Eles haviam tido uma noite de amor particularmente quente. Haviam se amado muito, encharcando os lençóis com suor e gozo... comemoravam o primeiro aniversário juntos.
- Nossas bodas de papel, querido... - disse Leon baixinho ao despertar, acariciando os cabelos de Andrei que dormia. - O primeiro aniversário de muitos...
Andrei sorriu e abriu seus lindos olhos cor de mel.
- Ah! - fez Leon surpreso. - Te acordei?
- Eu não estava dormindo... - respondeu o outro, com a voz rouca. - Estava sentindo o seu calorano...
- É... o tempo passa depressa...
- Eu te amo cada vez mais...
Andrei então puxou Leon para si e o olhou bem dentro dos olhos.
- Acho que eu ainda não te falei isso, mas... hoje, pra marcar a data, eu vou te falar.
- O que?
- Eu também te amo...
Leon sentiu o coração quase parar de tanta felicidade. seus olhos se encheram de lágrimas.
- Ah, Andrei! Como eu sonhei em ouvir isso de você...
- Eu te amo, Leon... muito...
- Faz amor comigo...
- Claro... - e deram início a nova sessão de prazer.
Eles pensavam que seu relacionamento era um segredo absoluto. Mas não era bem assim. Os demais integrantes da banda desconfiavam, e outras pessoas próximas também. Leon se mudara para o apartamento de Andrei, e os dois eram vistos juntos por toda parte, enquanto que as mulheres que eventualmente os acompanhavam pareciam meros acessórios para disfarçar uma situação. Mas, tudo se resumia a desconfianças vagas, e muitos acreditavam que eles fossem apenas como dois irmãos. Prosseguiam com sua agenda de shows, por cidades e estados brasileiros, sempre com muito sucesso. Suas canções eram dirigidas principalmente ao público adolescente, e eram tidos como ídolos e modelos dos skatistas e da geração mais nova.
Havia, porém, um problema: Andrei estava cada vez mais dependente de cocaína. Para atingir o mesmo efeito de antes, precisava aumentar cada vez mais as doses. Leon se preocupava com isso, mas não queria abordar esse assunto com o amigo. Sabia que ele o aborrecia e não queria repetir os erros da ex-mulher de Andrei. Ele mesmo estava bastante viciado, mas ainda se contentava com doses baixas. Sempre que cheiravam, Andrei lhe dizia que aquela tinha sido a última vez, que iria parar. Mas depois saía para uns lugares suspeitos, e voltava com papelotes de cocaína...
Naquela noite eles embarcariam para uma série de shows no norte do país. Após fazerem amor mais uma vez, Leon deixou Andrei dormindo e foi tomar banho e se vestir. A seguir foi buscar seu carro que deixara no conserto. Uma hora depois estava de volta. Chamou seu amado.
- Andrei! Você está acordado? Você acredita que ainda não aprontaram a porra do carro? Acho que eles pensam...
Não houve resposta. Leon abriu a janela da sala, e o sol e a luz invadiram o aposento.
- Andrei! Vou preparar um lanche pra gente. o que você quer comer?
Silêncio... Leon dirigiu-se para o quarto. Andrei estava caído sobre a cama, mas não do mesmo jeito que ele o deixara. Vestia uma bermuda jeans e a seu lado tinha uma revista com várias carreiras de cocaína e alguns canudos. Quanto Leon o tocou, sentiu algo diferente. Andrei estava inerte... gelado. Virou-o e viu seus olhos cor de mel abertos e vidrados, e uma espuma sangrenta escorrendo por um dos cantos daquela boca que pouco antes lhe dissera pela primeira vez, eu te amo...
Por alguns minutos Leon recusou-se a acreditar, a entender o que havia acontecido. Depois caiu de joelhos e gritou.
Quando se ergueu, não tinha mais uma gota de sangue no rosto, e sorria. Estava louco... completamente louco. Muito calmo foi até a sala, pegou uma caneta e um papel e rabiscou um bilhete.
- " Eu não posso viver sem o Andrei. Por favor nos enterrem juntos."
Leon deixou o bilhete sobre a mesa da sala. Depois foi até o aparelho de som e colocou o CD de Mariah Carei na faixa " Without You " no modo repeat, de modo que tocasse indefinidamente. Então voltou para o quarto, onde jazia o corpo sem vida de seu grande amor.
Vasculhou os bolsos de Andrei e encontrou o afiado canivete, com o qual tempos atrás haviam feito o pacto de sangue, e do qual Andrei nunca se separava. Era seu amuleto de sorte, dizia.
- Não posso viver sem você, meu amor. - disse Leon, acariciando-o com uma ternura infinita. - Quero dormir nos seus braços... para sempre.
E louco, perdido, transtornado de amor e de dor, Leon cravou profundamente o canivete em ambos os pulsos até o antebraço, abrindo as veias. A dor era indescritível. O sangue começou a jorrar de suas veias, manchando as paredes do quarto, os móveis, o chão... a canção tocava sem parar... tudo rodava à volta de Leon agonizante. Como num turbilhão ele lembrava da infância de ambos, da pista de skate, dos caras transando no matinho, dos shows da banda, do momento em que fora possuído pela primeira vez... inclinou-se e beijou num esforço supremo a boca gelada de Andrei. Depois aninhou-se no peito dele e ali morreu, esvaindo-se em sangue...
Como eles não atendiam o celular, os outros companheiros de bandas foram até o apartamento de Andrei, bateram, bateram, e nada ouviram além daquela música tocando sem parar... suspeitaram de algo e chamaram a polícia, que arrombou a porta e encontrou os dois rapazes mortos.
E a música continuava a tocar...
FIM
