas moles e meu corpo queria o dele. A mão dele entrou na minha cueca e eu podia sentir a cobiça dele roçando a pele das minhas nádegas. Ele ia afastando a cueca lateralmente, sem tirá-la, de modo que o meu rego ficasse exposto. Não demorei a sentir o caralhão dele se intrometendo nele. Ele sabia exatamente qual era o efeito que aquela sofreguidão libidinosa causava em mim. Um tesão desmedido que fazia minha pelve se contorcer e meu cuzinho piscar alucinadamente. Ele explorava isso com uma lentidão proposital e desesperadora, que arrancava suspiros de mim e, me fazia ansiar por seu falo impetuoso e truculento. Eu virei meu rosto na direção dele para beijá-lo, pois sabia que isso era capaz de fazer ruir seu autocontrole, fazendo-o desoprimir seus desejos mais primitivos e selvagens. Eu gani quando a pica entrou em mim. Apesar de ele já ter me penetrado inúmeras vezes, era impossível reprimir esse ganido quando a cabeçorra do cacete dele varava minhas pregas, tanto pelo êxtase quanto pela dor. A masculinidade dele pulsava dentro de mim, potente e carecida, tal como eu gostava. Só de sentir as primeiras bombadas, gozei melando a cueca.

- Ah! Harry como eu te amo! – gemi, ao mesmo tempo em que sentia os jatos de porra saindo do meu pau. – Meu homem, meu macho, meu tudo, meu amor!

- Sou tudo isso para você? Hummm ... vou ficar convencido! – gemeu ele, deixando escapar o ar entre os dentes.

- Como eu gostaria de ter me entregue completamente virgem nas tuas mãos, e deixar que só você me ensinasse e me fizesse sentir os prazeres sexuais. – intentei.

- Você nunca vai deixar de ser o meu menininho tesudo e virgem, como da primeira vez em que meti no seu cuzinho. Existe uma pureza em você que nunca vai desaparecer. Nem as crueldades que te fizeram conseguiram tirá-la de você. E, eu sei que ela é minha. Só minha, meu amor! – arfou, empinado a jeba nas minhas entranhas.

- Sabe no que eu estava pensando? – perguntei, quando, depois do jantar, assistíamos ao telejornal diário.

- Que vai me convidar a entrar mais uma vez nessa bundinha agasalhadora! – exclamou ambicioso.

- É um convite sim, acho que tão bom quanto esse. Mas, não é isso. – respondi, fazendo suspense.

- Nada é mais tentador e gostoso do que colocar minha pica aí dentro. – afirmou, glutão.

- Você sempre diz que gostaria de morar num lugar quente. Onde o sol desponta logo cedo pela manhã e só se põe no crepúsculo. Onde possa ouvir o mar sussurrando ao longe e o vento acariciar seu rosto. – mencionei, lembrando-me das próprias palavras dele quando me descrevia seu lugar dos sonhos.

- Saint Barths! Esse lugar é Saint Barths. Ele existe e fica no Caribe! – disse, mentalizando seu paraíso.

- Você nunca me disse que esse seu lugar tinha nome. – respondi, surpreso com a revelação.

- Encontrei uma vez, antes de ser mandado para Brechim, um prospecto de uma agência de turismo, mostrando as praias e as construções, com seus telhados vermelhos, da pequena ilha do Caribe. Depois, fui pesquisar detalhes e descobri que havia nascido para morar ali. – mencionou, como se estivesse se imaginando lá. – Um dia vou levar você para lá. Faremos um cruzeiro, o que acha? – perguntou, deitando a cabeça no meu colo.

- Meu convite tem haver com, ... como é mesmo o nome? – continuei.

- Saint Barths!

- Pois então, meu convite tem haver com Saint Barths. Vamos nos mudar para lá? – perguntei. – Nossa parte nas empresas permite que tenhamos uma boa fonte de renda. Além disso, você pode montar seu próprio escritório de advocacia na ilha. Deve haver demanda para um advogado brilhante como você. E eu, bem! Eu posso continuar a trabalhar com publicidade. Sempre há o que fazer nessa área, seja lá onde for. Teremos nossa casa no alto de uma colina, cercada por um gramado e palmeiras que vão tremular com o vento, a poucos passos da areia de uma praia, onde você, eu e um cachorro brincalhão iremos caminhar todos os finais de tarde, até o sol se por no horizonte mergulhando no mar. Eu vou te dar um beijo assim que me aconchegar no seu peito, e te dizer que você é o meu maior tesouro. – falei, me emocionando com a ideia.

Quatro meses depois, o transatlântico que havia deixado o porto de Southampton com destino ao Caribe, passando por Nova Iorque e Miami nos Estados Unidos, aportava no porto de Gustavia, em Saint Barths. O sol estava a pino e uma brisa despenteava nossos cabelos, enquanto um cheiro marítimo entrava sutilmente em nossas narinas. Harry e eu estávamos abraçados no terraço da nossa cabine que descortinava o verde que cobria o topo das montanhas da ilha, enquanto os rebocadores faziam o enorme transatlântico deslizar pelas águas calmas do porto. Havíamos chegado ao nosso paraíso!

