Até que a morte nos separe

Um conto erótico de Navegante das letras
Categoria: Heterossexual
Contém 2232 palavras
Data: 25/03/2011 10:08:39
Última revisão: 05/03/2012 17:37:36

ATÉ QUE A MORTE NOS SEPARE

Luiz Carlos casou-se cedo e viveu a realidade da maioria dos jovens sonhadores: problemas financeiros, habitacionais, empregatícios, etc. Como muitos, sofreu para estruturar seu lar, mas conseguiu o mínimo necessário para começar sua vida. Imaginava-se vencedor, um futuro homem bem sucedido. O destino foi outro, porém, com os problemas agravando-se cada vez mais, Luiz Carlos viu seu casamento ruir e sua esposa dar-lhe as costas numa inevitável separação.

Mesmo abatido em suas fibras, relutou entregar-se ao desânimo, dedicando-se dia-a-dia ao seu progresso profissional. Luiz Carlos era o exemplo de esforço e, em poucos anos, viu sua promoção chegar, juntamente com o aumento salarial. Seu padrão de vida mudou e então comprou um apartamento em um prédio confortável num bairro tranquilo, com uma vista do infinito que não cansava de contemplar. E exatamente nesses momentos que Luiz refletia sobre sua vida, sua rápida ascensão e o sucesso almejado. Mas algo lhe faltava: um ombro amigo, alguém para compartilhar de seu sucesso, a esposa leal e sincera que ainda não tivera a felicidade de conhecer.

Luiz Carlos sentia um vazio em sua vida, como se esquecido pelo destino. Por que? O que levava ele, um homem honesto, dedicado e trabalhador, com tanto amor para dar, a não encontrar sua cara-metade?

Mas o destino ouviu seus apelos e mostrou-se condescendente com ele. Eis que, em um de seus passeios solitários, Luiz Carlos vislumbra aquela que seria a “escolhida de seus sonhos”, sentada sozinha em uma aconchegante lanchonete nos arredores de seu prédio. Era uma mulher lindíssima, de longos cabelos negros que contrastavam com a pele alva e sedosa. Seus lábios carnudos, extremamente sensuais, eram a moldura da perfeição. Seu corpo, ah, seu corpo, era aquilo que há muito Luiz não encontrava, um passaporte ao paraíso, a verdadeira fonte de inspiração.

Aquela noite foi tormentosa para ele, que se mexia e remexia incontrolavelmente na cama. Seu sono foi torturado por visões daquela desconhecida, despertando-lhe os instintos mais íntimos. No meio da madrugada Luiz levantou-se e, sem conseguir voltar a dormir, da sacada contemplou a plácida visão noturna, com os raros e anônimos motoristas que trafegavam pela cidade.

Era assim que Luiz via sua musa: uma raridade anônima. Quem seria aquela mulher que lhe chamara tanto a atenção? De onde teria vindo? Teria sido uma alucinação, fruto de suas necessidades afetivas? Eram perguntas que ele fazia a si próprio, infelizmente, sem respostas. O sol já ultrapassava a linha do horizonte quando ele resolveu levantar-se de sua confortável cadeira, ainda sentindo o cheiro daquela mulher que, como mágica, parecia ter impregnado o ar à sua volta.

Em seu serviço calou-se ainda mais do que habitualmente fazia. Não conseguia concentrar-se em seus afazeres, tendo sempre a imagem daquela mulher em sua mente. Precisava encontrá-la, incontinenti, e mostrar o quanto a admirava e quanto poderia fazê-la feliz. Sim! Isso mesmo!! Iria procurá-la aonde quer que fosse, pois haveria de encontrá-la. Sim! Ela seria sua futura esposa, mãe de seus tão desejados filhos. Ela havia sido a escolhida para sua vida, foi o destino que quis assim.

Por dias Luiz Carlos caminhou pelos arredores de seu apartamento como fizera naquela inesquecível noite, olhando atentamente para o interior das lanchonetes, lojas, shopping’s, restaurantes, bares e onde mais houvesse uma aglomeração de pessoas, todas desconhecidas e anônimas. Em sua mente só havia uma idéia: encontrar aquela mulher, a futura mãe de seus filhos, a esposa adorada e amada.