* Esta é uma obra de ficção. Toda e qualquer semelhança com nomes, pessoas e fatos é mera coincidência. A obra não é uma apologia à pedofilia, pelo contrário. Ela tem a intenção de mostrar à sociedade que pessoas e instituições, muitas vezes reconhecidas como idôneas e respeitáveis, subvertem seus valores e escondem a origem desse crime. É nesse contexto, e somente nele, que a obra deve ser entendida.

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Comentários

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Terminei mais um conto seu, Kherr. Mais um reboliço de emoções, como aliás, já me preparo para sentir quando vejo seu nome como autor.

A realidade é ainda mais dura e cruel do que você descreveu, infelizmente. São poucos, diria mesmo, raros os que conseguem viver depois de abusos como esses. Muito sobrevivem, levando consigo todo o peso dos traumas que lhes quebraram a alma no passado.

A dose certa de tesão e romance no reencontro do Philip com o Harry, deu o toque de pura excitação na leitura.

Grande abraço!

P.S.: Como já estou escaldado no sofrimento dos personagens do Kherrverso, desde que os dois se reencontraram eu fiquei, a cada parágrafo, com o coração na mão, esperando uma reviravolta trágica que me faria jura que nunca mais leria nada teu (sim, isso aconteceu algumas vezes...), mesmo sabendo que logo começaria o conto seguinte, com muita expectativa e coragem. heheheheheheheheh

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Infelizmente isso ainda continua acontecendo nos dias de hoje, pessoas que se omitem, pessoas que tiram vantagem dessas situações, pessoas que acobertam, enquanto indefesos são submetidos a traumas incuráveis. Como já mencionei, meu objetivo com essa estória foi deixar um alerta para que todos nós saibamos interpretar no olhar de uma criança ou adolescente o sofrimento estampado em seu olhar, naquilo que suas palavras não contam.

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Conto maravilhoso e triste ao mesmo tempo, pois mostra a dura realidade que muitos órfãos passa nessa vida.

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Oi nego@! O conto visa deixar um alerta para que todos nós nos preocupemos com aquilo que aparentemente está travestido de boa ação, para que não ignoremos que canalhas se valham de seus cargos, hábitos e hierarquias para perpetuar crimes que a sociedade muitas vezes finge não ver. Abração!

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Definitivamente você é uma pessoa linda, colocando em foco seu lado social e alertando para abusos cometidos não só por pessoas como também por instituições ditas idôneas. Sem deixar de mostrar deliciosamente a luxuria de um bom sexo e em fim a sua marca registrada de fazer do amor como um sonho que pode se tornar realidade.

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Obrigado Roberto! Seu elogio me lisonjeia. Abração, meu querido!

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Eu amei demaiz este conto

E tao lindo e um alerta aos crimes obscuros que rolam por ai destruindo os sonhos e as pequenas vidas inocentes

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Eu chorei muito, por vezes pensei em parar a leitura, pensei q não chegaria ao fim. Eu não creio que seja um insentivo a pedofilia, mas tbm não creio que seja uma denuncia valida ou que venha mudar alguma coisa, por isso foi uma leitura traumatizante desculpe a franqueza, as vitimas normalmente são amordaçadas psicologicamente por seus agressores compelidas a não relatarem a quem quer que seja e quando penso me vem aos olhos novamente as lagrimas, vitimas de tios, primos, avôs, um amigo da familia, um padre, um pastor. Talvez 1% das vitimas saim ilezas quando 99% vêem suas vidas serem escoadas, realmente se tornando vazios e antsociais, é um crime contra a vida pior q homicidio pois mesmos vivos jamais esquecerão a agressão sofrida levando para sempre as sequelas na alma. Crianças inocentes que não conhecem o mundo nem a infinidade de gente inescrupulosa que nele há. Revoltante, talvez eu me sinta como eles incapaz e de mãos atadas.

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já li duas vezes esta historia e amei de paixão ... tu és um dos meus escritores favorito ,nunca deixe de escrever estas historias fantásticas ...Parabéns

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Seus contos são bem escritos, uma trama bem costurada. Pena que você misture as segunda e terceira pessoas. E faça uma tremenda confusão também com "por que, porque, porquê e por quê"...E, no caso do presente conto, o título não tenha nada a ver (e não haver...) com o enredo. Não foi o padreco que comeu o rabinho do garoto... Só não lhe dou 10 por estes motivos.

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eu adoro ler tuas historias como fiquei l

feliz de saber que continuas a escrever tu és um escritor fantástico ...desculpe não ter a capacidade de expressar toda minha admiração que sinto pelo teu trabalho como escritor ,pois vou te pedir que nunca deixe de escrever para mois ,pois tuas historias são maravilhosas ! Um beijo no coração

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Gosto de ler e posso dizer que foi um deleite sem nome.....

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Que estória bonita!!!

Fiquei extremamente emocionada. Bem escrito, com um enredo que prende o leitor. Raríssimos aqui na casa.

Parabéns!

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Você é, sem dúvida, minha pessoa favorita nesta casa. Vou lhe desejar vida longa pensando no lucro. Posso? Posso.

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carambaaaa! Pense na felicidade que eu fiquei ao ver que meu autor favorito tinha postado uma nova estoria!! incrivel como sempre!! me alegro sempre que vc aparece! nao nos deixe jamais! vc e epetacular! obrigado

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Se podesse daria muito mais que 10. Simplesmente perfeito ! ♡♢♡

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