Quando estava preste a desistir, para sua imensa felicidade, lá estava ela, sentada sozinha na mesma lanchonete. Sim! Era ela! Havia encontrado sua alma gêmea. A longa busca fez com que Luiz não hesitasse em aproximar-se. Ele já havia até selecionado a frase com que se apresentaria, sem medo de parecer estranho ou ridículo, afinal, sua futura esposa não o acharia ridículo.

“Boa noite, talvez você possa me ajudar. Sabe o que é, eu estou escrevendo um livro sobre anjos e precisava entrevistar um. Você estaria disponível?”. Ao terminar a frase, estranha secura tomou-lhe a garganta e um rubor assomou-lhe a face, deixando-lhe sem palavras para continuar o diálogo. Que fazer agora? Ele não havia planejado a etapa seguinte. Após um breve silêncio, sua musa deu um largo sorriso e disse-lhe que ele não encontrara um anjo, mas se quisesse alguém realmente especial, poderia continuar sentado ali.

A conversa durou até o início da madrugada, quando ela disse que realmente precisava ir, sem deixar, contudo, de marcarem um novo encontro para a noite seguinte. Finalmente Luiz Carlos iria dormir sossegado, um sono dos anjos. Quando acordou, teve a impressão de haver estado no paraíso. Sua consciência estava tranqüila e sua mente livre para continuar a produzir como sempre fizera. Iria retomar suas atividades na empresa sem aquele “fardo” de outrora.

Luiz Carlos chegou meia hora mais cedo do que o combinado, tal era a apreensão e o receio de atrasar-se e perder seu desejado compromisso, trazendo em uma das mãos um magnífico buquê de rosas. Naíra iria adorar, pensava ele. Até o seu nome era especial!

Quando ela chegou, retribuiu-lhe a gentileza com um caloroso beijo na face, e bastou isso para Luiz estremecer por inteiro. Os dias passaram-se e o diálogo ficava cada vez mais íntimo, revelando características e gostos pessoais. Naíra revelou uma extraordinária beleza interior. Dotada de rara sensibilidade, sabia como ninguém reconhecer as virtudes de Luiz, entender o que passava no seu âmago e compreender as suas necessidades de “homem solitário”. Enfim, era ela a escolhida! Havia encontrado a mulher de seus sonhos.

Luiz só não entendia por que Naíra morava sozinha e não havia lhe revelado nada sobre sua família ou seu passado. Até parecia que estava largada no mundo, afastada de todo e qualquer laço de parentesco. Mas isso não importava, pois ela teria a ele, somente ele. O resto era, simplesmente, o resto.

O tempo passava e o sexo ainda não existia para os dois. Com receio de assustar ou afastar sua amada, Luiz sequer tocava no assunto, sem, contudo, deixar de desejar intensamente aquela mulher, no esplendor de sua juventude e com seu corpo de formas perfeitas. Quando estava com ela, a sós, suas mãos tremiam e ele suava. Os beijos eram entrecortados por gemidos e sussurros, a boca na boca, a boca na pele. Tudo era fantasia.

Suas mãos exploravam aquele desejado corpo, afagando-lhe os cabelos sedosos, acariciando-lhe os seios bem feitos. Considerava-os uma verdadeira obra de arte tal era a perfeição de seus contornos. Naíra entregava-se às carícias nos seios, mas todas as vezes que Luiz tentava levar a mão para seu sexo ela o impedia, sussurrando-lhe ao ouvido que ainda não era a hora certa. Dizia que gostaria que se conhecessem melhor, que ele realmente se apaixonasse por ela e não pelo seu corpo. Meio que decepcionado e contrafeito, ele entendia, afinal, a sua escolhida merecia todo o respeito que granjeara ao longo de todos esses meses.

Mas, para sua felicidade, aquela noite seria diferente. Naíra dirigiu suas delicadas mãos para sua braguilha e, como que se lhe adivinhasse o pensamento, lentamente desabotoou sua calça. Desceu seus lábios vermelhos pelo peito, pela barriga e deteve-se naquele que seria o mais audacioso ato desde que se conheceram. Suas mãos mágicas proporcionaram-lhe um prazer como há muito não sentia, um prazer que, apesar de não ser compartilhado mutuamente entre os dois, havia selado sua relação.

Assim prosseguiram no romance, cada dia mais picante, cada dia mais extenuante. Naíra mostrava seu apetite sexual a cada sessão de sexo oral que praticava no seu parceiro. Luiz Carlos adorava sentie o poder daquela mulher e inundar sua boca com seu esperma enquanto ela avidamente sugava-lhe a alma. E, em êxtase, ela ficava chupando seu membro até amolecer, lambendo com prazer indescritível. E isso não tinha hora nem lugar. Quantas vezes no carro, quantas no elevador, quantas na cama ou num arriscado corredor da escadaria? Dificilmente havia um dia em que ela não tomasse sua dose diária de esperma. Mesmo assim, ele tentava, ousava, instigava, investia, mas nada. Nada de conseguir tocar o sexo de Naíra. Era um paradoxo! Uma mulher que lhe proporcionava tanto prazer não desejava ser retribuída da mesma forma. Talvez fosse algum trauma de infância ou fruto de uma criação mais severa, mais rígida. Sim! Talvez fosse isso! Ela não havia se negado a contar sobre seu passado, sobre sua família? Deveria haver um motivo forte o bastante para fazer com que ela agisse daquela forma. Luiz decidiu, terminantemente, não mais tocar no assunto e, principalmente, não mais tentar tocar nela, exceto se e quando ela concordasse. “Pobre, Naíra, deve ter sofrido muito”, pensava ele.

O tempo passava e sua ligação com Naíra ficava cada vez mais forte. Ele já se via casado com ela, imaginava como seriam seus filhos. Filhos! Era preciso que se mudassem para um local mais espaçoso, uma casa de preferência. Crianças precisam de um quintal para brincar, precisam de bichinhos de estimação. Ao fundo, uma churrasqueira e um quiosque, onde pudessem fazer as festinhas de aniversário das crianças e reunirem-se com os amigos do casal. Eram pensamentos íntimos de Luiz Carlos, desejos ocultos que seriam compartilhados no momento que sua amada se entregasse a ele. Conhecendo-a como conhecia, sabia que, quando isso acontecesse, eles estariam totalmente unidos, física e emocionalmente. Nada ou ninguém iria separá-los, ou, como é dito nas cerimônias de casamento, “até que a morte os separe”.

A pressa fez com que Luiz decidisse finalmente arriscar, convidando-a para morar com ele definitivamente. Não havia porque estarem morando separados se passavam a maior parte do tempo juntos. Quantas vezes ele dormira no apartamento dela, e vice-versa. Para sua alegria, Naíra concordou, deixando a entender que, tão logo isso ocorresse, finalmente se entregaria a ele. Juraram amor eterno e marcaram a mudança para o final de semana seguinte.

Ele não cabia em si de contentamento. Era chegada a hora derradeira. Arrumou espaço nos guarda-roupas, na estante, até no porta-CD deixou espaço para ela. Comprou um jogo de lençol novo, acetinado, para estreá-lo naquela noite, que seria realmente a noite mais esperada de sua nova vida.

Animado, auxiliou a trazer a pequena mudança de Naíra para seu apartamento, colocando seus pertences cuidadosamente nos locais que havia destinado a ela, olhando constantemente para o relógio e torcendo para que as horas passassem. A noite não poderia demorar a chegar, não naquele dia. Terminaram de arrumar tudo já no início da noite. Luiz Carlos preparou um prato especial para jantar, selecionado com esmero em um livro de receitas, à altura da ocasião (todo homem metódico e solteiro tem um livro de receitas).

Após o jantar, servido com todo romantismo, sob a luz de castiçais de prata, prepararam-se para a primeira noite de amor. Naíra mais uma vez perguntou se ele realmente a amava, pois só se entregaria a ele se houvesse plena convicção de seu amor, não pelo seu corpo, mas pelo que ela representava. Luiz respondeu-lhe com um longo e lascivo beijo, mostrando que nada apagaria de sua vida aquela mulher tão especial. Ela era tudo para ele, e por ela daria a vida, se necessário.

A penumbra em que se encontrava o quarto era propícia para o momento, revelando somente os contornos dos corpos. Naíra saiu do banheiro enrolada em uma grande toalha, caminhando lentamente para a cama, onde Luiz Carlos esperava, ofegante, com o coração descompassado. Seu olhar prendia-se naquele vulto que se aproximava, parecendo que o tempo e o espaço haviam deixado de existir. Nada importava.

Naíra ajoelhou-se na cama e puxou o corpo de Luiz para o seu, dando-lhe um suave e sensual beijo. Mantendo sua boca na dela, ele desatou a toalha, jogando-a no chão, e começou a percorrer suas mãos pelo tão desejado e sonhado corpo, deslizando-a pela cútis sedosa, tocando suas costas, seus seios. Ah, aqueles seios maravilhosos! Quantas e quantas vezes os tocara. Ele estava no paraíso, afinal.

De repente, um terrível grito é ouvido por todo o prédio, como num átimo de horror, um misto de indignação e medo. Após breve silêncio, ouve-se um longo “nããããããoooooo...” distanciando-se, passando ao longo dos andares, e um baque. Os cachorros da vizinhança começam a latir, como se anunciassem um mau presságio. Assustados, os moradores do edifício correm para as sacadas e olham para baixo, deparando-se com um corpo nu, estatelado no solo, logo à frente do prédio, desfigurado e imerso em uma poça de sangue. Em pouco tempo, dezenas de curiosos acercaram-se dele, reconhecendo-o como o morador do 804 e indagando-se o motivo de tão horrível acidente.

“Eu sempre o achei muito estranho, mesmo. Ele quase nunca cumprimentava a gente. Deus que me livre de gente assim, cruzes.”, dizia uma senhora solteirona trajando roupão listrado.

“Pois para mim parecia ser uma boa pessoa. Calado, mas boa pessoa.”, retrucou o coronel aposentado do 304.

“Credo, gente, o moço tá quentinho ainda e vocês falando desse jeito dele?”, obtemperou a síndica do prédio.

Enquanto isso, a polícia interrogava a única testemunha ocular do nefasto acidente, uma mulher que chorava histericamente, acocorada num canto do quarto do apartamento 804, envolta pelo sedoso e intato lençol. Seus olhos revelavam o pavor, o medo, a decepção, a dor.

Após várias e infrutíferas tentativas, novamente insistiu o policial: “Poderia me dizer o seu nome?”. Balbuciando, em tom quase inaudível e chorando copiosamente, finalmente respondeu com sua suave e delicada voz, entrecortada por soluços:

“Roberson Campos Fagundes”

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Comentários

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prabéns!!esrcevi meu 1 conto e gostaria da sua opinião,pois vindo de alguém q escreva tão bem qt vc ,saberei se devo parar ou continuar o conto é (confissões de uma submissa)postado dia 13/06...nota 1000 para seu conto

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prarabéns!!! me prendeu do início ao fim,eu já imaginava q Naíra seria homosexual mas não q o conto teria esse desfecho muito bem elaborado por sinal.Eu escrevi meu 1 conto q se chama (confissões de uma submissa) foi postado dia 13 /06 e gostaria de sua opinião pois vindo de alguém q escreve tão bem qt vc saberei se poderei continuar ....nota 1000

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Excelente conto! muito bom...

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adoro ... o final perfeito ... nunca pensei que fosse assim , mais ficou muito bom .. parabéns

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Concordo com meu colega w9, Já suspeitava que seria, na verdade, um homem. Mas não imaginei que o cara fosse se jogar... trágico!

De qq forma, sua narrativa está de parabéns, Navegante das Letras. Super original e bem elaborada.

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desculpe amigo mas quando li na narrativa vc dizer que ela só o chupava, automaticamente já sabia que se tratava de um travesti, transsexsual ou como queiram chamar, mesmo assim estas de parabéns otimo conto.

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FINAL INACREDITAVEL. MUITO INTELIGENTE. EXPLOROU A HOMOFOBIA COM SUTILEZA, MAS DE FORMA SEVERA AO HOMOFÓBICO. BEM FEITO PARA ELE, UM IDIOTA A MENOS NO MUNDO.

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